Gostar da bola

O jogo teve a cara de muitas decisões: primeiro tempo travado, tenso, segundo tempo mais aberto, gol solitário na prorrogação. E a vitória teve a cara da Espanha, que fez por merecer por seu jogo técnico, preocupado com a bola, tocado por jogadores habilidosos. Iniesta coroou a fase, a Copa e a partida que fez com seu belo gol. A Holanda conseguiu anular a armada espanhola por bons períodos, mas recorreu demais às faltas e de menos às finalizações, e depois foi condenada nos dois quesitos. A Espanha leu melhor o jogo e lhe deu o fecho mais digno.A bem da verdade, foi uma partida chata, especialmente no primeiro tempo, e em alguns momentos teve jeito de que terminaria nos pênaltis, como a Copa de 2006. Mas a Jobolani não quis punir o time que melhor tratou a bola nos últimos dias, rolando de pé em pé até tirar a paciência do adversário. No segundo tempo, como o meio estava congestionado, os espanhóis começaram a achar espaços pelas pontas, principalmente com Sergio Ramos pela direita. Villa saiu do meio dos zagueiros e foi incomodar pela esquerda, chegando a perder um gol na pequena área.Nesse momento a Holanda já não conseguia tirar a bola de Xavi e Iniesta e passou a tentar os contra-ataques. Sneijder, discreto até então, acionou Robben em velocidade, mas Casillas salvou a pátria. Robben teve outra chance, de novo em profundidade, mas foi atrapalhado por Puyol e Casillas. Vicente del Bosque tirou Xabi Alonso e pôs Fábregas, que deu mais leveza ao time e criou duas boas chances. A Espanha era dona da prorrogação, Heitinga foi expulso e o gol veio a quatro minutos do fim. Para mim, apesar de Forlán ter feito uma excelente Copa, Iniesta deveria ter sido eleito o melhor da competição.A Copa não se encerrou com um jogo bonito, mas o troféu foi para quem mais tentou jogar bonito; a bola gosta de quem gosta dela. Ao mesmo tempo, o placar exíguo refletiu o torneio todo, que nesse aspecto ficou no mesmo patamar da Copa de 1990, e ainda por cima o juiz errou ao não dar escanteio para a Holanda pouco antes do gol. De qualquer modo, a Copa da África do Sul teve a vantagem de exibir um campeão inédito e merecido. Ao contrário do que muitos previam, não foi uma Copa de defesas retrancadas, esquemas de contra-ataque, finalizações escassas. Foi sim a Copa de gols perdidos, táticas previsíveis, craques apagados. O time que soube controlar a bola, variar jogadas e exercer talento foi, logicamente, o que se saiu melhor.Agora é cobrar para que o Brasil organize uma boa Copa, para a qual já está atrasado, e a Fifa faça mudanças para diminuir erros de arbitragem e estimular a qualidade dos jogos. E que a CBF seja menos arrogante e mais transparente e monte uma seleção realmente renovada, que se inspire na atual campeã e volte a gostar da bola.