É muito fácil falar bem de Paulo Henrique Ganso. Jogador raro, fora de série, craque mesmo, daqueles capazes de atrair a atenção até mesmo daquela pequena parcela de loucos que insiste em não gostar de futebol. Por isso, qualquer menção a aspectos negativos, ainda mais em um momento como esse, no qual Ganso volta aos gramados depois de quase sete meses de recuperação de uma cirurgia no joelho, faz o autor da crítica ficar naturalmente exposto a uma avalanche de descontentes. Ciente que estou disso, vamos ao ponto central da coluna.Ganso é marrento. Ocorre que no futebol, especialmente nos mercados latinos, onde o aspecto passional da torcida e da própria mídia é mais evidente, esse tema é abordado com cautela. A gente fica meio sem graça de apontar problemas em ídolos. A tolerância com as atitudes do jogador é proporcional ao seu talento. Trata-se de uma ordem de grandeza: quanto maior a capacidade de o atleta resolver partidas, maior a paciência do ambiente com seus tropeços.Um exemplo disso são os eufemismos utilizados para definir os boleiros. Se o sujeito é um atleta comum, são atribuídos a ele adjetivos como temperamental, marrento e difícil. Agora, se nos referimos a um craque, resumimos tudo isso a "personalidade forte". Foi assim na final do Campeonato Paulista do ano passado, quando Ganso confrontou o então técnico do Santos, Dorival Júnior, e se recusou a deixar o campo durante a partida contra o Santo André.Mas esse episódio ficou para trás. O que chamou a atenção recentemente foi uma entrevista dada por ele ao SporTV. Nela, Ganso não faz questão alguma de esconder seu descontentamento com a diretoria do Santos. Fala abertamente de sua frustração por ainda não ter renovado o contrato e, a exemplo do amigo Neymar, não dispor de um plano de carreira. "Plano de carreira", entenda-se, estratégia para ganhar mais dinheiro. O que há de mal nisso? Nada. Porém, Ganso parece patinar duas vezes nessa história. A primeira é usar o acerto de Neymar como referência. Vale lembrar que o companheiro tinha proposta concreta do Chelsea, da Inglaterra. Além disso, parte dos rendimentos de Neymar está condicionada a seu potencial de gerar receita. Não acho que o topetudo seja mais jogador do que Ganso, mas no momento sua imagem é mais fácil de ser vendida. Neymar é carismático, especialmente com crianças e jovens. Paulo Henrique me parece mais tímido. Enfim, é uma questão para o mercado decidir.O segundo deslize é tratar publicamente desse assunto. Ganso sabe que a relação entre a diretoria do clube e os executivos da empresa que detém parte de seus direitos é conflituosa. Portanto, não seria interessante tomar partido nessa queda de braço.Enfim, todos esses comentários são de um cara que torce muito para que Ganso tenha um futuro brilhante e espera ver o meio-campo e ataque da seleção brasileira na Copa de 2014 formado por Lucas, Ganso, Neymar e Pato.
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