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Consultor tributário e ex-secretário da Receita Federal

Opinião | Políticas sociais, no Brasil, erradicam a pobreza?

Toda política financiada por recursos públicos deve ser submetida à avaliação permanente, embora não seja uma prática corrente

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Foto do author Everardo  Maciel

As reiteradas queixas, bem fundamentadas, quanto às persistentes desigualdades sociais no Brasil, inspiraram a adoção de vários programas de transferência de renda, dentre os quais se sobressai o Bolsa Família.

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A avaliação desses programas, todavia, é interditada por receio de parecer um desapreço aos pobres, o que é um equívoco. Toda política financiada por recursos públicos deve ser submetida à avaliação permanente, embora não seja essa uma prática corrente.

Este artigo não tem a pretensão de fazer essa avaliação, mas tão somente suscitar duas questões que possam subsidiá-la.

Transferências de renda se voltam para um público específico. Demandam, portanto, a construção de cadastros, cuja gerência constitui tarefa muito exigente, como ficou bem demonstrado, por analogia, na reconstrução do CPF.

A avaliação deprogramas de transferência de renda é interditada por receio de parecer um desapreço aos pobres, o que é um equívoco Foto: Wilton Junior/Estadão

Em 1995, existiam 104 milhões de inscritos no CPF, número bem superior ao da população economicamente ativa. Diagnosticado, o cadastro revelou uma miríade de inconsistências de todos os gêneros.

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A depuração do CPF demandou tempo e criatividade. Afastada a hipótese impraticável de recadastramento, envolveu a adoção de critérios rígidos de inscrição, a complementação de informações com base nas declarações de renda, a instituição da declaração de isentos (modelos binários operáveis por boletos equivalentes aos utilizados em loterias esportivas, telefone ou internet), a inativação das inscrições de inscritos que por dois anos consecutivos não fizessem algum tipo de declaração e a possibilidade de sua reabilitação, a inviabilização de operações financeiras por pessoas com inscrição suspensa, etc.

Como resultado dessa depuração, foram suspensas 60 milhões de inscrições. Hoje, a inscrição no CPF tornou-se, por força da Lei n.º 14.534/2023, número único de registro nos bancos de dados do serviço público.

Fraudes nos cadastros de transferências de renda, objeto de seguidas denúncias, se explicam porque eles não se submetem a uma gestão minimamente eficiente.

O Bolsa Família, por outro lado, não promove a ascensão social. Projeto apresentado pelo então senador Álvaro Dias (PL n.º 578/2019), cuidava de assegurar formação profissional aos assistidos e facultar às empresas, que os contratassem, deduzir o valor da Bolsa na contribuição previdenciária patronal (impacto fiscal, portanto, nulo). O projeto não prosperou. Presumo que a opção seja perpetuar a pobreza, como massa de manobra para a exploração política, e, paradoxalmente, fomentar a informalidade.

Opinião por Everardo Maciel

Consultor tributário, foi secretário da Receita Federal (1995-2002)

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