Usain Bolt parecia ter sido empurrado por uma máquina até a linha de chegada. A assustadora vantagem sobre os concorrentes não deixou dúvidas aos cerca de 90 mil entusiasmados torcedores presentes no Ninho de Pássaros: o atletismo conheceu, ontem, um novo fenômeno. O jamaicano confirmou a condição de homem mais rápido do mundo, quebrou o recorde que já era seu - 9s72, estabelecido em maio em Nova York - e levou o ouro nos 100 metros rasos, com o tempo de 9s69. Com facilidade e significativa vantagem sobre os 7 rivais. O público ficou em pé para ver a disputa mais nobre dos Jogos Olímpicos e deixou o estádio espantado e, ao mesmo tempo, feliz. Quem esteve ontem no estádio poderá falar que viu de perto um dos maiores nomes do esporte em todos os tempos. "Foi impossível acompanhá-lo, ele esteve intocável", declarou seu compatriota Asafa Powell, decepcionado com o 5.º lugar na prova em que era um dos favoritos. "É espetacular. É o maior velocista de todos os tempos." O norte-americano Tyson Gay, outro forte candidato ao pódio, fez ainda pior e nem chegou à final. Caiu na semifinal, realizada ontem mesmo. A prata foi para Richard Thompson, 23 anos, de Trinidad e Tobago, e o bronze ficou com Walter Dix, 22, dos Estados Unidos, dois talentosos e promissores atletas, mas até então sem grandes resultados internacionais. EXPECTATIVA Nas tribunas do Ninho de Pássaros, treinadores e atletas se diziam certos de que Bolt ainda tirou um pouco o pé. Caso contrário, teria completado os 100 metros em menos tempo. As câmeras de televisão comprovam os comentários. O jamaicano relaxou nos metros finais, tão expressiva era sua vantagem. "Vi que não havia ninguém perto de mim e resolvi comemorar (antes mesmo do fim da prova)", confirmou Bolt, com desdém. Sem o menor traço de cansaço, o campeão seguiu correndo pela pista depois de ter cruzado a linha de chegada. Deu a volta olímpica e parou em todos os setores do estádio. Pegou a bandeira de seu país, enrolou-se nela, tirou o tênis (correu com o cadarço do pé esquerdo desamarrado) e posou para fotos ao lado do cronômetro que exibia seus 9s69. "Vim para ser campeão, não estava preocupado com recorde", afirmou. Bolt foi soberano desde a primeira eliminatória e não sentiu a pressão por ter chegado à China como recordista mundial. Para não dizer que foi perfeito, vacilou na largada e reconheceu o erro. "Preciso melhorar o arranque." Mesmo com 21 anos - o mais jovem entre os finalistas -, pareceu um veterano. Antes da prova, brincou com Powell e Michael Frater (6.º colocado), seus amigos da Jamaica, e se aqueceu como se fosse apostar corrida com algum vizinho de rua em Trelawny, cidade em que nasceu e onde vive sua família. Não deu a menor importância para o público, para o barulho dos entusiasmados chineses, para os cerca de dois mil jornalistas e para as câmeras. Sentiu-se em casa. A conquista dos 100 metros é provavelmente a mais desejada dos Jogos Olímpicos. Mas Usain Bolt nem teve tempo de comemorar. Saiu do Ninho de Pássaros, fez um lanche e foi para a cama. O jamaicano quer agora seu segundo ouro, o dos 200 metros, a partir das 23 horas de hoje (de Brasília), quando começam as eliminatórias. E, depois, na quinta-feira, dia de seu aniversário, ainda brigará pelo revezamento 4 x 100 m. Ao chegar à China, disse que só ficaria 100% feliz, se vencesse os 100 e 200 metros. Sua especialidade sempre foi a disputa dos 200 metros. Mas , depois do passeio de ontem, os adversários já sabem que Bolt é novamente o favorito.
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