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Self-service de humor

Opinião|O brinquedo raivoso

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"Sempre foi meu sobrinho favorito, nunca escondi de ninguém. A gente é assim mesmo, não adianta negar."

(Criada pelo autor no Dall-E)  

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"Ele passava por aqui, de vez em quando, sabe? Pedia um café, uma água, ficava lendo notícias no celular. Era de falar pouco. Dava bom dia, até logo, e pronto. Lembro de pouquíssimas conversas. Se teve, foi sobre meteorologia, essas coisas".

"Nunca vi o cara nervoso, irritado. Parecia sempre no eixo. É claro, a pessoa lá dentro dela mesma, a gente nunca sabe exatamente como é. Mas das vezes em que a gente esteve na companhia dele, sempre foi um lorde".

"Funcionário bom demais. Nunca faltou ao serviço. Uma vez cobriu a licença-maternidade da chefe e fez o trabalho dobrado, durante todo o tempo, sem nunca dizer um "a". Os colegas falavam que ele era muito divertido, vivia fazendo piadas com todo mundo do departamento."

"Sempre foi meu sobrinho favorito, nunca escondi de ninguém. A gente é assim mesmo, não adianta negar. Tem um que a gente se afeiçoa mais. E ele correspondia, entende? A meiguice e a atenção dele por mim, que ele chamava que Titita, era uma coisa linda".

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"Um irmão de ouro. Um pai maravilhoso. Um coração enorme. Vai entender como foi acontecer uma coisa dessas...Só Deus pode, um dia, deixar as coisas claras. E isso se for da vontade Dele".

"Um dia, nunca me esqueço, ele chegou aqui com aquele hamster de pelúcia. Começou a fazer shows de ventríloquo com o brinquedo. Virou a atração do bairro. Pouco depois, veio o sucesso nas redes sociais.  Mas ele sempre dizia que o hamster era o verdadeiro gênio."

"Não sei exatamente, mas acredito que, quando ele bateu 500 mil seguidores, foi que veio tudo abaixo".

"Sabe, fico até emocionado ao tocar no assunto. Me perdoa as lágrimas. É que...um minuto só... Pronto, já estou bem. É que, uma noite, ele postou um vídeo revelando que o hamster era, na real, o ventríloquo dele".

"O que aconteceu? Bom, o hamster de pelúcia parecia mesmo ter ascendência sobre ele. Foi uma coisa terrível. E não só pelo lado psiquiátrico, compreende? O bicho praticou coisas absurdas, especialmente prejudicando amigos e pessoas da família."

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"Era um quarta-feira de tarde. Pulou uma mensagem no WhatsApp. Com a fotinha do meu sobrinho, tudo certo. Dizia assim: 'Titita, estou precisando de cinco mil reais, é para pagar uma prestação do financiamento, mas reponho à senhora amanhã à noite. Tem como me fazer um PIX?" E enviou o link. Mandei o dinheiro na hora, é claro. Depois vim a saber: foi o hamster que armou tudo."

"É, verdade, o meu marido entrou no grupo de família implorando dinheiro aos parentes. Pra acertar uma dívida grande lá, não me lembro do quê. Mandaram os PIX imediatamente. Caiu tudo na conta do ventríloquo dele".

"Eu até falei para a minha senhora: "Não está estranha essa história do teu afilhado pedir PIX, não? Ele nunca pede nada. Ela respondeu que devia ser para financiar alguma coisa do bicho de pelúcia dele, que estavam fazendo um sucesso colossal na internet. Nunca entendi de seguidor, de influenciador, muito menos de rato falando em televisão, sabe? Então, larguei mão. Quando fomos ver, a transferência tinha ido para outras mãos. Ou outras patas, sei lá".

"Estamos rezando muito. Ele acabou preso. Agora, o paradeiro do hamster, ninguém sabe".

 

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Opinião por Carlos Castelo

Carlos Castelo. Cronista, compositor e frasista. É ainda sócio fundador do grupo de humor Língua de Trapo.

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