Uma declaração do presidente Jair Bolsonaro pedindo juros mais baixos no Banco do Brasil colocou um freio no movimento de alta do Ibovespa nesta segunda-feira, 29. O índice, que avançava para o patamar dos 97 mil pontos, cedeu com a virada dos bancos para o terreno negativo e oscilou próximo à estabilidade durante todo o período da tarde. Ao final do pregão, o indicador marcou 96.187,75 pontos, com baixa de 0,05%. Os negócios somaram R$ 10,1 bilhões e ficaram abaixo da média dos últimos dias, justamente pelo longo período operando em torno da estabilidade. Durante sua participação na abertura da Agrishow, Bolsonaro defendeu a redução dos juros do Banco do Brasil para o fomento ao crédito rural. O presidente se dirigiu ao presidente do BB, Rubem Novaes, e, em tom de bom humor, disse: "Apelo, Rubem, para seu coração e patriotismo, que esses juros caiam um pouco mais". Bolsonaro afirmou durante o evento que o governo irá liberar R$ 1 bilhão para o programa de seguro rural, mas não detalhes sobre o crédito.
A declaração sobre os juros teve efeito imediato sobre as ações do Banco do Brasil, que abandonaram o sinal de alta com o qual vinham operando. A virada dos papéis do BB contaminou as demais ações do setor financeiro que, juntas, representam cerca de 30% da composição do Ibovespa. Assim, o Ibovespa anulou os ganhos e chegou à mínima de 96.003,57 pontos (-0,24%).
Interferência
Para Matheus Amaral, analista da Toro Investimentos, o desempenho do Ibovespa nesta segunda-feira foi resultado de diversos fatores, mas com grande influência dos bancos, devido ao peso desses papéis na composição do Ibovespa. Houve notícias corporativas positivas, como a intenção da Petrobrás de vender novos ativos, que acabaram por ser limitadas pela cautela do investidor. "Aquilo que o presidente tanto criticou no governo Dilma é o que está acontecendo agora. O mercado ficou cauteloso porque esse episódio se soma a outros dois recentes: o da influência nos preços do diesel e a retirada da campanha publicitária do Banco do Brasil, com demissão do diretor de marketing", disse Amaral. Ao final do pregão, BB ON ainda conseguiu variação positiva de 0,04%. Já Bradesco PN caiu 1,31% e Itaú Unibanco PN perdeu 0,80%. A "contaminação" de outras ações de bancos, explica Amaral, se dá pela questão da competitividade, uma vez que as outras instituições seriam obrigadas a acompanhar uma eventual redução de juros do BB. "O BB é uma ferramenta de pressão sobre outros bancos", afirmou o analista. A proximidade do feriado de 1º de Maio esvaziou o noticiário em torno da reforma da Previdência, uma vez que não se espera grandes definições na comissão especial da Câmara que analisará a proposta. Ainda assim, os integrantes da comissão realizam uma série de reuniões informais na tentativa de dar continuidade aos trabalhos antes do feriado. A expectativa é de que pelo menos o calendário da comissão seja definido. Os deputados têm um prazo de 10 sessões deliberativas no plenário para que possam apresentar emendas à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma e isto só deve começar a contar na próxima semana. Ainda na análise por ações, os papéis da Petrobrás tiveram desempenhos distintos, com baixa de 0,46% da ação ordinária e alta de 0,44% da ação preferencial. Na noite de sexta-feira, o presidente da estatal, Roberto Castello Branco, disse ao Broadcast que a Petrobrás quer se desfazer de seus negócios de distribuição de gás e da rede de postos de combustíveis no Uruguai.
Dólar
O dólar voltou a subir, após cair nas últimas duas sessões. Em dia de agenda doméstica esvaziada e mercado volátil pela manhã, operadores ressaltam que a disputa entre investidores para a definição do referencial Ptax de abril ganhou força na tarde desta segunda-feira, 29, e acabou pesando nas cotações, com os investidores comprados, aqueles que apostam na alta da moeda, levando a melhor. No exterior, o dólar caiu ante a maioria das moedas fortes e emergentes, com a visão de que os juros podem ser cortados nos Estados Unidos no segundo semestre. No Brasil, o dólar à vista terminou em alta de 0,24%, a R$ 3,9409. A moeda chegou a cair a R$ 3,9216, na mínima do dia, e a bater em R$ 3,9446 na máxima. O principal tema monitorado pelo mercado, a reforma da Previdência, ressalta o operador da Advanced Corretora, Alessandro Faganello, não deve ter novidades nesta semana. A comissão especial só deve se reunir para discutir o assunto na semana que vem.
Exterior
No exterior, a agenda está carregada esta semana, especialmente nos Estados Unidos, o que ajuda a manter o tom de cautela no mercado doméstico. Na quarta-feira, com o mercado fechado aqui, os dirigentes do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) anunciam sua decisão de política monetária, às 15h (de Brasília). Na sexta-feira, saem dados mensais do mercado de trabalho, também levados em conta nas reuniões do Fed. A expectativa é de manutenção dos juros, mas a maior atenção é para as declarações em seguida do presidente do Fed, Jerome Powell, ressalta o economista do Royal Bank of Canada (RBC), Tom Porcelli. A dúvida é se o dirigente vai sinalizar um possível corte de juros, por conta dos recentes números fracos de inflação nos EUA. O economista não acredita nessa possibilidade. "Powell não deve se mostrar convencido da necessidade de cortar os juros no curto prazo", ressalta ele. A expectativa de que os juros podem ser cortados nos EUA fez o dólar perder força no exterior. O índice DXY, que mede a variação da moeda americana ante divisas fortes, caiu 0,16%, para abaixo do nível de 98 pontos. Na manhã desta segunda, foi divulgado o índice de preços de gastos com consumo (PCE, na sigla em inglês). O núcleo do indicador ficou estável, enquanto se esperava alta de 0,1% em março ante fevereiro. Para o estrategista do banco canadenses BMO, Ian Lyngen, a inflação comportada deve permitir que o Fed não suba os juros nos próximos meses ou até volte a cortar as taxas, ressalta em relatório nesta segunda-feira comentando o PCE. No mercado doméstico, chamou a atenção de operadores as mudanças feitas pelos investidores institucionais em suas apostas no câmbio no mercado futuro. Os dados de sexta-feira mostram que os fundos zeraram suas posições vendidas (que apostam na queda da moeda) e passaram a ficar com posição comprada (apostam na alta) em 2,3 mil contratos em dólar futuro, o equivalente a US$ 114 milhões. Já os investidores estrangeiros reduziram a posição comprada em dólar futuro em 50 mil contratos ou US$ 2,5 bilhões. Para operadores, esses ajustes podem estar relacionados ao final do mês e a necessidade de ajustar posições. O volume estava em US$ 14 bilhões no mercado futuro até as 17h23, um pouco abaixo da média de outras sessões, mas ainda forte por conta da disputa pela Ptax. O dólar para maio subia 0,29%, a R$ 3,9415. O dólar para junho ainda tinha pouco volume, com giro de apenas US$ 1 milhão. No mercado à vista, o giro foi alto, de US$ 1,9 bilhão.
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