A inflação brasileira em fevereiro deu uma estilingada e foi a 1,31%, maior patamar para o mês desde 2003. Em 12 meses, chegou a 5,06%, bem acima do teto da meta perseguida pelo Banco Central (3%, com margem de tolerância de 1,5 ponto, para mais ou para menos). É um problema extra para o BC, já que agora está em vigor a “meta contínua” — ou seja, seis meses com o IPCA acima do teto da meta já será considerado um descumprimento. Mas é um problema maior, claro, para a população, que vê o seu poder de compra ser corroído.
Em fevereiro, a inflação foi puxada pela energia elétrica (um aumento excepcional decorrente da recomposição das tarifas, após o pagamento de um bônus pela hidrelétrica de Itaipu em janeiro) e pela educação (esta, uma alta sazonal). Mas os preços dos alimentos também voltaram a ter um aumento razoável (0,7%). E alimentos não discriminam classe social — todo mundo precisa comer.

Na semana passada, o presidente Lula vociferou contra essa situação. “A gente não quer brigar com ninguém, a gente quer encontrar uma solução pacífica (para o preço dos alimentos). Mas, se a gente não encontrar, a gente vai ter de tomar atitude mais drástica, porque o que interessa é levar a comida barata para a mesa do povo brasileiro”, disse, durante evento em um assentamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Campo do Meio (MG).
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As medidas anunciadas pelo governo para isso, porém — principalmente zerar o imposto de importação sobre vários produtos —, foram consideradas por analistas como completamente inócuas. Não parece haver muito mesmo o que o governo possa fazer, exceto esperar a nova safra entrar no mercado e derrubar os preços, pelo menos dos alimentos mais básicos. Lula, porém, parece querer ganhar essa no grito. O que seriam “atitudes mais drásticas”? Controle de preços? Neste momento da história, já parece estar mais do que claro que isso nunca funcionou, e obviamente não iria funcionar agora.
A inflação alta é uma das principais pedras no sapato do presidente Lula, a ponta mais visível, para a população, dos problemas macroeconômicos do País. E a alta dos preços passa muito pelas atitudes do governo. O BC já alertou várias vezes: os gastos públicos desenfreados, o aumento do endividamento, as incertezas sobre os rumos do arcabouço fiscal tornam mais difícil o trabalho de controlar a escalada dos preços. Seriam precisos juros cada vez mais altos para isso, com efeitos complicados para a atividade econômica.
Mas qual tem sido a saída do governo para isso? Com a popularidade em baixa, Lula tem se preocupado bem pouco em economizar. Pelo contrário, parece querer estimular ainda mais o consumo, tanto público quanto privado.
Recentemente, o governo anunciou a liberação do saldo do FGTS para trabalhadores demitidos e que haviam optado pelo saque-aniversário. A previsão era de injeção de R$ 12 bilhões na economia com isso. Nesta quarta-feira, será publicada a medida provisória que facilita o crédito consignado para trabalhadores formais do setor privado. São medidas que podem acabar se tornando contraproducentes no que se refere à popularidade de Lula: se o consumo aumenta e a inflação não baixa, os juros têm de permanecer altos por mais tempo, deprimindo a economia. Isso não pode ser bom para a imagem de quem sonha com uma reeleição.
Se o governo quer que as pessoas possam gastar mais — o que é louvável em um país pobre como o nosso —, precisaria contrabalançar isso gastando menos, controlando sua dívida, para que os efeitos na economia sejam diluídos. Não é o que se vê, pelo contrário. Com uma eleição difícil apontando no horizonte, o temor da maior parte dos analistas é que haja uma aposta cada vez mais firme no crescimento dos gastos públicos, para induzir o crescimento econômico. O remédio está errado, já vimos esse filme antes. E infelizmente sabemos qual é o seu final.