O Banco Central surpreendeu o mercado com uma largada acelerada na elevação dos juros. Aumentou a taxa básica em 0,75 ponto porcentual, acima das projeções dos analistas, e anunciou outro aumento de igual magnitude na próxima reunião, em maio. Foi uma decisão difícil, porém acertada.
Conhecida como Selic, a taxa básica serve para balizar o custo do dinheiro nas transações realizadas na sociedade. No sistema financeiro, é a taxa de juros de um dia que determina a inclinação da curva de juros para frente. Quando está muito baixa, pressiona a parte mais longa da curva para cima; se está alta demais, a curva de juros se achata, podendo inclusive ficar negativa em alguns casos.
Os juros altos têm inconveniências, entre elas tornar a rolagem da dívida pública mais cara e aumentar o custo do crédito. Como a atividade econômica está anêmica e o desemprego elevado, eis a dúvida: o efeito do juro mais alto não agravaria o quadro?
Essa decisão, porém, seguiu a prescrição técnica. A desvalorização cambial e o aumento das cotações das commodities tiveram impacto nos preços internos de forma transitória, mas influenciaram nas expectativas de inflação para este ano e o próximo. A elevação dos juros deve arrefecer essa pressão nos preços e a volatilidade da taxa de câmbio.
O nosso alento é o cenário externo positivo. Apesar das incertezas, as indicações são de um início de crescimento vigoroso no exterior. O Banco Mundial projeta 4%; todavia, pode ser maior. Um destaque é o pacote de estímulos fiscais aprovado nos Estados Unidos, que deve impulsionar a economia americana e a mundial.
Isso ajuda num momento de incertezas no cenário interno. Na margem, os números são positivos. Em janeiro, o IBC-Br, que é a estimativa do PIB mensal feita pelo Banco Central, mostrou uma alta acima das expectativas do mercado e a abertura de vagas de trabalho apresentou recuperação forte. As incertezas são a evolução da pandemia no País, o ritmo de vacinação e a dinâmica fiscal.
A questão central dos juros é a calibragem. Mesmo com as duas altas de março e maio (prevista), a taxa de juros real continuará negativa. Há vantagens a considerar numa alta maior que a esperada pelo mercado. A primeira é que afasta com mais segurança a alta de preços temporária e evita que uma inflação considerada transitória se transforme numa inflação inercial, mais difícil de erradicar e com consequências duradouras.
Outro benefício é que uma alta mais forte encurta o ciclo de ajustes. Um processo de elevação demorado tem o custo de juros altos por mais tempo e pode até ter uma taxa máxima maior do que a de uma política mais contundente. Dessa forma, o custo social do ajuste monetário é mais curto.
Considerando prós e contras, melhor não correr riscos.
O papel do Banco Central é calibrar a taxa para cumprir a meta de inflação. Analisa indicadores econômicos, pondera os riscos e as incertezas. O espaço de manobra do BC é estreito e depende de inúmeras variáveis fora de seu controle, como a pandemia, o estado da economia internacional, o andamento das reformas e o ajuste fiscal.
A evolução da dívida pública é outra preocupação. Estabilizou-se no ano anterior à pandemia, quando também foi aprovada a reforma da Previdência, colocando-a numa trajetória melhor. A queda do PIB e o auxílio emergencial a levaram para outro patamar, acima. A questão agora é evitar que fuja do controle e o País entre num círculo vicioso de juros mais altos e crescimento baixo.
Nesse cenário inquietante, a vacinação e as reformas representam o centro definidor. O andamento positivo nas votações do Congresso e a aceleração do ritmo da vacinação podem dar tração à atividade econômica e acomodar as expectativas em relação ao câmbio – com efeitos diretos na inflação. É a porta para o País entrar num círculo virtuoso de juros baixos sustentáveis, mais crédito, mais investimento e melhorias nos indicadores sociais.
E o mais importante: para preservar vidas.. * PRESIDENTE DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO BRADESCO. ESCREVE A CADA DUAS SEMANAS
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