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City x Fluminense: Guardiola e Diniz fazem confronto de ideias sobre o futebol moderno

Times se enfrentam nesta sexta-feira na decisão do Mundial de Clubes na Arábia Saudita; ingleses chegam à final com o quarto pior aproveitamento de um europeu antes de partida contra os brasileiros

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Foto do author Murillo César Alves
Foto do author Rodrigo Sampaio

Fluminense e Manchester City se enfrentam nesta sexta-feira, às 15h (horário de Brasília), pela final do Mundial de Clubes da Fifa. Independentemente das ausências dos astros Erling Haaland e Kevin De Bruyne pelo lado dos ingleses, cortados por causa de lesão, os protagonistas da decisão são os técnicos Fernando Diniz e Pep Guardiola. A partida opõe não somente os campeões da Libertadores e da Champions League, mas também dois dos principais expoentes de conceitos diferentes, tornando o duelo também um encontro de ideias do futebol moderno.

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Guardiola teve bons momentos na carreira como jogador, com comparticipação em Copa do Mundo, mas foi como treinador que revolucionou o futebol. O espanhol assumiu o Barcelona em 2008 e aprimorou um estilo de jogo que ao longo dos anos ganhou a alcunha de futebol posicional. Criado pelo técnico holandês Rinus Michels e desenvolvido por Johan Cruyff, o conceito tem como base criar zonas dentro do campo, com jogadores ocupando posições específicas para sempre haver opções de passe. Assim, o time ganha superioridade numérica no campo adversário e progride com a bola por meio de triangulações.

O modelo passou a ser estudado com maior afinco após o sucesso de Guardiola no comando do Barcelona. Entre 2008 e 2012, ele conquistou 14 títulos com os catalães (incluindo duas Champions) e foi o responsável por mudar a carreira de Lionel Messi, tirando o craque argentino da ponta-direita para transformá-lo em falso 9 — função na qual o centroavante recua ao meio-campo para atrair a defesa adversária e criar espaços. O atacante chegou a dizer que o técnico espanhol “fez mal” ao futebol mundial por fazer parecer simples a maneira de jogar do Barcelona.

Guardiola transformou Messi em um falso 9 durante seu período no Barcelona. Foto: Lee Smith/ Action Images via Reuters

Posicional e aposicional

O sucesso do jogo posicional, que garantiu os Mundiais de 2010 e 2014 para Espanha e Alemanha, respectivamente, fez o modelo a ser seguido à risca por boa parte dos treinadores mundo afora. Ao mesmo tempo, o desempenho tático dos jogadores passou a ser tão importante quanto, ou até mais, do que a parte técnica. O estilo aplicado por Guardiola em sua interpretação do jogo posicional se notabilizou pela ampla posse de bola e constante troca de passes, recebendo o apelido de tiki-taka. No livro Guardiola Confidencial, o espanhol afirma que ficar com a bola é uma maneira de diminuir as chances de ser atacado e, consequentemente, sofrer um gol. No City, ele continua com suas ideias, mas mais de acordo com os jogadores que tem em mãos.

Fernando Diniz se projetou no cenário nacional também valorizando a troca de passes e a ampla posse de bola, mas com um conceito oposto ao colega espanhol. Diferentemente do jogo de posição, o brasileiro é adepto de estilo mais funcional, com atletas migrando de posição e atuando de maneira livre, abrindo espaço para jogadas individuais e lances de improviso. Parece uma bagunça, mas não é. O Fluminense tem entre as suas características, por exemplo, o preenchimento de espaço com três jogadores ou mais, circulando menos a bola e, assim, indo na contramão do futebol posicional.

“Por conta de gostar de ter a bola, as pessoas me associam ao Guardiola. Mas para aí a comparação. A maneira de ele ter a bola é o oposto da minha. Nos times do Guardiola, com dois minutos você vê que os jogadores obedecem a um espaço. Quem está na direita fica na direita, quem está na esquerda fica na direita e a bola chega naqueles espaços. O jeito que eu vejo nesse momento é quase que ‘aposicional’. Os jogadores migram de posição. É um jogo mais livre, a gente se aproxima nos setores do campo e nesses setores há trocas de posição. Acho que isso tem a ver mais com a cultura do nosso futebol”, disse Diniz, em entrevista ao SporTV, no ano passado.

André foi eleito o melhor jogador em campo contra o Al Ahly. Foto: Amr Abdallah Dalsh/ Reuters

Em jogos do Fluminense, é comum ver o volante André ir até a defesa buscar a bola e ir também até o meio-campo driblando os atacantes adversários. Diniz também deu liberdade para o lateral-esquerdo Marcelo, conhecido pela grande qualidade técnica, aparecer armando o jogo com um meio-campista — às vezes até mesmo do lado direito. Apesar de o treinador incentivar os jogadores a serem mais instintivos e valorizar a plasticidade do jogo, é comum ver o técnico cobrar com veemência disciplina tática da equipe na parte defensiva.

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É comum ainda ver o time carioca atacando pelo mesmo lado, com dois pontas e quase cinco atletas naquele setor. Diniz não se acanha em mandar seus jogadores fazerem pressão num mesmo local do gramado. E depois, eles desaparecem daquele espaço.

COMO O FLUMINENSE PODE VENCER O CITY (E VICE-VERSA)?

Sem Haaland, De Bruyne e Doku, cortados do Mundial de Clubes por causa de lesões, o Manchester City chega para a decisão desfalcado. Não há um centroavante do calibre do norueguês no elenco. Desde agosto, quando o meia De Bruyne saiu lesionado de uma partida contra o Burnley, o City deixou de ter seu principal articulador de jogadas em campo. Os números recentes mostram como Pep Guardiola tem dificuldades para suprir a ausência de suas principais peças.

A ideia do treinador é ter a superioridade numérica nos três setores do campo. Se a defesa está postada com cinco homens, ataca com seis. Nos períodos de Barcelona, no auge de Messi, o camisa 10 atuava como um falso 9, deslocando-se do ataque para o meio para que o time espanhol tivesse o domínio no segundo setor do gramado. Haaland não fazia isso – e o catalão não cobrava que fizesse. Ao contrário, John Stones, zagueiro, saltava da última linha para a função de primeiro volante nos cenários de ataque, ao lado de Rodri. Uma função de líbero, assim como Beckenbauer.

Sem Haaland, Guardiola pode voltar a usar a estratégia de um falso 9 na decisão para controlar o meio-campo. Julian Álvarez, reserva diante do Urawa Reds, deu espaço para Foden exercer esse papel.

Para o Fluminense, a dificuldade será, na mesma medida, povoar o meio-campo para não ceder a superioridade numérica ao time inglês. André, que também atuou como zagueiro em alguns momentos na temporada, terá papel crucial para isso.

Guardiola não terá Haaland e De Bruyne para a decisão contra o Fluminense. Foto: Amr Abdallah Dalsh/ Reuters

Contra o Al Ahly, Fernando Diniz teve dificuldades nos contra-ataques rápidos dos egípcios. Esse é um cenário que pode se repetir, principalmente se Foden passar pelo meio-campo e Álvarez voltar à titularidade. Sem Doku, o City perde a velocidade pelo lado esquerdo, mas ganha o controle da posse de bola com Jack Grealish. Uma das ferramentas do camisa 10, observada na semifinal, é segurar ao máximo o jogo pelas pontas até a linha de defesa se descompactar e seus companheiros avançarem pelo fundo de campo. É um tipo de gol que o Manchester City cansou de fazer nas últimas temporadas.

A um primeiro olhar, não há fraquezas nesse Manchester City campeão da Champions League – mas há caminhos para o Fluminense. Um destes é por meio das pontas – as mesmas que podem impor o maior risco ao time tricolor. Com Stones como líbero, os ingleses se defendem com três zagueiros em boa parte do jogo. Contra o Urawa Reds, a linha foi composta por Kyle Walker, Manuel Akanji e Nathan Aké, mas Josko Gvardiol pode entrar na final pelo lado esquerdo.

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Desde a última temporada, Guardiola tem tido dificuldades para alinhar esse setor. Nessa Premier League, sofreu 20 gols em 17 jogos – em 2022/2023, foram 33 em 38 partidas. Akanji, pelo meio, mostrou dificuldades, principalmente no primeiro tempo, para acompanhar a marcação sobre pressão dos japoneses. Foram cerca de 15 minutos, mas Ederson precisou intervir em pelo menos três momentos. Com John Arias e Keno, além de Germán Cano, as laterais do City podem ter dificuldade para acompanhar a velocidade do Fluminense.

“Eu sei exatamente do talento e qualidade que o Fluminense tem e o que eles são capazes de fazer. Eles derrotaram equipes da Argentina, Colômbia e Uruguai. Conheço meus jogadores e os respeito pelo que eles podem fazer”, afirmou Guardiola na entrevista coletiva antes da partida. Na última derrota do City, diante do Aston Villa, o time de Guardiola deu apenas dois chutes a gol em toda a partida. Isso se deve principalmente à forma que o adversário se defendeu: duas linhas de quatro na defesa, que impedia a articulação do meio-campo dos citizens.

Derrota do Manchester City diante do Aston Villa pode servir de exemplo para como o Manchester City pode se defender no Mundial de Clubes. Foto: Rui Vieira/ AP

Nos cenários de ataque, o Aston Villa postava-se em um 4-2-3-1 para complicar a linha de 3 defensiva do City. Esse pode ser um caminho, principalmente pelo fato de o Fluminense não ter a mesma velocidade em seu setor defensivo para impedir corridas ofensivas de Bernardo Silva; na decisão da Champions League contra a Inter de Milão, partiu do camisa 20, que se infiltrou na defesa italiana, o passe para Rodri marcar o único gol da vitória do City.

Aproveitamento do City na temporada

Guardiola afirmou que não iria comentar sobre a cobertura da imprensa nessa final. Mas fato é que, desde 2005, o Manchester City tem o quarto pior aproveitamento de um europeu que enfrentará uma equipe brasileira na decisão do Mundial de Clubes. Nesta temporada, ocupa apenas a quarta posição da Premier League e está a cinco pontos do líder Arsenal.

A dificuldade do City é principalmente defensiva e, sem De Bruyne, Rodri é o único no meio-campo capaz de controlar a bola para o ataque inglês. Antes do jogo contra o Fluminense, o City soma 69,2% de aproveitamento; segundo levantamento do Estadão, apenas Chelsea (2012 e 2021) e Liverpool (2005) chegaram à decisão em um momento pior no ano.

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