O resultado do CPI (inflação ao consumidor) de janeiro nos Estados Unidos, divulgado hoje (12/2, quarta-feira), foi ruim, com números acima das projeções de mercado tanto do avanço no mês com ajuste sazonal, de 0,5%, quanto na comparação anual, com 3%. O Projeções Broadcast apontava, respectivamente, 0,3% e 2,9%.
É um mau sinal, e na direção de um dos maiores temores dos mercados americanos e globais. O medo é de que um repique das pressões inflacionárias ocorra justamente quando o recém-empossado Donald Trump conduz sua guerra tarifária, que dez entre dez economistas consideram que vai provocar inflação.
Ao mesmo tempo, o presidente americano já está pressionando o Fed, BC norte-americano, para baixar os juros. Embora o Fed seja talvez o BC com a mais longa história de independência em relação ao Poder Executivo, pressões de um presidente disposto a atropelar instituições para expandir seu poder, como é claramente o caso de Trump, nunca são indolores. É um fator que perturba um pouco mais o cenário da política monetária dos Estados Unidos.
Mas há um aspecto particularmente preocupante nas interações entre as políticas de Trump e a inflação norte-americana, como notou hoje na rede X, o economista Justin Wolfers, da Universidade de Michigan. Ele comentou o indicador de expectativa de inflação dos consumidores da Universidade de Michigan, que saltou para 4,3% em fevereiro, 1 ponto percentual acima do resultado de janeiro, e a maior leitura desde novembro de 2023.
Wolfers notou no X que "quando você fala em instituir política que aumentam os preços, não se surpreenda se isso leva as pessoas a se preocuparem que aumentos de preços estejam vindo. E o Fed vai se preocupar com que essas expectativas se tornem autorrealizáveis".
O economista Bráulio Borges, da LCA 4intelligence e do IBRE-FGV, assinala que esse aumento muito forte das expectativas de inflação dos consumidores norte-americanos ocorreu nas últimas semanas, aproximadamente o período em que eclodiram as primeiras medidas de Trump de guerra comercial.
Uma questão relevante, aponta Borges, é se essa alta forte das expectativas inflacionárias nos Estados Unidos já poderia estar afetando a inflação corrente - por exemplo, o índice bem salgado de janeiro.
É algo difícil de afirmar. Houve, na alta do CPI de janeiro, fatores fortuitos, como uma grande elevação do preço dos ovos, que subiram 15,3% no mês, o que pode ser parcialmente explicado pelo impacto da gripe aviária.
Por outro lado, também no X, o economista Jason Furman, de Harvard, observa que, embora fatores fortuitos tenham elevado a inflação de janeiro, nos trinta anos de 1992 a 2019 ocorreram uma grande variedade de fatores fortuitos afetando a inflação do mesmo mês. E, ainda assim, a inflação acumulada em três meses (anualizada) em janeiro, de 3,8%, está no nonagésimo-nono percentil do período de 1992 a 2019 - isto é, está aproximadamente no 1% mais alto.
Seja como for, independentemente de já ter afetado janeiro ou não, é bastante provável que a disparada das expectativas de inflação dos consumidores seja mais combustível inflacionário nos Estados Unidos, como explica Borges.
Ele nota que vários estudos indicam que a inflação hoje nos Estados Unidos é muito mais dependente das expectativas de inflação no futuro do que da inflação passada (neste segundo caso, a chamada inércia inflacionária). Os Estados Unidos, com quase nenhuma indexação de preços, salários e contratos, é conhecido por ter baixa inércia inflacionária.
O índice de Michigan mede a expectativa dos consumidores, mas também há as expectativas de mercado (como a do Focus, no caso do Brasil). De qualquer forma, o indicador da Universidade de Michigan é um sinalizador importante de expectativas nos Estados Unidos, que já deve estar sendo impactado pelos projetos inflacionários de Trump. O que, a continuar, vai com certeza reforçar as pressões inflacionárias e acirrar o conflito entre o presidente e o Fed.
Apesar de certo alívio nos mercados recentemente, à medida que o "Trump trade" (apostas de que o novo presidente radicalizaria bem mais e de forma mais rápida a guerra comercial) é desmontado, o dia de hoje mostra que ainda não dá nem para pensar em desapertar os cintos de segurança.
Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)
Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 12/2/2025, quarta-feira.