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Psiquiatria e sociedade

Opinião | Porque se agridem os gays

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Foto do author Daniel Martins de Barros

[tweetmeme] Está em pauta nos últimos dias o episódio de agressão contra homossexuais na Avenida Paulista, em São Paulo. Muitas respostas surgem para a pergunta de por quê isso acontece, e eu também tenho a uma teoria: quem agride homossexual faz isso porque não tolera sua própria homossexualidade. Pode ser polêmico, mas tenho três testemunhas de peso a favor da minha tese.

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Em primeiro o velho Freud, com seu conceito de formação reativa, que é um mecanismo de defesa do ego no qual, diante de desejos inconscientes e tendências inaceitáveis para o indivíduo, este adota o comportamento exatamente oposto. Assim, alguém com desejos homossexuais latentes reagiria com raiva quando confrontado com tal impulsos.

Pode até parecer teórico demais ou pouco científico, mas foi uma ideia posta à prova num estudo já clássico: em 1996, três psicólogos convidaram 64 voluntários, todos homens heterossexuais, para uma pesquisa, classificando-os em muito ou pouco homofóbicos de acordo com um questionário preenchido pelos sujeitos. Depois disso, foram assistir a três vídeos eróticos de cerca de 4 minutos casa, um mostrando um casal heterossexual, outro com duas mulheres e um com dois homens. Um sensor media o aumento da circunferência peniana, que reflete o grau de excitação sexual, durante os filmes. O resultado é que não houve diferença entre o grau de excitação entre os homofóbicos e não-homofóbicos diante do filme com duas mulheres nem com um casal. Mas houve uma diferença significativa no grau de excitação entre os dois grupos diante do filme com os homens: adivinhem se não foi o grupo mais homofóbico aquele que ficou mais excitado diante do filme gay? E não foi só isso. Os participantes deviam assinalar o quão excitados estavam em cada um dos filmes, e normalmente não houve discrepância entre o que os sujeitos diziam e o quanto era medido pelo sensor, a não ser nesse caso, quando os homofóbicos diziam-se menos estimulados do que o verificado em seus corpos - olha aí de novo o aspecto inconsciente apontado por Freud.

Minha última testemunha é o brilhante filme Beleza Americana, Oscar de melhor filme, melhor diretor (Sam Mendes), melhor ator (Kevin Spacey) e melhor roteiro no ano 2000. Um personagem homofóbico e neo-nazista acha que o vizinho (Spacey) é gay. O seu incômodo cresce ao longo do filme, até que, numa das melhores cenas, ele vai até o vizinho, beija sua boca e em seguida o mata com um tiro na cabeça. O desejo inconsciente rompe a barreira da repressão e leva ao beijo, mas é uma situação de tal forma intolerável que o faz exterminar a fonte desse desejo.

Me parece, então, que psicanálise, fisiologia e arte estão dizendo a mesma coisa: homofobia tem uma forte relação com homossexualismo. Inconsciente, no entanto, e por isso mesmo, muito perigoso.

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Opinião por Daniel Martins de Barros

Professor colaborador do Dep. de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP. Autor do livro 'Rir é Preciso'

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