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Professor de Finanças da FGV-SP

Como o crime organizado tem utilizado as criptomoedas

A quem interessa ir contra as medidas de controle dos fluxos financeiros e o aumento da transparência?

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Foto do author Fabio Gallo

Nós realmente somos uma “república macunaímica”, um país multifacetado, com soluções improvisadas para problemas estruturais, cheio de contradições. Somos muito criativos e geramos todo o tipo de jabuticabas.

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Nós criamos a emenda parlamentar Pix, o orçamento secreto, alteramos a Lei de Improbidade Administrativa mantendo privilégios a políticos, há altos salários no judiciário – acima do teto do funcionalismo –, falta de planejamento e retrocessos. Para resolver a questão fiscal, foi preparado um pacote de corte de gastos meia boca e que foi desidratado. É o jeitinho brasileiro institucionalizado, guiado por interesses imediatos.

Para coroar esta série de inconsistências, nas últimas semanas tivemos a polêmica sobre o Pix. Graças a uma onda de fake news, as pessoas começaram a acreditar que haveria um novo tributo sobre o meio de pagamento mais utilizada pelo brasileiro. O governo acabou capitulando e recuou da fiscalização das movimentações financeiras.

Isso é algo que existe desde 2015 e a modificação anunciada foi que a fiscalização seria ampliada, envolvendo todas as instituições financeiras, inclusive fintechs, além do cartão de crédito e operações via Pix. A medida visava combater sonegação fiscal, lavagem de dinheiro e outros crimes financeiros, aumentando a transparência sobre os fluxos de recursos. Isso numa época em que várias evidências de que as organizações criminosas estão aumentando o uso de criptomoedas.

Primeiro Comando da Capital (PCC) tem utilizado a mineração de criptomoedas para lavar dinheiro Foto: Adobe Stock

No Brasil, por exemplo, o Primeiro Comando da Capital (PCC) tem utilizado a mineração de criptomoedas para lavar dinheiro. Investigações revelaram que a facção investiu cerca de US$ 100 milhões em criptomoedas para ocultar recursos ilícitos. Publicações recentes trazem que em 2024 o valor total de criptomoedas recebidas por endereços ilícitos ao redor do mundo atingiu US$ 51 bilhões.

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As stablecoins, devido à sua liquidez e valor estável, tornaram-se a escolha predominante para transações ilegais. Dados do Banco Central indicam que as importações líquidas de criptoativos no País aumentaram 60,7% nos primeiros nove meses de 2024 em comparação com o mesmo período de 2023, totalizando US$ 12,9 bilhões até setembro. Tanto que o então presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmou que a crescente demanda por stablecoins no Brasil está amplamente ligada à evasão fiscal e a atividades ilícitas.

A questão é: a quem interessa ir contra as medidas de controle e aumento da transparência? À sociedade é que não interessa. Muitas vezes nos sentimos como Sísifo, que vivia empurrando uma pedra montanha acima, apenas para vê-la rolar de volta.

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