Em 1951, em visita à cidade de Gifu, no Japão, o artista plástico e paisagista norte-americano Isamu Noguchi se encantou com a qualidade da luz e a leveza das lanternas de papel que adornavam as casas locais. Equiparadas por ele à beleza das flores da cerejeira, a experiência deixou marcas profundas na sua imaginação. A ponto de inspirá-lo a empregar a milenar técnica do papel, estruturado por uma moldura de bambu, para criar uma coleção de luminárias, na forma e no conteúdo radicalmente nova.
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Modernas no desenho, mas tradicionais na execução. Ou, nas palavras de seu criador, poéticas, efêmeras, provisórias. Assim são as lanternas Akari – termo que se refere à luz enquanto iluminação, mas também implica na ausência de peso –, série ícone do design modernista, na qual Noguchi demonstrou, na prática, como as luminárias podiam ser concebidas não apenas para distribuir, filtrar ou transformar a luz. Mas também para evocar sensações de quietude, reverência e contemplação.
Fluidez
“Eu queria conceber uma coleção que emanasse o mesmo sentimento de admiração e misticismo das igrejas e seus interiores. Não é uma coleção religiosa, mas uma reflexão sobre o impacto que a arquitetura religiosa teve na psique humana, bem como na história da arte e da arquitetura”, resume o designer de iluminação britânico Lee Broom, que, para comemorar os 15 anos de sua marca, apresentou, no Salão de Milão, a mostra Inspiração Divina.

Lá, os visitantes eram convidados a percorrer por interiores inspirados em locais de culto, explorando a ideia de como a luz, e seus artefatos, estão frequentemente ligados a lugares sagrados. “Ao desenhar esta coleção, comecei olhando para a arquitetura brutalista, em meio à qual cresci. Depois, parti para uma jornada fascinante por catedrais, templos e igrejas, da antiguidade até os nossos dias”, relata.
Apresentado como um capítulo à parte dentro de sua coleção em Réquiem, Broom apresenta uma série etérea de pendentes, esculpidos pelo próprio designer em sua fábrica em Londres, na qual tecidos drapeados, enrolados a anéis, tubos ou esferas, parecem ser leves e fluidos, quando, na verdade, se tornaram sólidos após serem mergulhados em gesso. Inspiradas em detalhes de antigas estátuas de mármore e esculturas sepulcrais, cada peça se assemelha a um pedaço de pano frágil, que parece capturar uma fonte de luz flutuante.

Equilíbrio
Erik Bonissato é um designer brasileiro que se aproxima do desenho de luminárias de forma espontânea, sem maiores complicações. Também interessado em conferir uma nova dimensão ao artefato luminoso, em sua mais nova coleção, batizada de Esfera, ele explora o equilíbrio instável entre lâmpadas esféricas, de vidro, e esferas maciças de jequitibá, árvore nativa brasileira.
Apenas apoiadas sobre as superfícies, ou suspensas no ar, pretendem promover uma atmosfera de calma e leveza. “É uma coleção pensada para transmitir uma sensação de relaxamento aos mais diversos ambientes. Isso por meio de dois volumes puros e definidos. Por natureza absolutamente díspares, mas igualmente quentes.”
Nem utilitário, nem escultura
O mundo dos símbolos sempre fascinou a artista plástica Camila D’Anunziata. Por conta disso, por meio de suas esculturas em gesso, ela tem se dedicado, desde 2017, a conferir uma outra dimensão aos registros gráficos que elabora desde criança. “Misturo letras, símbolos rituais, caligrafias arcaicas. Mas, mesmo ainda no papel, imagino meus desenhos ganhando o espaço nos mais variados suportes: da moda à escultura”, conta a artista.
Sendo assim, ela não chegou a se surpreender com os objetos luminosos que, há alguns anos, começaram a brotar da bancada de seu ateliê. “Vejo essas peças como uma decorrência natural da minha pesquisa. Na prática, a luz foi incorporada às esculturas para atender à necessidade que eu sentia de destacar suas formas. Sempre de maneira intuitiva. Ou seja, não criei um suporte para conter uma lâmpada, com a intenção de produzir uma luminária. Apenas aconteceu.”
Apesar disso, Camila vê com bons olhos a função que suas esculturas passaram a desempenhar nos mais diversos ambientes. “Me agrada muito a ideia que esses objetos possam também iluminar”, sugere ela, que prefere situar sua atual produção em um território híbrido. “Nem utilitário, nem escultura. O importante é que as pessoas reconheçam as peças como algo especial dentro de suas casas. Afinal, elas existem, mesmo quando apagadas?”