MAITÊ PROENÇA
Maitê Proença mergulhou nas redes sociais durante a pandemia. Ela produziu muito conteúdo, como vídeos e bate-papos, e passou a
interagir mais com seus milhares de fãs e seguidores. “Isso se tornou um alento, uma forma de contato com aquele círculo de pessoas”, diz a atriz e escritora.
Ela também aproveitou o período de confinamento para escrever e encenar uma peça online, chamada O Pior de Mim, na qual revisita a história de sua vida desde a infância até os dias de hoje. Com direção de Rodrigo Portella, o espetáculo estreou em setembro e está em cartaz atualmente, sempre às quintas, pelo Sympla.
“O Pior de Mim foi transmitido primeiro a partir de um teatro vazio, muito estranho... e agora a partir de minha casa, bem mais íntimo. É, no entanto, complicado em termos técnicos. Exige uma grande parafernália e cuidados extremos com o distanciamento social e limpeza depois que a equipe vai embora.”
Sobre a rotina, a artista conta que passou a fazer mais exercícios físicos e ioga, leu o que a fazia bem e deixou de assistir a noticiários quando percebia que aquilo a afligia mais do que alimentava. “No Brasil, a gente vive aos sobressaltos. Não chegamos ainda ao topo da barbárie”, avalia. “A cada dia, nosso presidente
e sua corja de brutos nos atentam com disparates outrora inimagináveis, com a falta de compaixão pelos que sofrem, com a falta de vacina que não foi comprada por ser comunista, com o discurso da estupidez elevado a seu grau supremo.”
A técnica para acalmar o coração e a alma? “Respiro, respiro, respiro. Me coloco em posições físicas que exprimem alegria, porque aprendi que isso traz o bem-estar de volta. É científico, e a prática comprova a eficácia da coisa, funciona sempre.”
Com a pandemia ainda em alta no Brasil, sem a perspectiva de controle a médio prazo, a previsão é de que as pessoas ainda precisem ficar confinadas por um tempo. Mas Maitê percebeu que passa bem sozinha. “Sofro um pouco por não ter tanta vida ao ar livre, e vez ou outra me sinto só. Mas na maior parte do tempo sei como preencher as horas de forma bem satisfatória. Aprendi que dá! A gente é mesmo muito adaptável, não é?”
IVAM CABRAL
“Eu nunca perdi tantos amigos”, diz Ivam Cabral, ator, autor e cofundador do grupo de teatro Os Satyros. “E mesmo que fossem de outras causas, eu tenho certeza, absoluta mesmo, que foram de covid. O isolamento tirou a energia das pessoas. Trancafiadas e sem condições de sair de casa, sucumbiram ao medo e à falta de perspectivas. E eu, claro, fui morrendo um pouquinho também.”
Mesmo desolado com as mortes e com a paralisação das atividades culturais pelo País, o artista buscou novas formas de produção e migrou rapidamente para o digital. Já no primeiro fim de semana de isolamento, em 20 de março de 2020, estreou o espetáculo Todos os Sonhos do Mundo em formato online, no YouTube e Instagram.
“Detalhe bem importante: ninguém falava de lives, esse formato foi virar queridinho dos artistas depois. Costumo dizer que não existe outra Teresa Cristina no mundo. É um fenômeno brasileiro. Não existe outro Satyros também. O que estamos fazendo na internet com nossas peças não acontece em outro lugar do mundo.” A produção ficou o ano inteiro em cartaz e contou com mais de 25 mil espectadores. Depois, a companhia ainda lançou A Arte de Encarar o Medo, que ganhou duas montagens fora do Brasil e vai se tornar um longa-metragem ainda neste ano, filmado em mais de dez países, tudo pela internet.
Em relação ao confinamento, Ivam resolveu passar os dias em sua casa em Parelheiros, na zona sul de São Paulo, em meio à natureza. Lá, onde antes costumava ficar apenas em fins de semana e feriados, ele encontrou um lugar ideal para este momento de angústia — e também para seus dois cachorros, Chico e Cacilda, que andavam meio tristinhos na capital. E conseguiu internet de alta qualidade, o que possibilitou suas transmissões online.
“Estas condições fizeram com que eu ganhasse uma qualidade de vida que jamais tinha vivido. E acabei, também, ganhando muito mais tempo para criar, projetar, me reinventar. Não fosse essa casinha no meio do mato, jamais teria vivido as experiências que vivi.” E o que faria se a pandemia acabasse hoje? “Se pudesse, hoje, eu passaria a viver nos abraços dos meus amigos, da minha família. Mas a primeira coisa que faria mesmo seria viajar pro interior do Paraná, na minha cidade natal, Ribeirão Claro, e ficar lá por vários dias e abraçar a cidade inteirinha.”
RODRIGO OLIVEIRA
O jornalista Rodrigo Oliveira, 44 anos, já morava em Portugal havia um ano e meio quando a pandemia chegou, e o primeiro lockdown no país foi o momento mais assustador para ele. “Foi um isolamento bastante severo, e eu realmente não deixava minha casa, a não ser para comprar comida.” Ele conta que, apesar de dividir o apartamento com o marido e dois colegas de mestrado, havia uma sensação estranha de solidão. “Um medo daquele estado de emergência não passar logo e a vida ficar pendente.”
Rodrigo aproveitou o confinamento para produzir e adiantar a pesquisa para seu mestrado na Universidade de Lisboa, que terminaria em setembro de 2020. Com o fechamento de bibliotecas, salas de estudo e laboratórios, entretanto, os cronogramas foram alterados, e a defesa de dissertação foi adiada para março deste ano. “Ou seja, só agora vou encerrar um capítulo da minha vida que era pra ter terminado há um semestre.” Além dos estudos, voltou a colaborar para a emissora de rádio da Universidade Federal de Goiás (UFG), onde trabalhava. Ele ficou responsável por enviar diariamente um boletim informativo sobre a pandemia, com novidades sobre a situação em Portugal e outros países europeus. “Nesses dois pilares, eu me agarrei para me manter firme naquele momento estranho do começo de 2020.”
Durante este ano de pandemia, Rodrigo, que chegou a perder um amigo “muito jovem e supersaudável” por causa do coronavírus, precisou adiar uma viagem ao Brasil marcada para outubro de 2020, para rever os parentes — e ainda não há previsão de reagendamento.
No entanto, nesse período, ele precisou viajar para a Itália e para os Estados Unidos para resolver questões familiares. “Claro que havia o receio de um contágio, mesmo com todos os protocolos de segurança das companhias aéreas”, diz, em relação aos deslocamentos. E aponta uma situação recorrente durante as viagens. “O olhar apreensivo das pessoas quando alguém tossia ou espirrava por perto. Não tem máscara no mundo que possa esconder esse tipo de preocupação.”
FÁTIMA GEROLIN
O ano de 2021 começou com duas mortes por coronavírus na família de Fátima Gerolin, 60 anos, que mora em Portugal há 11 anos. Perdeu uma prima logo no primeiro dia do ano, e, 18 dias depois, viu outro primo morrer, ambos no Brasil.
O aperto no coração fica ainda maior pela saudade e preocupação com as duas filhas. A mais velha é Lilian, que vive no Texas, Estados Unidos, e recentemente conseguiu passar um tempo com os pais em Portugal.
A outra filha, Priscila, trabalha em São Paulo na linha de frente do combate ao coronavírus. “Ela é fisioterapeuta na ala de pacientes com covid-19, monitora os doentes entubados e com complicações pulmonares”, explica Fátima, que não a vê desde maio de 2019. “Em relação ao trabalho dela, a melhor palavra para definir o que sinto é medo. Ela tem estado muito cansada fisicamente e emocionalmente, faltam profissionais e recursos.”
Por ter filhas e netos vivendo em países diferentes, ela fica o tempo todo checando os dados da pandemia não apenas em Portugal, mas no Brasil e nos Estados Unidos. “Fico acompanhando os
números de infectados, óbitos e vacinação, isso gera uma certa neurose. Na realidade, uma grande neurose. Estou fazendo tratamento psiquiátrico com ansiolíticos e soníferos.”
Ela observa que Portugal, de forma geral, lidou melhor com a pandemia até agora, em relação aos outros dois países. “No Texas, não é exigido o uso de máscara, e eu temo pelo bem-estar da minha família lá. E no Brasil, por pior que esteja a situação, a maioria da população continua sem consciência social e respeito, querem praia, festas e shopping, enquanto as UTIs e os hospitais seguem colapsados.”
Em relação ao seu dia a dia, a pior fase da pandemia, segundo ela, foi no último lockdown em Portugal, realizado em janeiro deste ano para conter um dos piores surtos de covid-19 da Europa. “Até então, eu estava encarando com
naturalidade, tomava as medidas protetivas e estava tranquila. Porém, quando imaginávamos que a vida voltaria ao normal, o número de mortos aumentou bruscamente, e a vida parou.” O confinamento deu resultado, e a flexibilização das medidas restritivas já começou a acontecer em todo o país.
ANA PAULA SOARES
Há 5 anos sem voltar ao Brasil, Ana Paula Soares passou a pandemia toda em sua casa na Itália, em Arconate, a 35 km de Milão, onde mora faz dez anos. A ideia era ter ido a Fortaleza no ano passado para rever seus parentes depois de tanto tempo distante, mas a pandemia mudou os planos. “Foi muito difícil não poder ver minha família, e o medo de algum deles pegar o vírus tomou conta de mim.”
Além de precisar lidar com a distância, Ana, que tem 36 anos e mora com o marido, o filho de 8 anos e os sogros, acabou perdendo o emprego que mantinha em uma fábrica de sapatos — a empresa não resistiu e fechou as portas definitivamente em 2021. “A minha sorte é que o meu cônjuge é funcionário público e tem um salário razoável.”
Outro ponto que causou preocupação foi o fechamento das escolas. Ela explica que as atividades presenciais do filho foram suspensas em março de 2020, retornaram em setembro e acabaram de ser paralisadas novamente, por causa do retorno do lockdown na Itália.
“No início, foi tranquilo, mas com o passar do tempo todos os pais notaram mudança de comportamento, e alguns retrocederam no aprendizado. Meu filho é bem tranquilo, mas pedia continuamente para fazer chamada de vídeo com os amigos da escola.” As aulas continuam de forma virtual.
O único momento de “relaxamento”, digamos assim, aconteceu em agosto do ano passado, quando houve um abrandamento nas restrições de confinamento na Europa. Ana, o marido e o filho aproveitaram e passaram uma semana na Holanda, na casa de amigos. “Quando a gente chegou lá, era vida normal, as pessoas não usavam máscara, tinham poucas restrições, e a gente teve uma sensação de liberdade.” Mas ela conta que cinco dias depois da viagem o número de casos “explodiu” por lá. E a covid voltou a se alastrar por vários países.
Apesar de tantos meses de desespero e de imagens perturbadoras exibidas em televisões de todo o mundo, uma delas permanece de forma marcante na lembrança de Ana, lá do início de tudo, de março de 2020. “O dia mais triste foi quando os caminhões do Exército deixavam a cidade de Bérgamo cheios de corpos, por causa do colapso dos cemitérios da região.”
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