Para quem chegou a acreditar que a função de reação do Banco Central havia mudado após o segundo turno da eleição presidencial, quando três dias depois surpreendeu o mercado com uma alta de 0,25 ponto porcentual da taxa básica de juros, o comunicado que acompanhou a decisãodo Copom desta quarta-feira, 3,deixou a impressão em analistas e investidores de que o BC continua o mesmo do primeiro mandato de Dilma Rousseff.
Ao acelerar o ritmo de alta da taxa Selic para 0,50 ponto, subindo os juros para 11,75%, o BC avisou ao mercado que o Copom "avalia que o esforço adicional de política monetária tende a ser implementado com parcimônia".
Ou seja, desautorizou imediatamente apostas de que o aperto monetário em curso será acelerado para 0,75 ponto. Mais ainda: deve aumentar as estimativas de que a próxima alta de juros será de 0,25 ponto.
"O que era para ser uma decisão 'hawkish' (mais agressiva em termos de aperto monetário) e que poderia contribuir para controlar as expectativas, acabou sendo "dovish" (menos agressiva) ao final das contas e tendo um impacto minorado", disse a esta coluna o diretor-executivo de uma administradora de recursos com sede na Avenida Brigadeiro Faria Lima, na capital paulista.
Para ele, a sensação que ficou entre analistas foi a de que o BC gastou bala à toa.
Primeiro, com a surpreendente elevação da taxa de juros no dia 29 de outubro, dando a entender que a política monetária havia entrado num curso firme para controlar as expectativas inflacionárias.
Segundo, com a própria elevação, por unanimidade, de 0,50 ponto, o que poderia ter sido interpretado como uma maior urgência do BC no processo de fazer as expectativas cederem em direção ao centro da meta de inflação, de 4,5%.
Mas o texto do comunicado foi na linha do "velho" Banco Central.
A questão é que, ao dar um passo atrás em termos de um comunicado que gera confusão entre analistas e investidores, o BC acaba desperdiçando a eficácia deste ciclo atual de aperto monetário. Com o comunicado de ontem, muitos chegam a calcular o tamanho atual do ciclo de aperto ao redor de 1,5 ponto porcentual, dos quais 0,75 ponto já foi dado até ontem.
O problema é que o BC poderia fazer os mesmos 1,5 ponto de alta da taxa Selic, porém com uma maior eficácia na sua comunicação, contando com a ajuda do mercado - isto é, a curva de juros - fazendo um aperto das condições monetárias.
Teria conseguido esse objetivo com um ganho de credibilidade, se tivesse deixado a porta aberta para uma elevação necessária dependendo das condições macroeconômicas. Ou seja, de partida ninguém no mercado começaria hoje a refazer suas apostas para baixo, como está acontecendo com a inclusão da expressão "parcimônia" no comunicado de ontem.
"Para alguém que surpreende o mercado - pelo timing e não pela necessidade do movimento em si - com a alta de 0,25 ponto de outubro e acelera o passo para 0,50 como era de se esperar, o comunicado é incongruente", argumenta um experiente economista paulista.
Ele disse que, embora tenha ouvido o argumento de que o BC apenas quis eliminar a hipótese de subir a Selic para 0,75 ponto - como o mercado chegou a especular nos últimos dias -, o BC apenas mostrou insegurança em perseverar com o ritmo de altas de 0,50 ponto. "No mínimo, o BC está 'data dependent' e com um mínimo de ajuda, ele desacelera o aperto de volta para 0,25 ponto", explicou.
Que tipo de confusão entre analistas e investidores isso pode causar para as expectativas inflacionárias e para um novo mandato desta gestão do BC?
Para o economista acima, se além da alta de 0,50 ponto, o BC "mostra convicção" com o movimento e não sugere que há um orçamento limitado para o atual ciclo, as expectativas certamente mostrariam uma melhora importante. "Com esse comunicado e com o fato de que elas são muito sensíveis à inflação corrente (e os próximos meses serão de IPCA bem alto), não tenho muita esperança de ganhos nesse sentido, ao menos no curto prazo", disse a fonte.
E o que deve ter influenciado o BC a incluir a expressão "parcimônia" no comunicado?
"As possibilidades são muitas: programa fiscal a ser anunciado, nível de atividade, preço de commodities", comentou o economista paulista ouvido acima. "Por outro lado, temos o câmbio, um potencial de crescimento menor que limita a abertura do hiato (e consequentemente seu poder desinflacionário), e o efeito - defasado - expansionista da política fiscal praticada neste ano."
Na visão do executivo da administradora de recursos no início desta coluna, deve ter sido a combinação de três fatores: eliminar apostas de alta de 0,75 ponto da taxa Selic na próxima reunião do Copom; maior fraqueza da atividade econômica; e a expectativa de que haja algum ajuste mais concreto da política fiscal.
Todavia, o mercado quer ver, de fato, essas medidas. Como não se sabe o que virá na área fiscal, o comunicado do BC criou novamente ruído na sua comunicação, desperdiçando a oportunidade de ter seu trabalho auxiliado pelo mercado com um eventual ganho de credibilidade.
* Fábio Alves é jornalista do Broadcast
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