Análise | Desaceleração da inflação em janeiro engana, e cenário indica preços ainda em alta

Taxa em 12 meses permanece acima do teto de 4,5%, o que obrigará o BC a continuar subindo os juros; sem bônus pago por Itaipu em janeiro, IPCA teria acelerado para 0,71%, calcula economista

PUBLICIDADE

Foto do author Alvaro Gribel
Atualização:

BRASÍLIA - A inflação de janeiro ficou em 0,16%, a menor taxa para o mês desde a implementação do Plano Real, em 1994. À primeira vista, o número passa a sensação de que o pior na alta dos preços ficou para trás, mas houve um efeito atípico que permitiu a desaceleração do indicador: o bônus pago pela hidrelétrica de Itaipu aos consumidores de energia permitiu uma forte redução da conta de luz, que caiu 14,21%. Esse único item contribuiu para uma redução de 0,55 ponto no IPCA.

PUBLICIDADE

Pelos cálculos do economista Luis Otávio Leal, da gestora G5 Partners, sem o efeito da energia elétrica, o IPCA e janeiro teria ficado em 0,71%, ou seja, teria acelerado na comparação com o mês de dezembro (0,52%).

Em janeiro, Itaipu distribuiu R$ 1,3 bilhão referente ao saldo positivo que teve com a venda da sua energia. A medida foi aprovada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em novembro e segue a determinação de uma lei de 2002 e um decreto de 2021. A previsão era que 78 milhões de consumidores fossem beneficiados.

No restante dos itens que compõem a cesta de produtos do IPCA, há uma série de notícias preocupantes.

Publicidade

Bônus pago pela hidrelétrica de Itaipu aos consumidores de energia permitiu uma forte redução da conta de luz em janeiro, que caiu 14,21% Foto: Joedson Alves/Agência Brasil

A taxa acumulada em 12 meses, que serve de referência para o chamado “regime de metas” do Banco Central, apesar do recuo de 4,83% para 4,56%, ainda permaneceu acima do teto da meta de inflação (a meta é 3%, com teto de 4,5%). Mesmo com esse efeito atípico da energia elétrica, o número não voltou a ficar dentro da margem de tolerância.

O chamado índice de difusão, que mede a quantidade de produtos que subiram de preços, recuou um pouco, de 69% para 65%, mas o patamar permanece bastante elevado. Em outras palavras, quer dizer que, de cada 100 itens, 65 ficaram mais caros no primeiro mês do ano.

Dois grupos que mexem bastante com o bolso dos consumidores tiveram as maiores altas do índice. Os transportes subiram 1,3%, com forte aumento de passagens aéreas (10,42%) e ônibus urbanos (3,84%).

Já o grupo alimentação e bebidas teve o quinto aumento consecutivo, com alta de 0,96%. As carnes, que viraram obsessão nacional após as promessas de campanha do presidente Lula, subiram 0,36%, acima da média do IPCA.

Publicidade

A picanha, por sua vez, saltou 3,95% e acumulou alta de 12,36% em 12 meses, o maior patamar desde janeiro de 2022.

Leal pontua outros dados negativos do indicador de janeiro: os bens industriais já chegam a 2,99% em 12 meses, refletindo o aumento do dólar no País, e os chamados “serviços subjacentes”, que tem forte correlação com os salários dos trabalhadores, saltaram para 0,86% no mês, o patamar mais alto desde junho de 2022.

Para fevereiro, ele projeta que, com o impacto do reajuste das mensalidades escolares de fevereiro, o índice deve acelerar para 1,3%, o que fará com que a taxa em 12 meses também volte a subir.

Apesar da desaceleração do IPCA em janeiro, a composição do indicador não foi boa. Isso fará com que o Banco Central continue elevando a taxa Selic nas próximas reuniões do Copom. Hoje, a taxa está em 13,25%, e subirá pelo menos mais um ponto na reunião do Copom de março.

Publicidade

Análise por Alvaro Gribel

Repórter especial e colunista do Estadão em Brasília. Há mais de 15 anos acompanha os principais assuntos macroeconômicos no Brasil e no mundo. Foi colunista e coordenador de economia no Globo.

Comentários

Os comentários são exclusivos para cadastrados.