ENVIADO ESPECIAL / CANNES
Uma experiência pessoal levou uma das sócias da agência americana especializada em saúde The Cement Bloc, de Nova York, a propor um desafio a seus clientes: quem cuida dos cuidadores de pessoas com doenças crônicas ou terminais? É um público que Elizabeth Elfenbein não pensaria em atingir, apesar de ter uma década de experiência voltada à publicidade específica para laboratórios farmacêuticos e hospitais, não fosse o caso de seu irmão Michael.
Há quatro anos, a esposa de Michael foi diagnosticada com câncer no ovário. De um dia para o outro, além de pai e marido, ele também se tornou um cuidador. Foi a partir dessa experiência que ela percebeu que esse público, que tem poder de decisão importante na compra de medicamentos e na direção que os tratamentos dos doentes vai seguir, estava desatendido.
Além de ignorados do ponto de vista mercadológico, diz Elizabeth, os cuidadores ficam também em segundo plano quando o assunto é a saúde psicológica. A palestra da The Cement Bloc no Lions Health, evento voltado à saúde e ao bem-estar paralelo ao Cannes Lions – Festival Internacional de Criatividade, que tem o Estadão como representante oficial no País, tentou apontar soluções para as duas questões.
Ao ver seu irmão passar pelas dificuldades que milhões de cuidadores têm de enfrentar todos os dias, a publicitária resolveu agir. Ao realizar uma pesquisa sobre o tema, a The Cement Bloc levantou que um em cada dez pessoas são cuidadores em tempo parcial ou integral de parentes e amigos.
A pesquisa mostrou que exercer esse papel leva a um alto nível de estresse e também a desafios pessoais. Ao precisar separar tempo para cuidar de um ente querido, geralmente o cuidador acaba se dedicando menos ao emprego – o que pode acarretar dificuldades financeiras para a família.
Do ponto de vista mercadológico, ignorar o cuidador é perder a chance de atender um “cliente” que vê a situação do paciente de ambos os lados: o do que é possível fazer do ponto de vista médico e também sobre a melhor decisão para que a pessoa amada possa ter a vida mais confortável possível.
Voz. Para chamar a atenção para o assunto, a The Cement Bloc montou na semana passada uma comunidade na web para discutir as dificuldades enfrentadas pelos cuidadores – entre os personagens do filme, que soma 50 minutos em depoimentos de pessoas que cuidam de seus filhos, parceiros e pais, está Michael, irmão de Elizabeth.
O filme, segundo Michael, que participou da apresentação da The Cement Bloc em Cannes, pode fazer as pessoas que estão passando por uma situação de doença na família refletirem sobre o seu papel de cuidador. Segundo ele, falar sobre o assunto pode ser de grande ajuda. O vídeo com os depoimentos está disponível na página do Facebook Caregivers Speak Up (Os Cuidadores Falam), disponível apenas em inglês.
Para amplificar o debate, que por enquanto está restrito à rede social, a sócia da The Cement Bloc diz que os vídeos gravados com os cuidadores farão parte de uma estratégia de ativação em eventos dos setores farmacêutico e médico.
Um dos clientes da The Cement Block, o sistema de saúde Montefiore, mantém um centro de apoio e treinamento para as pessoas que precisam cuidar de parentes e amigos doentes por um longo período. “O que está claro é que nem sempre os cuidadores pedem ajuda”, diz Loreen Babcock, executiva da Montefiore Health Systems. “E isso nos fez pensar em uma pergunta: ‘Quem vai cuidar dos cuidadores?”
“Na nossa experiência, a necessidade de ajudar essa pessoas não termina com a morte do ente querido”, explica a executiva. “Temos casos em que as pessoas continuaram a buscar o apoio psicológico por mais dois a três anos para lidar com a perda.”