Lula centraliza recados a Trump enquanto ministros tentam baixar fervura de tarifaço americano

Alckmin, Haddad e Padilha têm dado declarações mais conciliatórias e de cautela; avaliação é que só o presidente pode fazer críticas contundentes nessas situações

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BRASÍLIA - Há uma espécie de divisão de tarefas nas declarações do governo federal sobre as ameaças de taxação de produtos brasileiros pelos Estados Unidos. Alguns dos principais ministros têm tentado colocar água na fervura enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vem falando abertamente em impor tarifas a importações de produtos americanos e de recorrer à Organização Mundial do Comércio.

O papel de “good cop” tem sido exercido pelos ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Fernando Haddad (Fazenda) e Geraldo Alckmin (Indústria e Comércio, além de ser vice de Lula) – sendo esses dois últimos os principais envolvidos nas discussões.

'Se EUA taxarem aço brasileiro, vamos denunciar na OMC ou taxar produtos que importamos deles', disse Lula nesta sexta-feira, 14. Foto: Evaristo Sá/AFP

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A diferença no teor das declarações, apurou o Estadão/Broadcast, teria a ver com funções institucionais. A avaliação é que só Lula, por ser chefe de governo e Estado, pode fazer críticas contundentes nessas situações.

Na noite de segunda-feira, 10, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou ordem executiva para impor tarifas de 25% às importações americanas de aço e alumínio. A medida passa a valer a partir de 12 de março e, se não for revertida, afetará a indústria local. Na quinta-feira, 13, o americano citou o etanol brasileiro em plano para aplicar tarifas de reciprocidade sobre outros produtos importados pelos Estados Unidos.

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Linha do tempo

A primeira declaração de Lula sobre o assunto foi antes de a tarifa sobre o aço e o alumínio ser anunciada. Ele foi questionado por jornalistas e afirmou que taxaria de volta caso Trump tomasse alguma medida protecionista contra produtos brasileiros.

“Se ele taxar os produtos brasileiros, haverá reciprocidade do Brasil em taxar os produtos que são importados dos Estados Unidos. Não há nenhuma dificuldade”, disse o petista em 31 de janeiro. “Da minha parte, o que eu quero é melhorar a relação com os EUA, exportar mais se for necessário, importar mais se for necessário”, declarou.

Na véspera da assinatura das tarifas, Fernando Haddad ainda evitava dar declarações sobre o assunto. “O governo tomou a decisão de só se manifestar, oportunamente, com base em decisões concretas. Não em anúncios que podem ser mal interpretados, revistos. O governo vai aguardar a decisão oficialmente, antes de qualquer manifestação”, disse Haddad a jornalistas na segunda-feira, 10. Alckmin adotou teor semelhante. “Vamos aguardar porque nós acreditamos muito no diálogo”, disse o vice-presidente.

No dia seguinte, com a taxação do aço e do alumínio assinada, Haddad manteve o tom cauteloso. Também foi quando surgiu a interpretação de governistas de que não se tratava de uma medida contra o Brasil, já que atingia também outros países exportadores.

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“Estamos acompanhando. Primeiro, para saber da minúcia da decisão. Segundo, observando quais as implicações isso vai ter. Porque não é uma decisão contra o Brasil, é uma coisa genérica para todo mundo”, afirmou Haddad. Ele também disse que aguardava as reações dos outros países atingidos. E falou em negociar.

Em 12 de fevereiro, Alckmin concedeu entrevista a jornalistas para falar de política industrial – mas as perguntas foram quase todas sobre as tarifas de Trump. Ele manteve o tom cauteloso e repetiu a fala de Haddad sobre não serem medidas contra o Brasil. “Não tem guerra tributária, tem entendimento baseado no interesse público. Eu sou dos que defendem muito o comércio exterior, é importante para a sociedade como um todo”, declarou.

Na quinta-feira, 13, foi quando Trump assinou o plano de criação de tarifas que cita o etanol brasileiro. Naquele dia, tanto Alckmin quanto Haddad falaram sobre o assunto. “Temos que aguardar. A maneira como estão sendo anunciadas as medidas é um pouco confusa ainda. Temos que aguardar para ter uma ideia do que é concreto, do que é efetivo”, declarou Haddad.

O ministro da Fazenda e o vice-presidente mencionaram que a balança comercial entre Brasil e Estados Unidos é equilibrada. Alckmin, que convidou jornalistas para uma entrevista coletiva especificamente sobre o assunto na quinta, defendeu cotas de exportação de aço para os Estados Unidos.

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Nesta sexta-feira, 14, o chefe do governo repetiu que poderá mesmo taxar de volta produtos americanos, aumentando o tom em relação a seus ministros. “Ouvi dizer que vai taxar o aço brasileiro. Se taxar, vamos reagir comercialmente ou vamos denunciar na OMC ou vamos taxar os produtos que a gente importa deles”, disse o petista em entrevista à Rádio Clube do Pará.

“Eles [americanos], que defendiam o mercado livre, agora estão defendendo o protecionismo. É os Estados Unidos para os americanos, tudo para os americanos, ‘vou taxar todos os produtos, vou tomar a Groenlândia, anexar o Canadá’”, disse Lula, em referência a ideias defendidas publicamente por Trump.

O governo brasileiro está discutindo como reagir em relação ao caso. Até o momento, a gestão está em contato com setores para avaliar os impactos e medir as novas possíveis medidas a serem anunciadas por Trump. A ideia defendida pelo Executivo é de cautela em relação às respostas. Nesse sentido, a comunicação do grupo de ministros é imprescindível para manter a moderação – mas o presidente segue mencionando a possibilidade de taxar de volta produtos americanos.

Como mostrou o Estadão/Broadcast, desde ontem, o Palácio Itamaraty estuda a declaração do americano, não só a referência ao Brasil sobre o etanol, mas a determinação de Trump como um todo. Integrantes do setor privado que acompanham o comércio exterior, contudo, alertam que o Executivo brasileiro deve estar preparado e começar a fazer tratativas em alto nível com os Estados Unidos.

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