Camisa de Pelé de 1968 vai a leilão para custear tratamento de Alzheimer: saiba valor do lance

Uniforme do Santos foi dado pelo Rei do Futebol ao zagueiro Lincon, do Bangu, após partida no Pacaembu; relíquia ficou guardada por 55 anos.

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Por Vagner Frederico
Atualização:

Uma camisa utilizada por Pelé há 55 anos devolveu a um ex-zagueiro do memorável time do Bangu do fim dos anos 60 a esperança de proporcionar mais conforto à sua mulher, Adir Alves, de 83 anos, portadora de Alzheimer, uma doença neurodegenerativa. Lincoln Dias Alves, o Lincão, como era conhecido nos gramados por causa dos seus 2,04m de altura, ganhou a camisa 10 do Santos das mãos de Pelé após um jogo em que os dois se enfrentaram no dia 25 de setembro de 1968.

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Naquela típica noite chuvosa paulistana, a partida entre Santos e Bangu, disputada no Pacaembu, pelo Troféu Roberto Gomes Pedrosa, terminou empatada por 1 a 1. Lincão ganhou o prêmio de melhor jogador em campo por ter “parado” Pelé. “Eu estava iluminado naquele dia. Ganhei 80% das bolas que disputei com ele, sem violência, claro. Ao final do jogo, ele veio me cumprimentar e disse: ‘Parabéns, continue assim’”, conta, orgulhoso. “Esse era o Rei.”

Segundo o ex-zagueiro do Bangu, sua atuação naquele que considera o jogo mais importante de sua carreira, por ter cumprido a missão de marcar Pelé, foi influenciada pelo lendário presidente do clube carioca à época, o bicheiro Castor de Andrade, cuja história foi contada em uma produção do GloboPlay: Doutor Castor”, de 2021.

“No dia do jogo, antes de sairmos do hotel para o estádio, o Castor foi até o meu quarto e me disse: ‘Está fazendo xixi com as pernas baixas, né?’”, recordou. “Aí, ele me mandou sentar e falou que eu tinha de encarar aquela partida como a chance da minha vida. Se eu fosse bem, iriam me elogiar para sempre. Ele estava certo.”

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A camisa 10 santista utilizada por Pelé naquela partida, toda branca e de mangas longas, já havia sido prometida a Lincão no intervalo. “Quando terminou o primeiro tempo, eu corri até o Pelé e pedi a camisa dele para presentear o meu pai (Oswaldo Alves, que também fora jogador profissional no futebol mineiro). Ele tinha loucura pelo Pelé”, recorda. “Fico emocionado só de lembrar da cara de felicidade que o meu pai fez quando dei a camisa para ele alguns dias depois.”

Camisa utilizada por Pelé em 1968 irá a leilão para custear tratamento. Foto: Arquivo Pessoal

O “tesouro”, como Lincão se refere à camisa, ficou guardado na casa dos seus pais até o início deste ano, em Barão de Cocais, município mineiro a 98 quilômetros de Belo Horizonte. “Toda nossa família, de dez irmãos, sendo cinco mulheres e cinco homens, foi criada nesta casa em Barão de Cocais. E todos os homens foram jogadores de futebol como o meu pai”, disse o ex-zagueiro, que encerrou sua carreira com a camisa do Atlético-MG, no começo dos anos 70. Aposentado, ele vive na capital mineira.

Mensagem divina

A ideia de fazer dinheiro com a camisa doada por Pelé para o tratamento da mulher nasceu há poucos meses e teve a “participação” do seu Oswaldo, que morreu 22 anos atrás. “Há uns três meses, sonhei com alguém me cutucando na cama, era o meu pai. Ele me disse: ‘Por que você não faz uso daquela camisa? Agora ela pode ser muito mais útil para você’”, contou. “Foi um sonho muito real e impressionante. Parecia mesmo que meu pai estava vivo ao meu lado.”

Dias depois do sonho, Lincão pediu para que familiares de Barão de Cocais procurassem a camisa na casa dos pais, onde ainda vive sua mãe, Nilza Dias Alves, que completou 100 anos no último dia 19 de março. “Fiquei preocupado que não achassem a camisa, mas a encontraram embrulhada num quarto onde ficam as coisas mais antigas do pai”, contou o ex-jogador, que desde então confia a guarda da relíquia ao filho único Lincoln Júnior. “É o nosso tesouro”. A ideia do leilão ganhou força.

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Lincão era zagueiro do Bangu na década de 1960 quando enfrentou Pelé. Foto: Lincon Jr.

Profissional dos tempos em que até os grandes jogadores raramente ficavam milionários no futebol, Lincoln admite que vive com dificuldades financeiras desde o avanço da doença da mulher, que há um ano está acamada e passou a ser totalmente dependente dele e do filho. Mesmo assim, nunca cogitou interná-la numa clínica especializada. “Eu sou o próprio cuidador da minha mulher. Jamais a colocaria num asilo ou algo parecido. Sei que o meu amor, e também do nosso filho, é o que ainda a mantém viva.”

Filho de Pelé

Questionado pela reportagem do Estadão sobre o conforto que a camisa de Pelé pode proporcionar à família de Lincoln, Edinho, um dos sete filhos do Rei, demonstrou comoção. “É uma situação emocionante. Meu pai, com aquele gesto lá atrás (de doar a camisa), pode ajudar a família dele de alguma forma hoje. É uma energia positiva que gira em torno do meu pai. Eu fico muito feliz. Que isso possa amenizar a dor da família”, afirmou.

Camisa utilizada por Pelé em 1968 irá a leilão para custear tratamento. Foto: Arquivo Pessoal

Ao comentar os cinco meses da morte de Pelé, Edinho não escondeu também seus sentimentos. “É um processo diário de evolução. Todo mundo tem sua forma de lidar com a perda e eu e minha família temos o desafio peculiar de ter de dividir isso com o mundo. Em alguns momentos, isso nos traz conforto, em outros, é difícil porque somos humanos também. Mas, acima de tudo, temos muita gratidão e a saudade é eterna, assim como é o legado dele”, disse.

Edinho comentou que a morte do pai aproximou a família. “A gente se apoia um no outro, os netos e todos os herdeiros. É um processo natural da vida e uma dinâmica diferente. Aonde a gente vai, ele é lembrado com carinho e amor. Com isso, a cada dia, nos permitimos curtir e celebrar. Isso nos distancia um pouquinho mais da dor e da tristeza.”

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Lance mínimo é de R$ 90 mil

Inicialmente, Lincão pensou em vender a camisa diretamente para um colecionador. Mas aí seu filho sugeriu que o uniforme fosse leiloado. Foi então que a família contratou o Leilão do Esporte, especializado em artigos esportivos e que promove leilões online. Há ainda uma parceria com a plataforma digital Mercado Bom Valor. Os lances já podem ser feitos pela internet a partir de R$ 90 mil. O leilão vai até as 15 horas do dia 14 de junho.