A combinação entre fatores positivos dos cenários interno e externo deu condições para que o índice Bovespa tivesse novo pregão de alta nesta sexta-feira, 5, voltando a superar o patamar dos 97 mil pontos. Os esforços do governo em melhorar a articulação política em torno da reforma da Previdência continuaram a fazer efeito nos negócios, embora o temor de novos ruídos políticos não tenha se dissipado totalmente. No exterior, o apetite por risco manteve bolsas de valores em alta nos Estados Unidos e Europa, o que favoreceu também os mercados emergentes, como o brasileiro.
Ao final do pregão, a Bolsa marcou 97.108,17 pontos, com alta de 0,83%. Os negócios somaram R$ 12,2 bilhões. Com o resultado, o índice encerrou a semana com ganho de 1,78%, obtido graças ao arrefecimento da crise política que havia se instalado em fevereiro, que permitiu a melhora da confiança do investidor. No mercado de câmbio, o dólar encerrou a sessão com valorização de 0,38%, a R$ 3,8718. Na primeira semana de abril, marcada por três pregões de queda e dois de alta, o dólar perdeu 1,13%, oscilando sempre entre os níveis de R$ 3,85 e R$ 3,87.
Bolsa
O Ibovespa chegou a enfrentar alguma instabilidade pela manhã, mas consolidou o viés positivo ainda na primeira etapa dos negócios. "Se por um lado ficou clara a falta de apoio ao governo na CCJ (na audiência com Paulo Guedes), por outro, houve melhora na articulação do governo. Essa melhora foi fruto da crise política, que acabou por elevar a curva de aprendizado do governo", disse Carlos Thadeu de Freitas Gomes Filho, economista-chefe da Ativa Investimentos.
Para Freitas Gomes, a cautela que permanece ante o risco de novos ruídos na política é o que impede o Ibovespa de superar a resistência psicológica dos 100 mil pontos ou dos múltiplos aquém do esperado. "Essa cautela impede o Ibovespa de marcar o seu valor justo, uma vez que o temor de novas crises faz o investidor deixar algum prêmio", disse.
Entre as ações que fazem parte da carteira do Ibovespa, o destaque ficou mais uma vez com os papéis da Petrobras. Embaladas pelos ganhos do petróleo, os papéis também reagiram ao noticiário corporativo. No final da tarde, a estatal confirmou que a Engie venceu a disputa para comprar 90% da Transportadora Associada de Gás (TAG). O fundo canadense Caisse de Depot e Placement du Quebec (CDPQ) é sócio da Engie no negócio de US$ 8,6 bilhões. Ao final do pregão Petrobras ON e PN tiveram ganhos de 2,23% e 1,09%, nesta ordem.
Dólar
Depois de uma manhã de idas e vindas, em que chegou a ser cotado abaixo de R$ 3,85, o dólar operou em alta ao longo de toda a tarde e, com máxima de R$ 3,8738 na reta final do pregão.
Segundo operadores, o enfraquecimento do real hoje, apesar de alta da bolsa, pode ser atribuído a fluxos pontuais de saída de recursos e a uma postura mais defensiva dos agentes, já que a próxima semana será decisiva para o andamento da reforma no Congresso, com a entrega do texto do relator da previdência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), deputado Marcelo Freitas (PSL-MG), no dia 9. A votação do parecer está prevista para o dia 17.
A avaliação é a de que o mercado já assimilou o impacto da audiência do ministro da economia, Paulo Guedes, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e da participação mais ativa do presidente Jair Bolsonaro na batalha pela reforma, após encontro com lideranças políticas. Uma nova rodada de depreciação do dólar, caso não haja solavancos lá fora, viria apenas com sinais mais concretos de apoio parlamentar à reforma.
Declarações de Bolsonaro, Guedes e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia nesta sexta-feira - dos dois últimos em evento empresarial em Campos de Jordão (SP) - sinalizam que o governo já admite que não conseguirá emplacar mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC) e na aposentadoria rural. Em café da manhã com jornalistas hoje, em Brasília, Bolsonaro disse que, entre os pontos da reforma, a idade mínima e tempo de contribuição "são os mais importantes" e sinalizou que, dadas as resistências observadas, o debate sobre o sistema de capitalização pode ficar para um segundo momento.
Para Cleber Alessie, operador da corretora H.Commcor, o mercado parece ter encontrado um ponto de acomodação para o dólar e agora espera novidades sobre o andamento da reforma para apostas mais contundentes. "Há um otimismo cauteloso com a questão da previdência. Tem que ter motivos para movimentações mais fortes, pelo menos o sinal verde da CCJ", diz Alessie, ressaltando que uma diluição da proposta já é esperada e a aprovação de um projeto com economia de R$ 700 bilhões (abaixo do R$ 1 trilhão estimado por Guedes) em 10 anos já seria motivo para comemorar.
Além da cautela em relação ao andamento da reforma, é preciso considerar que o estrangeiro ainda carrega posições relevantes compradas em dólar, o que tecnicamente impõe limites a depreciação maior da moeda americana.
Marcos Trabbold, gerente de operações da B&T Corretora, afirma que a alta do dólar hoje esteve mais ligada a movimentos técnicos e saídas de recursos que a expectativas em relação ao cenário. "Apesar de declarações do presidente e do Guedes, não houve um fato mais forte que pudesse mexer com o mercado", disse.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.