Síndica profissional há quatro anos, Luciana Damasceno, de 36 anos, teve sua primeira experiência na gestão do edifício como moradora. "Ninguém queria ser síndico e como eu trabalhava com contabilidade me escolheram para o cargo", diz.
Ela ficou dois anos gerenciando o condomínio em que morava, e nesse período participou de cursos para aprimorar seus conhecimentos. Começou a se interessar pelas atribuições, frequentou um programa de administração condominial, gostou e decidiu cuidar de outros empreendimentos. Hoje, como síndica profissional, tem sob sua responsabilidade três prédios, 360 unidades, e ainda concilia o cargo com sua atividade de contadora em uma empresa.
Luciana dá rosto ao levantamento do site SíndicoNet, que mostra o aumento da figura do síndico profissional no Brasil. Segundo os realizadores do estudo, o crescimento retrata a crescente falta de interesse dos moradores em assumir o cargo.
Avanço. A pesquisa, feita com 4.457 entrevistados, mostra que, em 2005, apenas 5% da gestão dos conjuntos residenciais era feita por síndicos profissionais. Em 2013, o porcentual foi a 19% e agora em 2015 subiu para 26%. "É uma tendência no mercado de condomínios", acredita o fundador do site, Julio Paim. O levantamento também apresentou as principais razões que levam as pessoas a investir na carreira de síndico: 7% optaram pela função depois de ficarem desempregadas, 68% pela oportunidade de ter renda extra e 25% estavam insatisfeitos com o emprego anterior.
"Cresce consideravelmente o número de síndicos profissionais. Temos um curso online de administração condominial, com 12 módulos de 1h30 de duração cada, que aborda questões administrativas e de legislação. Hoje, é preciso administrar um condomínio como se fosse uma empresa", diz Paim.
Para ele, a função de síndico está ficando cada vez mais complexa, impulsionada pelo crescimento dos condomínios-clube. Com maior número de moradores e o aumento da responsabilidades, muitos condôminos que gostariam ser síndicos, argumenta Paim, pensam duas vezes antes de aceitar e, quem aceita, busca cursos de aperfeiçoamento.
Especialização. De acordo com o fundador do SíndicoNet, o número de síndicos profissionais apresentou maior elevação a partir de 2014. Ele diz ainda que o curso, que é oferecido há três anos, teve alta de 100% de 2014 para 2015.
A remuneração também atrai muitas pessoas para a função. O levantamento apontou que 20% dos síndicos profissionais têm renda de até R$ 2.000; 30% recebem de R$ 2.000 a R$ 4.000; 29% tem remuneração de R$ 4.000 a R$ 6.000 e 21% têm salário acima de R$ 6.000.
O levantamento também mostrou que a função já é a principal ocupação para 39% dos síndicos profissionais; para 24% é mais uma fonte de renda, pois possuem um outro emprego; 16% são aposentados e 21% têm outras rendas. "Muitos ainda conciliam com outra função, mas quem quiser investir na carreira, precisa de dedicação", afirma.
A síndica profissional Luciana ainda continua trabalhando no setor de contabilidade de uma empresa no período da tarde e divide as manhãs visitando os condomínios.
Segundo Luciana, financeiramente também vale a pena ser síndica profissional e ela diz que pretende futuramente se dedicar somente a esta função. No entanto, afirma que é preciso estar sempre se atualizando: "O síndico precisa entender de obras, manutenção e leis."
Para ela, a mediação de conflitos é o mais difícil do cargo. "É preciso ter paciência e saber lidar com cada um dos moradores. Hoje, eu já consigo solucionar os problemas com mais facilidade", diz.
Cinco mandatos. Sem a denominação de profissional, mas com muito profissionalismo para cuidar do condomínio do qual é moradora há 32 anos, Rainilde Soares de Barros, de 60 anos, é síndica há 10 anos e está em seu quinto mandato. "Conhecer os moradores facilita a gestão. Em alguns casos, temos laços de amizade e liberdade para conversar", afirma.
Na sua avaliação, o que mais demanda tempo no dia a dia da gestão do edifício de 144 unidades, são as obras de manutenção, que precisam estar em dia. "Este trabalho é praticamente diário, não pode deixar acumular." Rainilde conta que nunca participou de cursos de gestão de condomínios.
Antes de assumir o posto foi subsíndica e levou sua experiência profissional, como estatística, para a função de síndica, além de ter a administradora dando apoio nas questões legais e de funcionários.
Rainilde conta que luta diariamente para ter um condomínio mais sustentável, com reciclagem de lixo, redução no consumo de água e energia, atenção aos inadimplentes e conciliar os conflitos diários.
De acordo com Rainilde, como consequência da crise econômica, o trabalho de gerenciamento do condomínio deve ser ainda mais cauteloso, pois é preciso ter cuidado com obras caras e grandes, que demandam mais tempo e dinheiro e também as de embelezamento, que podem esperar.
"Adoro fazer esse trabalho. Estou feliz no cargo e enquanto os condôminos estiverem satisfeitos e eu tiver condições de gerenciar eu continuarei. Faço o que gosto e tenho obtido resultados positivos."
'É importante ter tempo para se dedicar à função'
"Independentemente de ser profissional ou não, o síndico tem obrigações previstas no Código Civil e é o responsável pela administração do edifício", diz a professora de administração de condomínios da Escola Paulista de Direito (EPD), Rosely Schwartz.
Contudo, ela afirma que a busca por conhecimento é importante para ter mais segurança na gestão. "Recomendo que o síndico tenha uma administradora para compartilhar as atividades e trabalhar com a equipe: subsíndico, conselheiros e funcionários do prédio", diz.
Rosely lembra que o papel conciliador fará parte do dia a dia do síndico, além de ter transparência nas ações. "É preciso ter ética e transparência na gestão condominial. Sempre atuar de acordo com a legislação, fazer prestação de contas e realizar assembleias para ter ações respaldadas."
De acordo com Rosely, além da parte técnica, o síndico precisa também destinar um tempo para conversar pessoalmente com o morador.
"Às vezes o síndico deve ser psicólogo, ouvir com respeito as reclamações, manter a postura e o equilíbrio, desenvolver a empatia e se colocar no lugar do outro", acrescenta.
Empenho. Para Rosely, "é importante ter tempo para se dedicar à função", e jamais misturar a relação de vizinho e amizade coma de síndico.
Há sete anos, Aline Mattar, de 36 anos, decidiu deixar o emprego em um banco para se dedicar à função de síndica profissional. "Eu fui síndica moradora, por dois anos, e o morador tem uma atuação diferente, o erro é admissível. Já o profissional não pode errar, principalmente na contratação de prestador, ele deve olhar de forma mais exigente e solucionar todos os conflitos", diz.
Formada em Direito, Aline acredita que o conhecimento jurídico é fundamental. Para ela, o síndico precisa ter preparo e deve "investir no condomínio, mas com equilíbrio financeiro", além de estar sempre atualizado para levar novas ideias para os condôminos, manter o caixa sempre balanceado e fazer previsão orçamentária.
"Eu escolhi como profissão. Saí do banco para ser síndica, não tinha como conciliar. Fui estudar para me dedicar e ser atuante no dia a dia."
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