BRASÍLIA - O plano de fusão das aéreas Gol e Azul não será o único grande caso de concentração que vai despertar a atenção do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em 2025. Pelo menos outras cinco operações atrairão o foco do órgão antitruste ao longo do ano, segundo integrantes do Cade e especialistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast.
Estão na lista duas aquisições no setor portuário, a compra da Brasnefro pela Davita, a fusão da Petz e da Cobasi e a venda de participação da Shopper para o iFood.
Quatro processos que investigam práticas de empresas também merecem acompanhamento especial, disseram pessoas a par do tema à reportagem. O mais citado foi o caso aberto contra a Apple. Em novembro do ano passado, a Superintendência-Geral (SG) do órgão determinou em medida preventiva que a companhia permita a liberdade de escolha dos canais de distribuição e sistemas de processamento de pagamentos para compras in-app.
Investigação similar acontece sobre a Play Store, da Google. A expectativa é de que os casos sejam julgados ainda no primeiro semestre pelo tribunal e gerem um precedente importante para as big techs. A resposta das autoridades sobre práticas de plataformas digitais está sob escrutínio no mundo todo, especialmente após a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, que deve ter uma postura mais flexível com as gigantes de tecnologia.
No Brasil, além de processos já abertos pelo Cade, a atenção se volta à regulamentação econômica das big techs, que será alvo de proposta legislativa da Fazenda e envolve diretamente o órgão antitruste.
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A disputa entre a Eldorado Celulose e a CA Investment e uma discussão sobre licenças para acesso à tecnologia 5G que opõem a Ericsson e a Motorola junto da Lenovo são os outros dois casos lembrados por membros do Cade. A advocacia da concorrência acompanhará ainda a troca na presidência do antitruste, já que o mandato de Alexandre Cordeiro acaba em julho deste ano.
Gigante na aviação
O plano de a Azul e Gol unirem seus negócios no Brasil é um dos principais casos que deve colocar o Cade nos holofotes do consumidor, do mercado, da mídia, da classe política e da advocacia concorrencial. Considerada bastante complexa, por reduzir os grandes players da aviação no Brasil a dois, a operação ainda não chegou oficialmente ao Cade. Está em fase de pré-notificação, momento que serve para o órgão orientar os advogados das empresas sobre o que será necessário ao antitruste.
Um dos focos da avaliação será a sobreposição de voos das duas companhias. Embora elas aleguem que o número é baixo, esse cálculo não contabiliza os voos feitos com escala — opção que tem efeitos concorrenciais na compra de passagens e por isso será escrutinada pelo Cade. A previsão inicial é a de que o processo se alongue durante todo 2025, com eventual julgamento somente no fim do ano.
Petz e Cobasi
A fusão entre as duas redes de petshop deve ter a análise finalizada pela Superintendência-Geral do Cade ainda no primeiro semestre. A tendência é de aval sem restrições, embora a operação ainda esteja sob estudo. O caso pode acabar no tribunal se alguma empresa entrar como terceira interessada no processo e recorrer do possível sinal verde da SG — ou se algum conselheiro decidir levar o negócio a julgamento.
Para o sócio da área concorrencial do Cescon Barrieu, Ricardo Gaillard, o processo é importante de ser acompanhado para entender se o antitruste terá novas dinâmicas de análise de mercado considerando o varejo online e físico.
“Sempre que há um caso de varejo — que vai olhar o mercado local e o online — por si só é um precedente importante”, observou Gaillard. Será interessante também observar se neste início de ano alguma empresa pedirá para entrar como terceira interessada na ação.
Setor de saúde
Consolidações no setor de saúde tem chamado atenção do Cade nos últimos tempos e essa é uma das razões para a aquisição da Brasnefro pela DaVita entrar no rol de destaques de 2025. A DaVita é uma subsidiária brasileira de empresa norte-americana e oferta serviços de diálise para pacientes renais em todo o País. Já a Brasnefro é de um conglomerado alemão e atua em diálise em seis Estados e DF.
A SG já avaliou a operação e, em novembro, sugeriu que o Cade barre o negócio. O processo ainda será julgado pelo tribunal. Em nove dos dez mercados analisados no setor de tratamento para pacientes crônicos, a SG identificou altas concentrações nas mãos das empresas, presença de barreiras de entrada e baixa rivalidade.
Na avaliação do sócio do Cescon Barrieu, por ora, o caso merece atenção do setor de saúde para se entender qual limite de concentração o Cade vai aceitar no mercado. “Por hora, a leitura é: na medida em que ele está aprovando vários casos, o mercado tem espaço para consolidação na área de saúde. Mas a gente vai chegar a algum teto em algum momento”, observou.
iFood e Shopper
O tribunal do Cade também deve julgar em breve a compra de parte da Shopper pela empresa de delivery iFood. O caso chegou a ser pautado no fim de ano, mas teve a análise adiada.
Em 2024, a SG aprovou a operação sem restrições, mas a conselheira Camila Alves entendeu que o caso precisaria ser analisado mais profundamente, apontando a necessidade de maior detalhamento sobre o volume de vendas das empresas na análise da estrutura da oferta (por exemplo, iFood, Rappi e Uber Mercado).
Terminais portuários
Na área de logística, a compra bilionária de 48% da Santos Brasil pela francesa CMA CGM e a venda da Wilson Sons para a Shipping Agencies Services (SAS), subsidiária do grupo MSC, serão simbólicas. O Estadão/Broadcast apurou que, por ora, a avaliação no órgão é a de que as operações não devem impor muitos desafios. Os processos ainda estão sob análise da Superintendência-Geral.
Gaillard, do Cescon Barrieu, ponderou que os casos logísticos têm mais relevância pela magnitude das partes que estão envolvidas. “O Cade tem uma visão, que eu tendo a concordar, de que o País tem uma carência de infraestrutura. Sempre que há alguém investindo nesse setor, em tese você está abrindo e ampliando o mercado. Então, aí seriam mais eventualmente discussões de remédios comportamentais”, pontuou.
