A Bolsa brasileira (B3) caiu mais de 3,2 mil pontos em uma sessão marcada pelo aumento acima do esperado da inflação dos Estados Unidos. Em resposta, o índice encerrou a sessão no menor nível desde 5 de maio, em queda de 2,65%, aos 119.710,03 pontos. O câmbio também foi afetado pela pressão, com o dólar em alta de 1,59%, cotado a R$ 5,3055.
O índice de preços ao consumidor (CPI) dos EUA, teve avanço mensal de 0,8% e anual de 4,2% em abril - o maior para um período de doze meses desde 2008. O temor do mercado é que o movimento eleve a pressão sobre o Federal Reserve (Fed, o banco central americano), que classifica o avanço dos preços como "transitório". Caso isso de fato aconteça, a entidade monetária poderia começar a apertar a política pró-estímulos adotada durante a pandemia.
"Os dados divulgados hoje só aumentarão o foco do mercado na inflação", afirma o estrategista-chefe de mercados da LPL Financial, Ryan Detrick. Hoje, o investidor também olhou para o déficit orçamentário dos EUA, quando as despesas são maiores que as receitas, que ficou em US$ 1,9 trilhão entre outubro e abril, resultado recorde para o período. Nesse cenário, em Nova York, Dow Jones, S&P 500 e Nasdaq caíram 1,99%, 2,15% e 2,67% cada.
O economista sênior global da Capital Economics, Simon MacAdam, reconhece que há uma pressão na inflação nos EUA, mas que tende a ser de curto prazo, provocada pela maior demanda, por conta da retomada rápida da economia, com o avanço da vacinação e os auxílios em dinheiro da Casa Branca aos americanos, o que por sua vez ajuda a elevar o déficit fiscal.
Já a Capital Economics prevê que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) deve seguir com a visão de inflação temporária e só voltar a elevar juros ao final de 2023. Hoje dirigentes do Fed voltaram a tentar acalmar o mercado. O vice-presidente Richard Clarida disse ter ficado "surpreso" com o índice de preços ao consumidor (CPI, em inglês) de abril, mas voltou a afirmar que a inflação maior será transitória.
Para Victor Hasegawa, gestor da Infinity Asset, vê como um movimento de correção o que ocorreu na sessão de hoje após uma sequencia de alta ininterrupta. "Em especial, Nova York, tecnicamente, estava precisando de correção e esse dado de inflação que veio hoje foi um motivo", diz, mas, ressalta, não indica uma reversão de tendência de alta, uma vez que, ao que tudo indica, a injeção de estímulos na economia vai continuar.
Além do impulso negativo vindo de Nova York, especialistas em renda variável disseram acreditar que, apesar do movimento massivamente em sintonia com o exterior, os ruídos políticos e em torno das questões fiscais do Brasil seguem como pano de fundo para a maior cautela tanto no mercado de ações quanto em outros ativos locais.
"De uma forma geral, as commodities não param de subir e o Brasil é muito beneficiado tanto do lado das metálicas quanto das agrícolas. Não performa melhor por causa do lado político e fiscal", afirmou Hasegawa. Hoje, Petrobrás ON e PN fecharam com quedas de 0,94% e 1,27% cada, com os investidores à espera do balanço da petroleira, que sai amanhã. Vale caiu 3,45% e Usiminas recuou 5,22%. Entre os bancos, Itaú, Santander e Bradesco caíram 1,57%, 1,23% e 2,10% cada.
Câmbio
Os indicadores dos EUA fortaleceram o mercado de títulos do Tesouro do país - que, por sua vez, ajudou a aumentar a pressão sob o câmbio, com a moeda americana subindo em todo o mundo. Hoje, o rendimento do papel com vencimento para dez anos encostou em 1,7%, enquanto o de trinta anos foi a 2,4%. O dólar para junho fechou em alta de 1,62%, a R$ 5,3130.
Com as projeções fortes da economia americana alimentando a busca pelos títulos públicos do país, opções de investimento mais seguras e, dependendo da ocasião, mais rentáveis do que os índices acionários, a tendência é que o câmbio continue pressionado. Para o economista-chefe da consultoria Capital Economics, Neil Shearing, o dólar ficará fortalecido ao menos nos próximos 6 a 12 meses.
Para o Brasil, a elevada incerteza política, além dos ruídos em Brasília e a situação fiscal deteriorada devem contribuir para manter o câmbio pressionado, avalia a Capital Economics. Hoje, operadores nas mesas de câmbio dizem que a CPI da covid foi monitorada de perto, mas o principal fator a afetar os preços acabou sendo o exterior. "O dólar subiu geral hoje, e muito", disse um operador. Na Turquia, a moeda americana avançou quase 2% e no México subiu perto de 1%. /SIMONE CAVALCANTI, ALTAMIRO SILVA JÚNIOR E MAIARA SANTIAGO