BRASÍLIA - O presidente em exercício Michel Temer chega hoje aos dois meses de governo pedindo calma aos empresários. A ausência de resultados sobre a economia real e de medidas que ataquem problemas estruturais tem causado certo desconforto entre representantes de setores que apostaram no novo governo para solucionar boa parte dos problemas do País.
“O momento é de uma gravidade econômica que exige medidas corajosas”, disse Flávio Rocha, presidente da varejista Riachuelo e um dos primeiros empresários a criticar a política econômica do governo Dilma Rousseff. “Estou absolutamente frustrado.” Para ele, as medidas econômicas de cortes de gastos públicos precisam andar mais rápido.
O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, também reconhece que os resultados práticos do governo Temer, até agora são poucos. “Gostaria de ver o governo tomando decisões importantes, nas áreas de Previdência, reforma trabalhista, desburocratização. Isso não temos visto muito”, diz Andrade.
A equipe econômica, no entanto, só deve adotar medidas mais contundentes para a recuperação da economia depois da votação do impeachment de Dilma Rousseff, programada para o fim de agosto. Por enquanto, o governo evita desagradar ao Congresso Nacional, que dará a palavra final sobre o afastamento definitivo da presidente. Mas a expectativa é que, uma vez definido o quadro político, os investimentos serão destravados.
É a expectativa do presidente do Itaú Unibanco, Roberto Setubal. “Espero que, uma vez definida a questão do impeachment, seja possível avançar na discussão com a sociedade de uma agenda de reformas prioritárias e absolutamente necessárias, em especial, a política e a fiscal, fundamentais para o País voltar a se desenvolver de forma sustentável”, disse em nota. “Tivemos alguns avanços nesse período, mas os desafios ainda são grandes e há muito a ser feito.”
Desde que a presidente Dilma Rousseff (PT) foi afastada do cargo, em maio, a confiança de empresários tem apresentado notável melhora, sobretudo em termos de expectativas. O otimismo tomou conta, por exemplo, da indústria, que há dois anos acompanha o encolhimento de seu Produto Interno Bruto (PIB).
Os dados da economia real, porém, não reagem na mesma rapidez. O faturamento da indústria segue em queda, e o emprego voltou a níveis de 2006, segundo a própria CNI. “Tem uma melhora no ambiente político. A sociedade está vendo o governo com mais confiança. Mas não há uma mudança na economia em que possamos ver o resultado real disso”, diz Andrade. “A reversão ainda não ocorreu.”
Na visão do presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Antonio Megale, a atuação de Temer ainda é um pouco “modesta”, em razão justamente da pendência em relação ao impeachment. Mas ele diz que vê “uma vontade grande de acertar” por parte do governo de Michel Temer nesses dois primeiros meses.
O mercado financeiro, por enquanto, está relevando as medidas de afrouxamento fiscal, colocando na conta da “interinidade” de Temer. “Mas, em compensação, vai aumentar a cobrança por medidas de arrocho, se o impeachment for consumado”, previu o executivo de um banco estrangeiro.
O economista-chefe do banco americano Morgan Stanley no Brasil, Arthur Carvalho, diz que, na prática, pouco foi feito em dois meses, mas o governo demonstrou que se comunica melhor do que a gestão anterior. Ele destacou que foram feitas importantes sinalizações de condução da economia como a PEC dos gastos, a agenda da privatização e a coragem de se discutir a reforma da Previdência. Os pontos negativos ficaram para a aprovação do aumento dos salários do Judiciário e do Bolsa Família, mas Carvalho destaca que isso pode ter sido uma forma de negociar a aprovação de medidas estruturais importantes.
A aposta do governo é de que a recuperação da economia vai permitir, entre outras coisas, uma melhora do emprego, reduzindo as resistências de medidas impopulares. “Com o crescimento do PIB de 1,2% e a regularização das empresas para recomeçar a contratar, teremos o caminho da retomada do crescimento. O empresário precisa de confiança”, disse o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha.
Para a presidente da companhia aérea Latam Brasil, Claudia Sender, o que mudou nesses últimos dois meses é que o governo começou a construir “um caminho de confiança no setor privado”. “Para as empresas voltarem a investir no Brasil é preciso confiança. Hoje, o que existe é esperança”, diz a executiva. / COLABORARAM MARINA GAZZONI, JOSETTE GOULART, FERNANDO SCHELLER, CLEIDE SILVA, ADRIANA FERNANDES, TÂNIA MONTEIRO, VERA ROSA e LU AIKO OTTA
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