Investimentos árabes aceleram no Brasil e superam R$ 14 bilhões

Negociações e anúncios de investimentos, que eram esporádicos, passaram a ser bem mais frequentes em anos recentes, com um pico de mais de US$ 3 bilhões em 2023

PUBLICIDADE

Foto do author Alexandre Rocha

Os investimentos de países árabes do Golfo no Brasil têm ganhado cada vez mais força. Segundo um levantamento do Sovereign Wealth Fund Institute (SWFI), organização que mapeia os investimentos globais de fundos soberanos, feito a pedido do Estadão/Broadcast, o estoque de investimentos dos fundos do Conselho de Cooperação do Golfo (GCC) no País supera US$ 14 bilhões. O número é até maior, pois há operações cujos valores não foram divulgados.

O GCC é formado por Arábia Saudita, Bahrein, Catar, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Omã, países que têm investido bilhões de dólares ao redor do mundo, especialmente por meio de seus fundos soberanos, irrigados pelos lucros da indústria petrolífera. Essas instituições são a ponta de lança de ambiciosos planos de desenvolvimento, como o Visão 2023, da Arábia Saudita, que mira a abertura e a diversificação da economia do país.

A pesquisa do SWFI traz dados desde os anos 2000, mas os negócios no Brasil se intensificaram nos últimos 15 anos, desde que a Qatar Holding comprou por US$ 2,7 bilhões uma participação no Santander Brasil, em 2010. Dois anos depois, a Mubadala, de Abu Dhabi, chegou ao País investindo US$ 2 bilhões nos negócios do empresário brasileiro Eike Batista. Mais recentemente, porém, a Arábia Saudita entrou com mais força no jogo.

Mubadala investiu ou ampliou participação em empresas como a Zamp, que controla no Brasil o Burger King, entre outras Foto: J. F. Diorio/Estadão

PUBLICIDADE

As negociações e anúncios de investimentos, que eram esporádicos, passaram a ser bem mais frequentes em anos recentes, com um pico de mais de US$ 3 bilhões em 2023. Nesta época, foi anunciada a compra de 10% da divisão de metais básicos da Vale pela Manara Minerals por US$ 2,5 bilhões. A Manara é uma joint venture entre a mineradora saudita Ma’aden e o Public Investment Fund (PIF), o fundo soberano da Arábia Saudita.

No mesmo ano, a Salic, braço do PIF para o setor de alimentos, comprou uma fatia da BRF por US$ 340 milhões, hoje em 11,03%. A Salic tem também participação de 30,55% no frigorífico Minerva, sendo a maior acionista individual da empresa. Ainda em 2023, a Mubadala investiu e ampliou participação em empresas como a Atvos, de biocombustíveis, Zamp, que controla no Brasil as redes Starbucks, Burger King, Subway e Popeye’s, e ATG, que está por trás do projeto de uma nova bolsa de valores no Rio de Janeiro.

A Mubadala é o veículo de investimento da região mais ativo no Brasil. Após a derrocada do grupo EBX, de Eike Batista, a instituição ficou com parte dos negócios do conglomerado, se estabeleceu no Brasil e passou a investir em diversos setores, como educação, alimentação, esportes, academias, biocombustíveis, refino de petróleo, transporte público, geração de energia, futebol e outros. Em 2021, por exemplo, ela comprou da Petrobras a antiga Refinaria Landulpho Alves (Rlam), atual refinaria de Mataripe, na Bahia, por US$ 1,65 bilhão. Procurada, a Mubadala declinou pedido de entrevista.

“A relevância dos investimentos árabes vem crescendo”, diz a diretora de Negócios da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex Brasil), Ana Paula Repezza. Os fundos buscam oportunidades em setores que o Brasil é forte e, ao mesmo tempo, são prioritários para seus países, como alimentos, infraestrutura, mineração e energia renovável.

Cheque alto

“Há um interesse muito grande dos sauditas no Brasil”, afirma Thiago Sandim, sócio das áreas de Fusões e Aquisições e Private Equity do escritório de advocacia Demarest. Os “cheques”, porém, são altos, acima de US$ 250 milhões. “É difícil achar ativos neste valor para participação minoritária”, observa.

Publicidade

Nesse sentido, instituições brasileiras dos mercados financeiro e de capital têm ido à região para tentar captar recursos, como BTG Pactual e Patria. O Patria já captou, por exemplo, recursos do Public Investment Fund para investimentos no Brasil. No ano passado, a gestora EB Capital e o Patria assinaram memorandos de entendimentos com o ministério de Investimentos da Arábia Saudita, e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) firmou um acordo semelhante com o Saudi Exim Bank.

Procuradas, Patria e EB não deram entrevistas. Em comunicado da época da assinatura do documento, o Patria disse que o objetivo era “explorar oportunidades de investimentos mutuamente benéficas”. O BNDES informou que “futuras parcerias entre as duas instituições estão sendo discutidas com o objetivo de atrair novos investimentos para o Brasil”.

Diplomacia

O fortalecimento das relações diplomáticas entre e o Brasil e esses países também dá impulso aos negócios. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e vários de seus ministros viajaram à região com delegações empresariais, assim como autoridades árabes visitaram o Brasil recentemente. A Conferência das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas (COP-28) em Dubai, o G-20 no Brasil, com participação de Arábia Saudita e Emirados, e a adesão dos dois países ao grupo Brics também são catalisadores.

Rodrigo Paiva, CEO da Ambipar e do grupo Lide em Dubai, conta que, ao aderir ao Brics, o governo dos Emirados identificou que o país tinha mais negócios com outros integrantes do bloco, então há a orientação de fortalecer o comércio e os investimentos com o Brasil. “Aqui o governo impõe o ritmo e o setor privado tem de acompanhar”, observou.

Publicidade