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Oferta de empregos para profissionais trans cai 57% em 2023, mostra levantamento

Estudo da TransEmpregos aponta ainda queda de 7% entre os profissionais empregados; especialistas dizem que cenário reflete amadurecimento da pauta de diversidade nas empresas

Foto do author Beatriz  Capirazi
Atualização:

As oportunidades de emprego oferecidas a profissionais transgênero, termo considerado um guarda-chuva para pessoas que fogem dos papéis sociais de gênero, caíram 57% em 2023, em comparação com o ano anterior. A conclusão é do levantamento sobre empregabilidade para pessoas trans divulgado pela plataforma gratuita TransEmpregos, uma das poucas instituições brasileiras a mapear esses dados anualmente, realizado para o Dia Nacional da Visibilidade Trans, que acontece nessa segunda-feira, 29. No ano passado, foram oferecidas 2.549 vagas para esse público.

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A plataforma, que nasceu por iniciativa de mulheres trans e travestis que buscavam preencher a lacuna da qualificação profissional entre pessoas transsexuais com cursos gratuitos, aponta também uma queda de 7% entre os profissionais empregados em relação a 2022. Foram 1.040 no total, no ano passado.

Os dados demonstram que, mesmo com a ascensão da agenda ESG (sigla em inglês para boas práticas em meio ambiente, social e governança), que impulsionou a pauta de diversidade nas empresas, ainda são poucos os programas e trainees focados em públicos socialmente minorizados — que, por algum motivo ligado ao preconceito de cor, etnia, classe social ou gênero, foram excluídos historicamente da sociedade.

Embora os dados demonstrem uma queda — a primeira na década, desde quando a plataforma foi criada, em 2013 —, Maitê Schneider, uma das fundadoras da TransEmpregos, analisa que o cenário ainda é positivo.

1ª Marsha Nacional pela Visibilidade Trans, em Brasília, pela garantia dos direitos e sobrevivência das pessoas trans, não binárias e travestis. Foto: José Cruz/Agência Brasil

Ela aponta que o nível de contratação em si não sofreu uma queda tão expressiva. Para ela, a mudança demonstra que as empresas estão sendo mais propositivas ao criarem vagas afirmativas.

“Não diminui porque a diversidade está sendo menos importante, mas porque as vagas estão mais maduras. As empresas estão abrindo vagas de maneira mais certeira e consciente, para áreas nas quais os gestores estão preparados para lidar com diversidade”, afirma Schneider, também cofundadora da consultoria Integra Diversidade, que visa orientar como as empresas podem se desenvolver de forma mais inclusiva.

Para a especialista, é inegável o crescimento de vagas, projetos e programas com foco na população trans em grandes empresas nos últimos anos, com a interseccionalidade (termo que se refere a pessoas que fazem parte de mais de uma minoria, sendo trans e preta ou periférica, por exemplo) sendo também um fator considerado por muitas empresas na hora de criar um programa — o que também pode se refletir na queda de vagas específicas para pessoas trans.

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Mercado de trabalho

Mesmo com a queda de vagas específicas, o interesse das empresas em atrelar a pauta às suas empresas continuou a se expandir. Em 2023 houve um aumento de 16% no número de empresas parceiras (2.559 no total) da TransEmpregos em relação ao ano anterior.

Em parceria com a plataforma, grandes empresas têm criado vagas específicas para pessoas trans. É o caso da Raia Drogasil, que também tem políticas específicas como o uso de nome social (nome que a pessoa trans prefere ser chamada) para funcionários e o desenvolvimento de grupos de afinidade.

Para a consultora de diversidade e inclusão da Mais Diversidade, Melissa Cassimiro, embora falte celeridade, o cenário é de mudança no mercado empresarial. “As empresas tem demonstrado preocupação para fazer uma inclusão respeitosa e correta”.

Melissa Cassimiro, consultora sênior de diversidade e inclusão da Mais Diversidade. Foto: Divulgação/ Mais Diversidade

Os especialistas, no entanto, deixam claro que embora avanços tenham sido registrados nos últimos anos, a inclusão não é a realidade de toda a população trans, que ainda enfrenta dificuldades para a entrada no mercado de trabalho formal, especialmente pelo preconceito no recrutamento, principalmente quando a pessoa trans não é “passável” (termo utilizado para dizer que essa pessoa passa como cisgênero, ou seja, não tem características físicas que remetam ao sexo oposto).

Quando contratadas, o preconceito contra pessoas trans se estende também ao dia a dia, quando os demais colegas de trabalho e/ou clientes não reconhecem a identidade do outro, sofrem com tratamentos negativos, desrespeito pelo nome social e exclusão.

Por barreiras como essas, é alto o número de pessoas trans que não conseguem se inserir no mercado. Estima-se que 1,9% da população brasileira é de pessoas transgênero ou não binárias (cerca de 4 milhões), de acordo com uma estimativa do Banco Mundial em 2020.

Apenas 4% das pessoas trans e travestis estão empregados no mercado de trabalho formal e 0,02% tiveram acesso ao ensino superior, de acordo com dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (Antra). Diante desse cenário, não é incomum que pessoas trans acabem vivendo em situação de rua ou se prostituindo.

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Para Cassimiro, é essencial que as empresas entendam a urgência da inclusão desta população nas empresas, assim como a necessidade de que a entrada destes funcionários seja feita de forma correta. A especialista aponta que é essencial que as companhias desenvolvam programas de letramento que garantam um ambiente seguro e acolhedor para que a inclusão destas pessoas seja feita de forma duradoura e que elas eventualmente não sejam excluídas do ambiente de trabalho por preconceito de outros colaboradores, por exemplo.

Schneider é de uma opinião similar. Ela, no entanto, destaca que as companhias precisam se atentar a próprios preconceitos que ainda são perpetuados e que impõe barreiras para alguns perfis específicos de pessoas trans. Ela explica, por exemplo, que atualmente as companhias facilitam a contratação de pessoas mais “passáveis”, ampliando a exclusão em alguns grupos.

Maitê Schneider, uma das fundadoras da TransEmpregos Foto: Cibele Barreto/ Integra Diversidade

“Considerando as mesmas soft skills, senioridade e grau de especialização, um homem trans vai ser mais facilmente contratado do que uma mulher trans. Se for uma mulher trans, preta e PcD (pessoa com deficiência), eu não consigo colocar nem nas empresas premiadas por diversidade e exclusão”, diz Schneider.

A especialista aponta que para que o funcionário não só entre, mas se mantenha na empresa é essencial o desenvolvimento de programas com foco na saúde mental destes colaboradores. Schneider lembra que o número pequeno de vagas destinadas a uma determinada população muitas vezes gera a sensação de ter que provar a sua competência, o que acaba sendo um fator de estresse e uma carga emocional a mais para o profissional que afeta diretamente o psicológico das pessoas trans.

Ela ainda aponta a necessidade de que acabe as discussões e percepções de que com a inclusão de populações minorizadas as empresas estão tendo de abaixar os critérios para contratação. Melissa lembra que nenhuma empresa que tem parceria com a TransEmpregos retira exigências para contratação,.

Maitê aponta que as barreiras continuam extremamente maiores para as pessoas trans, considerando o preconceito e os julgamentos que essa população ainda sofre em um país como o Brasil, que é o que mais mata pessoas trans no mundo, pelo 15º ano consecutivo, segundo a Antra.

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“Sempre ouço que, com as vagas afirmativas, as empresas vão ter que baixar o filtro, baixar a régua. Eu me pergunto: ‘Baixar onde?’. A régua é muito mais alta para pessoas trans. Além de ter todas as competências, a autoprovação vai ser muito mais ferrenha para provar para os outros que você merece aquela vaga, que é seu direito”, disse Schneider.

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