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Economia e outras histórias

Dinâmicas da dívida

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Por José Paulo Kupfer
Atualização:

Não bastassem as atribulações da economia e as instabilidades políticas, realçadas pela marcha sem calendário prévio da Lava Jato, as hesitações do governo na formulação e execução do programa de ajuste fiscal potencializam incertezas e elevam tanto os custos quanto os prazos da retomada econômica. É nesse ambiente adverso que a hipótese do rebaixamento da nota de crédito soberano, com a perda do “grau de investimento”, ganha relevância.  O financiamento de parte da dívida pública com aportes de investidores externos, o que já se antevê mais difícil e custoso, a partir da realocação de recursos globais depois do previsto reinício das altas dos juros, nos Estados Unidos, tenderia a ficar mais complicado. A eventual perda do “grau de investimento” implicaria, no curto prazo, em redução dos fluxos de recursos de fora para o mercado brasileiro e, com isso, uma sequência de efeitos negativos, a começar da alta do dólar e sua difusão para os índices de preços, levando a mais juros e mais recessão.  Muitos já avaliam que a perda do “grau de investimento”, ainda conservado no último degrau, é agora uma questão de tempo. Um dos pontos que sustentam o diagnóstico sombrio remete à evolução recente do CDS de 10 anos - contrato financeiro que funciona como uma espécie de seguro contra calotes e que, por isso, é uma boa medida de risco de insolvência fiscal considerado pelo mercado. O CDS brasileiro descolou do mexicano e colou no da Turquia em 2013, mas agora, em 2015, deixou o título turco para trás. O detalhe esclarecedor é que o México tem “grau de investimento” e a Turquia já caiu para o “grau especulativo”. Isso significa que, se a perda do “grau de investimento” ainda não foi decretada pelas agências de classificação de risco, o Brasil, para o mercado, já deixou escapar o “selo de bom pagador”. O mercado costuma “precificar” com antecedência possíveis ocorrências futuras, que nem sempre se confirmam - casos em que o próprio mercado promove ajustes, em movimentos que atendem pelo eufemismo de “realização” de lucros ou prejuízos. É inegável que a evolução conturbada do ajuste fiscal, combinada com o peso da taxa de juros, sinaliza uma dinâmica desfavorável para a relação entre a dívida pública e o PIB, que é tido como indicador crítico no rol dos critérios a partir dos quais são classificados os riscos de crédito soberano. Mas, até para entender melhor o que está realmente em jogo nessa questão, vale a pena abrir o leque das alternativas. Um exercício, elaborado pela consultoria LCA, mostra resultados interessantes. As simulações levaram em conta, separadas e em conjunto, as hipóteses da reversão do déficit primário de 0,5% do PIB em 2016 para o superávit de 0,7% do PIB que havia sido definido em julho, assim como a revisão dos resultados do PIB em 2012 e 2013, que será divulgada em dezembro, juntamente com o número do terceiro trimestre e deve elevar o PIB, reduzindo, portanto, a relação dívida/PIB. Supõem ainda que o BNDES começaria a pagar sua dívida com o Tesouro em 2016 - e não em 2020, como está programado - e que o Banco Central zeraria, gradativamente, seu estoque de swaps cambiais com a venda de parte das reservas internacionais. São fatores que oneram a dívida pública bruta. A conclusão das simulações é de que a trajetória da dívida pode atender a outras dinâmicas antes de um inevitável “downgrade”. Com todas as hipóteses benignas combinadas, a relação dívida bruta/PIB chegaria, no máximo, a 63% do PIB em 2016, recuando para menos de 60% já em 2018. Se for verdade que o sinal vermelho da perda do “grau de investimento” acende quando a dívida bruta se aproxima de 70% do PIB, nesse caso, o risco se configuraria bastante baixo. Na pior combinação de hipóteses, de outro lado, a dívida alcançaria 68% do PIB em 2016/2017. Antes que perguntem: não foram consideradas as hipóteses da saída do ministro Joaquim Levy ou da presidente Dilma.

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