Vazante vermelha

Empresas chinesas listadas em bolsas americanas começam a voltar para casa

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Por Redação
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No ano passado, os mercados acionários dos Estados Unidos pareciam estar sendo alvo de uma invasão chinesa. Mais de uma dezena de empresas do país asiático lançaram ações em Nova York, captando US$ 30 bilhões no total. A companhia de comércio eletrônico Alibaba liderou a invasão, com uma das maiores ofertas públicas iniciais (IPOs, na sigla em inglês) de que se tem notícia nos Estados Unidos. Todavia, tão rápida como se formou, essa maré vermelha entrou em refluxo. Um número crescente de empresas chinesas quer trocar as bolsas americanas pelas de seu próprio país. Segundo a Bloomberg, ofertas totalizando mais de US$ 10 bilhões foram feitas a acionistas de uma dezena de companhias chinesas que pretendem fechar o capital nos Estados Unidos e tornar a abri-lo em solo chinês. Entre essas companhias estão a desenvolvedora de aplicativos para smartphones Sungy Mobile e a Shanda, que desenvolve games online. Em 17 de junho, o cortejo de retirantes era fechado pela fabricante de softwares Qihoo 360. Em breve o cortejo deve ser engordado pela companhia de aparelhos hospitalares Mindray e pela Wuxi Pharmatech, que atua com pesquisa e desenvolvimento no segmento farmacêutico. Uma explicação óbvia para o que está acontecendo é a alta alucinada que atualmente embala o mercado de ações chinês - em especial, as ações de internet. Até o ano passado, ter ações listadas em Nova York significava para as startups chinesas alcançar uma valorização mais alta do que a que conseguiriam nas então moribundas bolsas chinesas. Acostumados com a falta de lucros das estrelas nascentes do Vale do Silício, os investidores ocidentais se mostravam mais compreensivos. Além disso, ter ações listadas nos Estados Unidos funcionava como um selo de qualidade.

Impacto. O IPO da Aibaba foi um dos maiores da história dos EUA Foto: Reuters

Mas os americanos se decepcionaram com as ações chinesas. A desilusão é em parte justificada, tendo em vista uma série de escândalos, como o da Longtop Financial, uma fabricante de software, cujo diretor financeiro foi condenado na Justiça de Nova York pela "irresponsabilidade de suas declarações infundadas". No entanto, mesmo empresas chinesas sem qualquer envolvimento em escândalos entraram na mira dos investidores que apostam na baixa das ações. Além das valorizações mais altas, há outro motivo para as companhias chinesas estarem voltando para casa: o governo da China estendeu um tapete de boas-vindas para elas. Até pouco tempo atrás, a legislação chinesa exigia que as empresas gerassem lucros por alguns anos antes que pudessem ter suas ações listadas nas bolsas do país. Isso impossibilitava que as startups de internet abrissem seu capital. O processo de preparação de uma IPO envolvia a obtenção de inúmeras aprovações, ao passo que em outros países o procedimento se resumia a um simples registro. Com o objetivo de eliminar esses e outros obstáculos, as autoridades chinesas estão elaborando mudanças nas leis que regulam o mercado de valores mobiliários no país.Ilhas Cayman. Outra modificação regulatória que pode estar impulsionando o retorno das empresas chinesas envolve expedientes legais conhecidos como "entidades de participação variável" (VIEs, na sigla em inglês). A China proíbe que as empresas de internet do país tenham acionistas estrangeiros. No entanto, eles estão presentes em quase todas as grandes companhias do segmento. O mecanismo que viabiliza isso é o investimento por parte dos estrangeiros em VIEs sediadas em lugares como as Ilhas Cayman, mas às vezes listadas em bolsas americanas, às quais a empresa chinesa se compromete a pagar emolumentos e royalties. A China pretende mudar as leis que regulam o investimento estrangeiro, a fim de impedir que a maioria das companhias do país recorra a esse subterfúgio (mas as VIEs controladas por cidadãos chineses, como a Alibaba, não devam ser afetadas). A longo prazo, talvez faça sentido para companhias chinesas cuja atuação se concentre no mercado interno ter suas ações negociadas numa bolsa do país, onde os investidores conhecem o mercado melhor que os estrangeiros. Com as bolsas chinesas avançando de vento em popa, este parece ser um bom momento para empreender esse êxodo às avessas. Mas quando a bolha do mercado acionário chinês estourar - como, mais cedo ou mais tarde, vai acontecer - as ações das empresas que estão voltando vão sofrer, exatamente como aquelas que nunca deixaram o solo pátrio.

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