Mais 50 milhões de trabalhadores poderão juntar-se aos desempregados em todo o mundo, em 2009 e 2010, se a reativação econômica for tão lenta quanto prevê o Fundo Monetário Internacional (FMI), disse o diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Juan Somavia. "Estamos certamente a caminho desse resultado desolador", acrescentou. Se ele esperava uma palavra animadora do secretário do Tesouro americano, Timothy Geithner, deve ter-se decepcionado. Segundo Geithner, o desemprego nos EUA ainda vai subir, depois de ter alcançado em março o recorde de 26 anos, 8,5%. As previsões para o resto do mundo rico não são melhores e só haverá recuperação para valer quando o saneamento dos bancos estiver avançado: este mantra foi repetido incessantemente por ministros, presidentes de bancos centrais e altos funcionários do Fundo, na reunião encerrada ontem. Os bancos ainda estão cheios de ativos podres - créditos de alto risco - e a limpeza continua lenta, principalmente nos EUA, segundo a avaliação mais ouvida durante a semana. As autoridades americanas foram pressionadas dentro e fora dos salões do FMI para apressar o trabalho. Os europeus bateram fortemente nesse ponto durante o encontro de presidentes de bancos centrais do Grupo dos 20 (G-20), sexta-feira, no Federal Reserve (Fed). Não há uma divergência de estratégias entre europeus e americanos, disse no sábado o diretor-gerente do FMI, Dominique Strauss-Kahn. Há somente uma diferença quanto ao sentido de urgência, acrescentou, recorrendo a um evidente eufemismo. Essa diferença não aparece, naturalmente, no comunicado oficial do Comitê Monetário e Financeiro, o órgão político mais importante do Fundo. Aparece apenas, em destaque, o compromisso geral de fazer o necessário para "garantir a solidez das instituições sistemicamente importantes e de restaurar a saúde financeira dos bancos, o crédito interno e os fluxos internacionais de capital". Em sua entrevista, Strauss-Kahn foi mais enfático: cada governo deve fazer o necessário, em suas condições particulares, para resolver o problema, recorrendo à estatização, se isso for necessário. Nos EUA, o esquema proposto pelo governo Obama inclui a participação de investidores privados. Pode ser bom negócio, em princípio, comprar ativos podres, porque alguns desses títulos poderão valorizar-se, quando a situação melhorar. Mas há o temor de mudança nas regras do jogo, disse ao Estado um funcionário brasileiro conhecedor dos meios financeiros americanos. Além disso, o governo dos EUA tem bom motivo para não se animar com a estatização: seria preciso, de alguma forma, supervisionar bancos muito grandes e muito complexos e a burocracia estatal não está preparada para isso. Os britânicos, segundo essa fonte, já descobriram essa dificuldade. Mesmo na Europa, onde a intervenção no mercado está mais avançada e os governos já aplicaram 150 bilhões na recapitalização dos bancos - de um total projetado de 27 bilhões -, o setor bancário continua frágil. O checo Mkiroslav Kalousek, presidente do Conselho de Ministros de Economia e Finanças da UE, apontou como "prioridade chave da agenda internacional" o rompimento de um círculo vicioso: o enfraquecimento da economia real deixou mais exposta a fraqueza do setor financeiro e o maior enfraquecimento dos bancos levou a um declínio maior da atividade econômica. A projeção do FMI de recuperação no mundo rico a partir do próximo ano tem como pressupostos o rompimento do ciclo e o início da normalização dos mercados de crédito. No mundo desenvolvido, a atividade econômica é muito mais dependente do crédito do que em países como o Brasil, onde os empréstimos ao setor privado estão próximos de 40% Produto Interno Bruto (PIB), No mundo rico essa relação corresponde ao dobro ou ao triplo da observada na economia brasileira.A dependência do crescimento em relação ao crédito é a história real, muito mais dramática, por trás das perdas bancárias estimadas pelo FMI. Há um ano os economistas do Fundo avaliaram em US$ 1 trilhão as baixas de créditos podres. Houve quem considerasse o número um exagero. Em outubro a projeção havia chegado a US$ 1,4 trilhão. O número foi revisto para US$ 2,4 trilhões em janeiro e elevado para US$ 2,8 trilhões no relatório divulgado na semana passada. Esses valores se referem só aos créditos originados na bolha imobiliária americana. As perdas globais, segundo cálculos mais amplos, podem chegar a US$ 4,1 trilhões. No meio desse quadro, algumas boas notícias. O FMI terá mais dinheiro para socorrer países em dificuldades. Para a América Latina já estão previstos financiamentos superiores a US$ 61 bilhões: US$ 47 bilhões para o México e estão na fila a Colômbia (US$ 10,6 bilhões), El Salvador, Guatemala e Costa Rica (US$ 1 bilhão cada).
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