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Foto do author Fernando Dantas

O Copom, reunido a partir dessa terça, tomará hoje a última decisão de política monetária com Roberto Campos Neto como presidente do Banco Central (BC). Também será uma das decisões mais difíceis.

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Os departamentos econômicos de instituições financeiras e consultorias vinham de forma geral prevendo alta da Selic de 0,75 ponto porcentual (pp), dos atuais 11,25% para 12%. Porém, em cima da hora, está havendo uma migração relevante para projeção de elevação de 1pp. Algumas instituições importantes que estão com 1pp são Itaú, XP, BTG e Goldman Sachs.

Fernando Rocha, sócio e economista-chefe da gestora JGP, também julga que o aumento será de 1pp, mas até alguns dias atrás previa 0,75pp.

Antes de explicar essa mudança, Rocha ressalva que, na maioria das vezes, ele pensa que o BC não deve ser hiper-reativo e que deve tentar disciplinar os exageros do mercado - que hoje prevê, na curva de juros, duas altas consecutivas de 1pp da Selic, e a taxa básica chegando ao seu topo neste ciclo de aperto monetário nas cercanias de 15,5%.

"Mas não estamos na situação em que o BC possa ter esse papel disciplinador, porque a autoridade monetária está muito na condição de passageira, e não de condutora do processo", acrescenta Rocha.

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A economia está aquecida, a inflação muito acima da meta, o câmbio extremamente depreciado (elevando produtos e insumos comercializáveis internacionalmente, os chamados tradables) e as expectativas desancoradas. Ainda assim, Rocha pensa que uma elevação de 0,75pp, acima de um nível já alto de Selic, poderia ser suficiente em termos puramente técnicos. Mas há vários complicadores.

O primeiro é a questão fiscal, o maior problema do BC, tanto pelo estímulo à demanda quanto pelo temor sobre a sustentabilidade da dívida pública, que aumenta os prêmios de risco (com o fantasma de uma "solução" para o tamanho da dívida via surto violento de inflação insinuando-se nas mentes mais assustadas). O BC não tem qualquer poder para interferir na política fiscal.

O governo teve a oportunidade de atacar esse problema de forma mais decisiva no anúncio do recente pacote fiscal, mas optou por medidas tímidas e ainda aproveitou para encaixar a medida eleitoreira da isenção de IR até R$ 5 mil, que azedou a reação de mercado. Rocha não vê nenhum sinal de que o crescimento rápido da dívida pública como proporção do PIB seja devidamente combatido até o final deste mandato presidencial.

O segundo complicador é a troca de presidente do BC - com Gabriel Galípolo, nomeado por Lula, assumindo a partir de janeiro -, que o próprio governo e o PT politizaram. A narrativa, desde o início do terceiro mandato de Lula, é que Campos Neto era um quinta coluna decidido a prejudicar o governo, e que tudo mudaria no momento em que um BC lulista chefiado por um economista ligado ao PT passasse a dar as cartas.

Obviamente esse discurso nutriu no mercado o temor de que Galípolo, como Alexandre Tombini no governo de Dilma Rousseff, fosse se deixar comandar pelo Planalto em detrimento do seu mandato de perseguir a meta de inflação de 3%. Agora, assumindo em meio à aceleração de um ciclo de aperto monetário, Galípolo terá de provar que não é nada daquilo, e um possível caminho é o de demonstrar uma dureza para ortodoxo nenhum colocar defeito.

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Nesse contexto, para Rocha, o BC pouco pode fazer no momento além de tentar não aumentar a volatilidade, e talvez o aumento de 1pp hoje, de acordo com a precificação do mercado, evite reações mais negativas dos ativos brasileiros.

O economista e consultor Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC, pensa que a decisão hoje será de elevar a Selic em 0,75pp, embora considere que um alta de 1pp provavelmente seria mais adequada.

Como Rocha, também para Schwartsman, em termos puramente técnicos, a partir das prováveis projeções de inflação do BC - IPCA de 3,7%-3,8% no horizonte relevante, que já vai além de 2025 -, uma alta de 0,75pp da Selic estaria ok. Mas o conjunto de riscos traça um quadro mais complicado.

Schwartsman destaca "a política fiscal absolutamente inconsistente com a monetária". Nas suas contas, a demanda doméstica cresceu a um ritmo anual de 5,56% nos três primeiros trimestres de 2024, e 2/3 dessa expansão veio do consumo turbinado pela política fiscal expansionista.

E - novamente em concordância com Rocha -, Schwartsman aponta que, na seara fiscal, "o canal do endividamento é o mais preocupante, com nenhuma perspectiva de reversão da trajetória de crescimento da relação dívida/PIB, o que torna o prêmio de risco crescente e põe o dólar acima de R$ 6".

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O consultor nota que a inflação em 12 meses dos tradables, que estava em torno de 1% até meados do primeiro semestre, agora já passa de 5%, na esteira da desvalorização do câmbio.

Quase ninguém nega a situação inflacionária dificílima com a qual o BC se depara, mas alguns analistas consideram que 0,75pp de alta é adequado e que o mercado está precificando uma elevação alta demais.

Segundo Luciano Sobral, economista-chefe da Neo Investimentos, "já estamos num patamar alto de Selic e vamos acelerar a velocidade da alta; não vejo como tentar acelerar ainda mais possa estar correto e trazer mais benefícios do que custos".

Não está claro para Sobral que Galípolo possa construir sua reputação sendo exageradamente ortodoxo no início de seu mandato, mesmo porque o economista da Neo Investimentos crê que essa postura não reflita as convicções do novo presidente do BC nem seria sustentável no contexto do governo que o escolheu para comandar a política monetária.

Sobral considera que o BC sob Galípolo (e, na prática, isso já poderia se iniciar nesta última reunião da presidência de Campos Neto) talvez pudesse reforçar sua credibilidade se "colocasse a bola no chão" e apresentasse um diagnóstico detalhado de seu plano de voo para trazer a inflação de volta à meta, levando em conta fatores como câmbio, política fiscal etc.

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O economista da Neo Investimentos - ressalvando que o momento da política monetária é muito difícil e traz mais dúvidas do que certezas - lembra que manter a Selic num nível elevado por muito tempo pode ser uma estratégia alternativa a levá-la a um pico muito alto, mas com menor perspectiva de duração.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 10/12,2024, terça-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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