Copa SP: jovens nas mãos dos empresários

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Por Agencia Estado
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O Náutico Futebol Clube é o primeiro time de Roraima a disputar a Copa São Paulo de juniores. O que era para ser um motivo de orgulho para aquele estado do norte do Brasil é, na verdade, o retrato mais fiel da esculhambação que virou o torneio, todo largado na mão de empresários. Nenhum dos jogadores que usaram ontem a camisa alvirrubra do Náutico contra o América-SP, em Embu das Artes, sequer já esteve em Roraima. São atletas que vêm de toda parte do País. Há paulistas, mineiros, cariocas, paranaenses. Alguns nem sabem apontar no mapa onde fica o estado de Roraima. Conheceram-se ontem mesmo, no alojamento, horas antes da estréia. Todos foram encaixados no Náutico por seus respectivos empresários. A maioria pertence a Cláudio Sgarbi, dono da empresa "New Soccer", sediada na Flórida (EUA). A reportagem da Agência Estado presenciou o exato momento em que um dos jogadores, o meia Jackson, de Cuiabá, chegou ao alojamento do time, em Embu das Artes, Grande São Paulo. Levado de carro por seus dois empresários, o garoto, de 20 anos, estava ansioso. "Não faço idéia do que vou encontrar". Ao chegar, Jackson foi recepcionado e apresentado ao seu novo técnico, Osmar Pedro - outro que nunca esteve em Roraima. "Seja bem-vindo, garoto", disse Osmar. Logo em seguida, os dois empresários de Jackson, Samuel Gomes e Jefferson Viola, trataram de contar a Osmar o currículo e as qualidades do jogador. "Ele é um meia-esquerda, habilidoso, já jogou com o Marcelo Passos na Prudentina, treinou no Santos, no Corinthians." Osmar ficou impressionado. Acabou escalando Jackson como titular. Mas fez isso também porque não tinha muitas opções. A duas horas da estréia, a diretoria do Náutico só havia conseguido reunir 13 atletas para Osmar. Sem nunca ter visto nenhum deles em ação, o técnico disse que, na preleção, daria uma "aula teórica" e que escalaria o time conforme as informações que recebesse dos próprios atletas. E também dos empresários, claro. A montagem do Náutico não foi fácil. Oswaldo Teixeira, presidente do clube, disse que a intenção era trazer o time (atual campeão de juniores de Roraima) para São Paulo um mês antes da Copa. Mas não havia dinheiro nem para trazer o time antes da estréia. Aliás, não havia dinheiro nem para trazer o time inteiro. Só havia verba para cinco jogadores de Roraima fazerem a viagem. Eles são esperados hoje - um dia após a estréia. "A passagem de avião custa mais de mil reais. É muita grana", reclamava Teixeira. Aluguel - O jeito, então, foi "alugar" a camisa do clube. E o esquema passa pela Secretaria Estadual de Esportes de São Paulo. Teixeira conversou com dois funcionários da Secretaria, que lhe indicaram a empresa de Samuel Gomes e Jefferson Viola. "Ele queria um meia e nós indicamos o Jackson", conta Gomes. Todos juram que não há dinheiro envolvido na negociação. "Temos um nome a zelar, não somos aventureiros. Se o Jackson se der bem e for contratado por um grande clube, a gente fica com uma porcentagem e o Náutico com outra. É isso", esclarece Gomes, que tem atletas em outros cinco times da Copa. "Todos os jogadores fazem um contrato com a gente, que é registrado na CBF. Se tudo der certo, cada um fica com uma parte (do dinheiro)", emenda Teixeira, sem revelar a porcentagem que cada um levará em caso de venda. Para os atletas, entrar em campo sem conhecer o nome do colega era uma situação constrangedora - para pedir a bola, por exemplo, era preciso gritar "toca pra mim, número cinco". O jeito, segundo eles, foi apelar para a garra. "É chato jogar assim, sem conhecer ninguém. Mas todos vão dar o máximo para se ajudarem em campo", dizia o meio-campista paulistano Edson Henrique, 18 anos. "Essa é a nossa grande chance. A Copa é uma vitrine. Vamos ter que tentar nos superar", emendou o goleiro mineiro Michael, de 20 anos. Com outros três jogadores, ele viajou 18 horas de ônibus de Carangola até São Paulo. Chegaram ao alojamento de Embu na madrugada de terça-feira, horas antes da estréia. Antes de entrar em campo, porém, Michael ainda teria de enfrentar um novo problema. Às 11h30, duas horas e meia antes do jogo, o goleiro se tocou que não havia trazido suas luvas. Um funcionário do clube teve de ir correndo ao centro da cidade para procurar uma loja de material esportivo. Além das luvas, teve de comprar também um par de caneleiras para o meia Jackson. "Poxa, esqueci em casa. E sem caneleira não pode jogar...", dizia o garoto, preocupado. Os problemas foram solucionados a tempo. O Náutico entrou em campo, com luvas e caneleiras. Mas tanta desorganização não poderia mesmo dar certo. E o time acabou perdendo por 7 a 1 para o América-SP - a maior goleada da Copa São Paulo até o momento. Apesar disso, os empresários de Jackson saíram satisfeitos. "Havia alguns olheiros no estádio e até já nos procuraram. Gente do Santo André, do Gama, e até da Itália e da Grécia", disse Jefferson Viola.

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