Economia e políticas públicas

Opinião | Dia de festa no mercado

IPCA de março com surpresa favorável, sinais mais amenos no cenário internacional e melhora na avaliação do novo marco fiscal (seja justificada ou não) produziram uma sessão ótima para ativos brasileiros nessa terça, 11/4.

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Foto do author Fernando Dantas

O mercado de ativos brasileiros tem hoje (terça-feira, 11/4) um dia de felicidade, com alta forte da bolsa, valorização do dólar e recuo dos juros futuros.

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Um dos catalisadores do bom humor foi o IPCA de março de 0,71%, abaixo da mediana das expectativas do Projeções Broadcast, de 0,77%, e favorável qualitativamente.

Também estão contribuindo para a melhora dos ativos brasileiros algum desanuviamento no cenário internacional e, segundo alguns analistas, mais aceitação pelo mercado do novo arcabouço fiscal.

"Acho que a expectativa do mercado sobre o arcabouço melhorou, eu ainda estou cético, mas estão olhando o lado meio cheio do copo", diz Carlos Kawall, sócio-fundador da Oriz Partners, empresa de gestão de patrimônio.

Para economista Livio Ribeiro, sócio da consultoria BRCG e pesquisador associado do IBRE-FGV, "o mercado está se tocando que as projeções de inflação acima de 6% [para 2023] estão ficando pelo caminho".

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Segundo o analista, há um tempo considerável a projeção da BRCG para o IPCA deste ano é de 5,5%, e ele prevê que o mercado deve tender para esse nível.

Ribeiro acrescenta que, no plano internacional, "eventos de cauda" (isto é, de menor probabilidade, mas potencialmente perigosos) não se materializaram até agora, como uma crise bancária de grandes dimensões ou até sistêmica.

Para o sócio da BRCG, num dia como hoje, com o mundo em modo de "risk on" (apetite para risco), o Brasil, com juro real elevado e tendo apresentado o arcabouço fiscal, corresponde a uma classe de ativos e a um tipo de "história" que o investidor estrangeiro quer comprar.

"Quando eles perceberem que o arcabouço só fica em pé com muita elevação de imposto ou muita inflação, isto é, muito crescimento de PIB nominal, acho que essa felicidade toda vai acabar rápido, mas isso ainda não está acontecendo", acrescenta Ribeiro.

Luciano Sobral, economista-chefe da gestora Neo Investimentos, nota que, além do IPCA, o dia de hoje está sendo positivo para as "moedas de commodities", como as do Chile, África do Sul e Colômbia. Um motivo provável, para ele, são indicadores favoráveis da China sobre crédito e análises de consultoria dando conta de sinais de retorno do combalido setor habitacional chinês.

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No Brasil, com o reforço do IPCA de março divulgado hoje, Sobral vê "muita gente começando a pular na ideia de que o juro vai cair bastante".

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A divergência da Neo com essa parcela otimista do mercado, diz o economista, não é sobre o juro cair significativamente (ele concorda), mas sim o timing.

Para Sobral, o mais provável é corte no segundo semestre, mas não nas próximas reuniões do Copom em maio e junho. O Banco Central, na sua opinião, não deve querer cortar tão cedo "com inflação ainda alta, apesar da queda, expectativas acima da meta, fiscal mal resolvido e possibilidade de mudança da meta no meio do caminho". O economista projeta Selic de 12,25% no final do ano.

O profissional da Neo acrescenta que a ideia de que possa haver problemas de crédito no Brasil, mesmo que não materializada até agora - mas tampouco descartada em definitivo - também compõe o quadro de expectativa de queda do juro. E títulos prefixados no Brasil, que tendem a se valorizar com a projetada queda dos juros, ficam atrativos para capitais externos especulativos.

O economista Tony Volpon, ex-diretor do BC, vê uma combinação de fatores aplainando o terreno para o Copom iniciar o processo de corte da Selic - não em maio, por já ter sinalizado que não o fará, mas até possivelmente em junho.

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Assim, o IPCA de hoje reforça que há um processo desinflacionário em curso, o câmbio está apreciando, e "os preços de commodities e os IGPs [inflação ao produtor] estão indo na direção certa".

Volpon observa que o BC busca se antecipar às tendências e "não vai esperar o IPCA chegar na meta para cortar o juro".

E, olhando para a frente, o Copom vê economia em desaceleração, inflação melhorando qualitativamente (mesmo que não em patamar) e um arcabouço fiscal "que não é mil maravilhas, o ajuste fiscal será lento, mas certamente mostra que não estamos caminhando para imprimir dinheiro a rodo, que o risco de cauda fiscal está sob controle".

Para Volpon, se essas condições favoráveis se fortalecerem nos próximos meses, e o BC "não adotar a visão hiperpessimista de parte da Faria Lima enviesada por razão política", as bases para um primeiro corte, até em junho, estão dadas.

Ele lembra que, mesmo se o ciclo de baixa da Selic for iniciado em junho, a política monetária - ainda mais considerando a defasagem de 6 a 9 meses (até um ano para alguns) em relação a seus efeitos na economia real - vai ficar em território restritivo até o fim do ano e entrando em 2024.

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Volpon acrescenta que o grau de desancoragem das expectativas inflacionárias também está sujeito a alguma interpretação. Se é esperado por corrente significativa do mercado que a meta seja elevada em junho, talvez para 4%, expectativas em torno desse patamar para os próximos anos sinalizam perda de credibilidade do BC em relação  trazer a inflação de volta para a meta de 3% (de 2024 e 2025) ou apenas antecipação daquela mudança da meta?

Já na ceara internacional, o economista observa que o dólar tende a se valorizar quando a economia americana está muito bem, mas também quando há crises mais severas com impacto global. Neste segundo caso, o dólar sobe pela fuga de capitais mundo afora para a segurança dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos.

Mas hoje o mercado antevê desaceleração econômica americana sem recessão severa nem crise financeira. E esse é um cenário positivo para as moedas emergentes e que pode produzir fluxos de capitais para os países dessa categoria que tenham uma história boa ou razoável para contar aos investidores. Se esse for o caso do Brasil, e Volpon acredita que pode ser, um câmbio comportado será outro auxílio ao BC para iniciar um ciclo de afrouxamento monetário.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 11/4/2023, terça-feira.

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Opinião por Fernando Dantas
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