Nos anos 90, o rapper Snoop Dogg dizia que a maconha era “crônica” (gíria que passou a ser empregada para designar variedades de alta qualidade da erva). A droga era ilícita e “muito massa”. Hoje Dogg investe no segmento de produção e comercialização de cannabis e a droga começa a ser tratada como um bem de consumo. Em 8 de novembro, os eleitores de quatro Estados americanos, incluindo a Califórnia, aprovaram o uso recreativo da maconha. Em quatro outros Estados, a legislação que regula a utilização da erva para fins medicinais foi flexibilizada. Em vista disso, cerca de três quintos da população americana agora vive em Estados que permitem alguma forma de consumo de cannabis.
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Para os empresários do setor, descortina-se um auspicioso horizonte de normalidade. Na semana passada, suas lideranças se reuniram em Las Vegas para discutir os rumos que pode tomar a expansão de um mercado já parcialmente estabelecido e de tamanho nada desprezível. Atualmente, mais de 32 milhões de americanos fazem uso de maconha. Conforme a normalização avançar, novos consumidores serão atraídos. “Não é sempre que você tem um setor com crescimento garantido”, diz Brendan Kennedy, do fundo de private equity Privateer Holdings, focado em empreendimentos voltados para a produção e comercialização de cannabis. Em 2015, as vendas legais do produto somaram US$ 6 bilhões, informa a empresa de investimentos e pesquisa de mercado Arcview Group, que projeta um faturamento três vezes maior para o setor até 2020.
Não se deve esquecer, porém, que, em nível nacional, a maconha continua a ser ilegal nos EUA. As autoridades federais têm, de modo geral, respeitado as regras estabelecidas pelos Estados, mas é possível que o governo de Donald Trump adote um comportamento mais agressivo. Mesmo que isso não aconteça, o fato de que a legislação federal proíba o consumo, a posse e a comercialização da erva impõe restrições aos negócios. Poucos bancos concedem empréstimos a empresas que lidam diretamente com a planta. Não é possível manter operações interestaduais nem deduzir despesas ordinárias dos impostos, o que comprime as margens de lucro.
Apesar disso, novas startups brotam diariamente. Muitas delas nem chegam a lidar diretamente com a erva, o que lhes permite aproveitar a expansão do setor sem ter de respeitar suas normas mais rígidas. A californiana Kush Bottles, por exemplo, vende embalagens adaptadas às exigências idiossincráticas que as autoridades estaduais estabeleceram para o segmento. Além disso, há companhias mais tradicionais também de olho nas boas perspectivas da cannabis. A fabricante de produtos para jardinagem Scotts Miracle-Gro, uma empresa de capital aberto, espera conquistar clientes entre os consumidores que plantam ou desejam plantar maconha em casa.
Outras empresas lidam diretamente com a planta, dedicando-se a seu cultivo, processamento ou distribuição. Esse segmento específico já passa por um processo de depuração. O avanço da legalização fez com que os preços da maconha caíssem, levando muitos pequenos empreendedores a desistirem do negócio. Companhias maiores, com estrutura administrativa mais sólida, tiveram mais sucesso. A LivWell, por exemplo, que se dedica ao cultivo e manipulação da erva, atualmente tem 14 pontos de venda no Colorado, Estado que legalizou o uso recreativo da cannabis em 2014. Antes de entrar no negócio, seus fundadores comandavam uma empresa que fornecia artigos para bebês para o Walmart.
As companhias do segmento de cannabis têm muito em comum com as fabricantes de bens de consumo tradicionais. Com o intuito de contornar as restrições ao comércio interestadual, por exemplo, as empresas financiadas pelo Privateer licenciam suas marcas e métodos de produção para companhias estabelecidas em outros Estados, seguindo estratégia muito semelhante à adotada pela Coca-Cola em diversos países do mundo. E, tal como grandes fabricantes de alimentos, que cresceram no século 20 processando ingredientes básicos para produzir guloseimas mais saborosas e lucrativas, muitas delas transformam a erva em biscoitos, balas, extratos e óleos. “Com os tomates não dá para lucrar muito”, observa Troy Dayton, da Arcview, “mas os molhos são promissores”. No Colorado, a participação de mercado da flor de cannabis, normalmente utilizada em baseados, que em 2014 era de 68%, caiu para 57% nos primeiros nove meses deste ano, segundo a BDS Analytics. Mas as versões processadas de cannabis estão em alta.
Uma coisa que muitos temem é que o segmento desperte o interesse da indústria tabagista. Convivendo há tempos com normas bastante restritivas, as fabricantes de cigarro não terão dificuldades para lidar com as complexidades da legislação criada para regular a produção e comercialização de cannabis, diz Vivien Azer, da empresa de serviços financeiros Cowen. As pesquisas realizadas com vapores inaláveis poderão ser adaptadas para a produção de “baseados eletrônicos”. Se a maconha for legalizada nacionalmente, as fabricantes de tabaco provavelmente irão às compras, adquirindo grande número de pequenas empresas que vêm se expandindo com rapidez no setor. Enquanto isso não acontece, o Colorado oferece pistas de como pode ser o futuro: o Estado tem hoje mais estabelecimentos que comercializam maconha do que cafeterias da rede Starbucks. © 2016 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM.