
A fusão entre a Azul e a Gol vai criar uma empresa aérea mais forte, a maior do Brasil, juntando duas companhias que se complementam nas malhas áreas, afirmou ao Estadão/Broadcast o diretor financeiro (CFO) da Abra, dona da Gol, Manuel Irarrázaval. As duas companhias, porém, além de depender do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), ainda têm passos a dar em seus processos de reestruturação de dívidas e só faz sentido juntá-las com a conclusão desses processos e com dívidas menores. “Não vamos fazer uma transação que eleve a alavancagem, a dívida não vai aumentar”, declarou o executivo. A Gol deve encerrar 2024 com uma dívida líquida de R$ 29 bilhões, já a Azul tinha R$ 24,9 bilhões ao final de setembro passado. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
Por que essa fusão é importante para as duas empresas? Qual o racional do negócio?
O racional é criar uma companhia aérea mais forte no Brasil. Acreditamos que companhias aéreas são uma indústria essencial nos países. Nos mercados em desenvolvimento, empresas aéreas e a infraestrutura são indústrias que ajudam no desenvolvimento econômico. Ter um bom alcance na infraestrutura e na malha aérea, mas empresas aéreas fracas, significa muita instabilidade. Um país não pode se desenvolver e crescer se não tem estabilidade em suas conexões. Por isso, achamos que essa consolidação faz muito sentido no Brasil. A Abra foi criada com a visão de que é necessário ter uma consolidação na região, trazendo a Avianca e a Gol. Mas a integração não necessariamente precisa acabar com as fortes identidades que existem em cada empresas. Cada companhia da Abra tem marca, cultura e identidades fortes. A Avianca é uma referência na Colômbia, a Gol é uma pioneira na indústria aérea do Brasil. Nunca consideramos integrar as marcas ou as empresas, queremos mantê-las separadas.
E para Azul e Gol será a mesma estratégia?
Pensamos o mesmo com esse negócio no Brasil. Temos duas empresas que possuem estratégias complementares, redes que se complementam, têm marcar fortes, e também são fortes em sua cultura e imagem. Achamos que é importantes juntá-las, torná-las mais fortes e ter uma indústria aérea mais forte.
Azul e Gol são mais fortes juntas que separadas?
Claro. Este é um negócio de escala. E as duas empresas estão em processo de reestruturação de dívida, ficando mais fortes do ponto de vista da estrutura financeira. Essa transação só vai acontecer após essas reestruturações. E a Gol já tem um plano para sair do Chapter 11 (recuperação judicial nos Estados Unidos).
A Gol deve mesmo sair em maio da recuperação judicial nos EUA?
Acreditamos que esse é o caso. Apoiamos esse plano. Nossa prioridade como Abra é tirar a Gol do Chapter 11, deixando a companhia sustentável e forte. Concordamos em fazer uma transação como essa porque ela fortalece adicionalmente a Gol, e também fortalece o setor.
Quais são as principais sinergias entre as duas empresas?
São duas companhias complementares. É raro ter a oportunidade de trazer duas companhias juntas que são tão complementares. As sobreposições são muito pequenas. Será possível oferecer aos clientes produtos bem melhores, maior conectitividade usando as duas malhas áreas juntas. E a escala é importante. Quando sentarmos na frente dos fornecedores, seremos uma empresa maior, com o dobro do tamanho.
E como você disse, as duas empresas estão reestruturando suas dívidas.
A Gol ainda está no Chapter 11, e a Azul ainda está finalizando suas negociações. As duas têm passos a dar em suas reestruturações.

Como será a dívida dessa nova empresa? Será menos alavancada?
No memorando de entendimento falamos que a companhia resultando da fusão não pode ser mais endividada do que a Gol no momento de sair do Chapter 11. E, no plano apresentado pela Gol, a alavancagem se reduz rapidamente, até 1,9 vez (a dívida líquida pelo Ebitda, o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização). Não vamos fazer uma transação que eleve a alavancagem. Se você está pedindo para as pessoas ajudarem a financiar a saída da Gol, elas querem saber como será o endividamento no futuro, certo? A única forma de fazer essa transação é dizer a essas pessoas que a dívida não vai aumentar. Por isso, a alavancagem não pode ser mais alta.
Quando as conversas entre as duas companhias começaram?
Já teve conversas antes de eu chegar na Abra (em julho de 2023). Quando formamos a Abra, e começou o processo do Chapter 11, as conversas foram mais intensas porque já se via as empresas procurando reduzir o endividamento. E fazer essa transação com duas empresas muito alavancadas não resolveria nada.
Quando a proposta de fusão será submetida ao Cade?
Não posso comentar sobre isso porque não sei o momento e nem o tempo que o Cade vai levar. Eles têm o processo deles.
Acha que haverá alguma resistência a essa fusão no Cade ou no governo?
Espero que eles vejam essa fusão como nós enxergamos, e os benefícios de ter uma companhia resultante mais forte. Não posso antecipar o que o Cade vai dizer. Se estamos fazendo isso, é porque acreditamos que faz sentido ou seria só uma perda de tempo.
A Abra será a maior acionista dessa nova empresa resultando da fusão?
As estruturas societárias da Azul e da Gol são muito diferentes. E no caso da Gol, os credores vão converter dívida em ação. A Abra é o maior credor, então será o maior acionista da Gol. Já a Azul tem uma estrutura societária mais dispersa e no processo de reestruturação terão mais acionistas chegando. Quando juntam as companhias, como somos mais concentrados, seremos o maior acionista da nova companhia.
E qual seria o porcentual?
Ainda é muito incerto e acho que teve um mal entendimento sobre isso no memorando. O que dissemos é que vamos saber os valores quando conhecermos a estrutura das duas empresas após a reestruturação. Hoje, sem a estrutura de capital bem definida, não se pode determinar esses porcentuais. A única coisa que dizemos é que a Aura será o maior acionista individual, podendo ter mais que 10%. O quanto, ainda não sabemos.
E a nova empresa será listada na B3 e em Nova York?
No Brasil. Somos uma empresa brasileira, com metade do conselho formado por brasileiros.