O futebol feminino começa a ganhar popularidade e a ser reconhecido por federações nacionais em todo o mundo. Mas o primeiro levantamento realizado pela Fifa revela que o total das transferências da modalidade neste ano é equivalente ao que custaram apenas três jogadores no futebol masculino: Neymar, Mbappé e Cristiano Ronaldo.
A distância é profunda. Em 2018, o futebol masculino registrou movimentação de US$ 7,1 bilhões (R$ 26,6 bilhões) em jogadores e 15 mil transferências. No feminino, os primeiros resultados do levantamento revelam que 577 transferências internacionais foram realizadas no ano, totalizando US$ 493 milhões (R$ 1,8 bilhão).
O comércio de transferências do esporte de Marta e Ada Hegerbe não passa de 6% do volume do masculino. São equivalentes ao que o futebol dos homens fazia, segundo a Comissão Europeia, em 1994. A própria existência de dados é uma novidade e o mapeamento do mercado ainda está longe de ser completo – no masculino, o mapeamento é feito desde 2010. Por enquanto, apenas 65 das 211 federações nacionais filiadas à Fifa têm feito parte do sistema de monitoramento, com 198 clubes.
Na África, apenas sete das 54 federações adotaram o instrumento de relatar de forma eletrônica as transferências de jogadoras. Na Ásia, são seis de 46 países. Na Conmebol, a taxa é mais elevada, com oito das dez federações e 29 clubes monitorados. É na Europa, no entanto, que ocorre grande parte do registro de transferências: 141 times de 38 países prestam contas à Fifa sobre a compra e venda de atletas. Nesta semana, a Fifa lançou sua primeira estratégia para expandir o futebol feminino no mundo. A meta é de que, em 2026, 60 milhões de mulheres estejam praticando o esporte, o dobro de hoje.
A Fifa estipulou ainda que, até 2022, todas as entidades nacionais precisarão ter estratégias de desenvolvimento para o futebol feminino e, em 2026, um número duas vezes superior ao atual precisa organizar torneios de categorias jovens entre meninas. Para 2019, a meta é de que a Copa do Mundo Feminina tenha audiência acumulada de 1 bilhão de pessoas.
Mas, por enquanto, a disparidade é grande também nos contratos. Em apenas 3,5% dos casos uma atleta trocou de clube enquanto seu contrato estava em vigor. No futebol masculino, essa taxa é de mais de 15%. E 94% dos casos de transferência de jogadoras se referem a atletas que já tinham terminado seus contratos e estavam liberadas para buscar um novo time.
As jogadoras mais cobiçadas são as americanas. Em 2018, 108 transferências envolvendo atletas dos EUA foram registradas. “Neste momento, elas podem ser consideradas como o equivalente ao domínio que os brasileiros representam para o mercado do futebol masculino”, diz o levantamento da Fifa.
A segunda colocação no ranking é a Venezuela, com 64 jogadoras transferidas para o exterior neste ano. O Brasil aparece em terceiro lugar, com 40 casos. Desses, 33 foram “exportadas” de clubes nacionais para o exterior. Os clubes dos EUA foram os que mais exportaram atletas, com 69 transferências.
A Fifa admite que o volume movimentado e o mercado internacional ainda é modesto. “Essa é a consequência do fato de o mercado para jogadoras profissionais estar ainda em um estágio inicial de seu desenvolvimento”, explicou. A entidade acredita que exista potencial para expansão no futuro. Mas não se arrisca a prever que caminho esse mercado vai tomar.
“Uma possível análise para estes números recai na pouca estrutura e na deficiente profissionalização do futebol feminino na grande maioria das federações”, disse Silvana Vilodre Goellner, do Centro de Memória do Esporte da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e integrante dos grupos de trabalho promovidos pela CBF para debater o futebol feminino.
Ela tem sugestões sobre como lidar com essa realidade. “Para ampliar esse mercado só há uma saída: que a Fifa e as federações nacionais fomentem estratégias de profissionalização do futebol feminino de modo que as atletas tenham seus direitos assegurados, inclusive o de se transferir para outro país.
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