O ex-meia Thiago dos Santos está ansioso para ser um dos possíveis beneficiados pelo novo projeto da Fifa de ajudar jogadores que foram vítimas de calotes de clubes de futebol. O paulista de 34 anos e outros milhares de atletas pelo mundo são o foco de uma medida da entidade de criar um fundo que distribuirá até 2022 cerca de R$ 75 milhões (na cotação atual) para socorrer quem já esgotou as tentativas jurídicas de receber acertos pendentes com antigas equipes.
A Fifa anunciou a criação do fundo no último mês e vai iniciar a operação a partir de julho em parceria com o sindicato mundial dos atletas (FIFPro). O objetivo não é pagar integralmente os valores a que os jogadores têm direito, mas sim oferecer um auxílio para reduzir de alguma forma a pendência. "Esse acordo é um comprometimento em ajudar jogadores que estão em situação difícil", disse o presidente da Fifa, Gianni Infantino.
O fundo será composto por repasses graduais feitos a partir deste ano com recursos da própria Fifa. A primeira remessa de recursos será de R$ 15 milhões. O pacote de R$ 75 milhões vai cobrir os calotes existentes apenas a partir de julho de 2015. Os jogadores interessados vão precisar enviar toda a documentação por e-mail para comprovar os requisitos ao benefício e um comitê ficará encarregado de avaliar os pedidos.
A medida visa principalmente contribuir com atletas de transferências internacionais que não vão conseguir receber porque os clubes declararam falência, encerraram as atividades ou comprovaram a incapacidade de pagamento. Segundo a FIFPro, nos últimos cinco anos, mais de 50 clubes em 20 países fecharam as portas e, por isso, não podem mais ser responsabilizados, mesmo que comprovadamente os jogadores tenham o direito de receber.
Um desses exemplos é justamente o de Thiago dos Santos. Em 2014, ele assinou com o Moroka Swallows, da África do Sul, onde jogaria por três temporadas. Ao fim do primeiro ano, o jogador foi dispensado e teria direito a receber a multa rescisória. Thiago afirma que ficou acordado o pagamento de cerca de R$ 130 mil em parcelas mensais. Mas nunca houve o repasse.
"Um diretor do time me avisou que não ia ter como me pagar porque o time abriu falência. Eles acabaram com a minha vida. O dinheiro do primeiro ano eu gastei na minha festa de casamento e depois fiquei sem receber", criticou. O ex-jogador atualmente trabalha em Osasco como professor de escolinhas de futebol e comemorou a novidade anunciada pela Fifa. "Para mim é como a luz no fim do túnel", disse. O jogador acionou o Sindicato de Atletas São Paulo (Sapesp) para cuidar do caso.
A antiga equipe de Thiago fechou em 2015, porém os donos compraram há dois anos um outro clube local e mudaram o nome para Swallows FC. Por ser um novo time registrado, ele não pode ser responsabilizado pela dívida. "Mesmo depois de vir embora, eu não consegui jogar. O clube era muito desorganizado e meu registro profissional não constava como liberado para atuar por outra equipe", contou Thiago.
Para o advogado especializado em direito desportivo Eduardo Carlezzo, a novidade trazida pela Fifa será benéfica. "Já tivemos vários casos no meu escritório em que atletas brasileiros jogaram em clubes no exterior, não receberam salários, tivemos que recorrer à Fifa, ganhamos o processo e na sequência o clube entrou em falência ou foi desfiliado, impossibilitando o atleta de receber seu crédito, já que nestas situações o processo é extinto", explicou o sócio do escritório Carlezzo Advogados.
Procuradas pelo Estado, tanto a Fifa como a FIFPro não apresentaram informações mais detalhadas sobre o número de jogadores que podem ser beneficiados nem quais os critérios ou cronograma de distribuição dos recursos. As duas entidades usaram como base para o projeto uma pesquisa feita pela FIFPro em 2016 sobre a situação dos jogadores de futebol pelo planeta. Dos 14 mil entrevistados, 41% disseram ter vivenciado algum problema de atraso salarial nos dois últimos anos.