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Doutor em Economia

Caso da ‘farinha de grilo’ faz pensar se é possível combater desinformação sobre políticas públicas

Mesmo casos mais prejudiciais de fake news não são simples de regulamentar, como aqueles que podem gerar comportamentos danosos para a sociedade

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Por Pedro Fernando Nery

Os painéis da morte serão formados por burocratas do Estado. Eles decidirão se os seus parentes merecem viver. Fazem parte da proposta de Barack Obama para a reforma do sistema de saúde e, evidentemente, eram uma fake news. Talvez o primeiro caso de impacto de “desinformação sobre políticas públicas” via redes sociais – prática que o governo brasileiro quer formalmente combater.

Na semana passada, começou a venda da “farinha de grilo” na União Europeia. Pó com grande quantidade de proteína e baixo impacto ambiental, passou a ser comercializado por apenas uma empresa, talvez visando um nicho de consumidores que tope experimentar a alternativa mais ecológica para substituir proteína animal.

Jorge Messias, ministro-chefe da AGU; órgão estuda criação da Procuradoria de Defesa da Democracia. Foto: Daniel Estevao/AGU 

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Na Itália, porém, virou um tema polêmico. Desde a autorização dada pela UE para a novidade, ela foi instrumentalizada pela extrema direita, gerando até xenofobia. É a destruição das tradições alimentares, uma imposição de cultura de países asiáticos. A gigante e centenária Barilla teve de negar: não, não passará a usar insetos na fabricação de suas massas.

A farinha de grilo é caso recentíssimo de “desinformação sobre políticas públicas”, pitoresco e quase inofensivo, mas que faz pensar se a prática tem mesmo como ser combatida. Afinal, qual grupo político aceita renunciar à possibilidade de causar engajamento explorando os medos de sua base eleitoral?

Nosso governo criou uma procuradoria, mas há muitas dúvidas. A oposição pode acionar a procuradoria contra o próprio governo? Governos estaduais de direita poderão criar suas procuradorias contra oposições de esquerda?

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Discursos falaciosos, mas úteis para narrativas da ex-oposição, acabaram carregados para dentro do novo governo federal. Não faltaram fake news sobre políticas públicas logo na primeira semana do governo: o ministro da Previdência errou factualmente sobre o seu déficit, o do Trabalho errou sobre o FGTS na reforma trabalhista. Em ambos, as falsidades eram grosseiras.

Mesmo casos mais prejudiciais de fake news não são simples de regulamentar, como aqueles que podem gerar comportamentos danosos para a sociedade (recusa de vacinação, corrida bancária). E se fosse proibido desinformação quando pode gerar sofrimento e angústia em grupos vulneráveis? Seria o caso das fake news sobre confisco na aposentadoria de idosos, usado na campanha de 2022, e sobre fim do Bolsa Família dos miseráveis, usado na campanha anterior. Estas não vieram da direita.

A “farinha de grilo” é tentadora demais. Diria até irresistível.

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