Na situação difícil em que está metido, com queda alarmante de popularidade, perda de credibilidade de sua política econômica e relações emperradas com um Congresso amplamente dominado por partidos de centro-direita, o presidente Lula deixou passar o que talvez tenha sido sua última oportunidade de se deslocar para o centro do espectro político. Não teve melhor ideia do que se mover claramente para a esquerda.
A nomeação de ninguém menos que Gleisi Hoffmann para o cargo de secretária de Relações Institucionais da Presidência da República não deixa margem a dúvidas quanto a isso. A deputada jamais escondeu sua resistência à política fiscal do governo, que chegou a classificar de “austericídio”. Caso sua nomeação tenha o significado que se teme, o governo se tornará ainda mais inconsequente do que já vem sendo. E deixará como legado um aumento da dívida como proporção do PIB ainda mais colossal do que já está fadado a deixar.
Mas não é só o agravamento do quadro fiscal que está em jogo. Na entrevista coletiva que concedeu em 30 de janeiro, o presidente Lula deixou claro que o governo já não tinha mais qualquer intenção de anunciar novas medidas de ajuste fiscal. O plano de jogo era “empurrar com a barriga” a precariedade do quadro fiscal até as eleições de outubro de 2026.
Duas semanas depois, contudo, o governo deu-se conta da extensão do desabamento da sua popularidade, e decidiu que era preciso bem mais do que só “empurrar com a barriga”. O nome do jogo passou a ser tentar restaurar a qualquer custo a popularidade perdida, recorrendo a amplo leque de medidas capazes de estimular a demanda agregada e impedir a desaceleração da economia, na contramão dos esforços de contenção do nível de atividade que vêm sendo feitos pelo Banco Central.

Com isso, o mais provável é que a economia continue aprisionada numa armadilha de taxas reais de juros absurdamente altas até o fim do atual mandato presidencial. E que, nas eleições de outubro do ano que vem, a taxa de inflação ainda esteja muito mais elevada do que o governo gostaria. São riscos que, por ora, em meio à inconsequência de suas aflições eleitorais, o Planalto não reluta em bancar.
Mas, para o País, há um risco ainda mais grave a ter em conta. O risco de que, sob assédio desesperado do Planalto, o Banco Central afinal entregue os pontos em 2026, e, sem que a inflação tenha cedido, se disponha a apressar o relaxamento da política monetária. Uma reprise do que se viu no governo de Dilma Rousseff. Chegarão a tanto?