A decisão do Mundial de Futsal ontem foi digna de um filme épico. Com um herói e um vilão, a esquadra do mocinho de amarelo e a dos inimigos, de vermelho. Memórias ruins de duas partidas perdidas para os mesmos rivais nos dois últimos campeonatos realçavam o drama brasileiro. E emoções não faltaram durante a uma hora de partida, que acabou em tiros da marca do pênalti. No fim, o time de amarelo marchou sob os aplausos de uma arena de gladiadores lotada. O Brasil é hexacampeão mundial de futsal. O herói brasileiro não poderia ser mais inusitado. O goleiro Franklin viu toda a decisão do banco de reservas e só entrou em quadra na disputa por pênaltis. Diferente de 2004, quando pegou uma cobrança e mesmo assim o time perdeu o campeonato, defendeu duas e ganhou. "Deus é tão grande que ele fez aquela história acontecer novamente. No momento certo, fui iluminado. Conseguimos ser campeões dentro de casa: uma felicidade absurda." A cobrança decisiva defendida por Franklin foi batida por Marcelo, brasileiro naturalizado espanhol, que havia levado a Fúria à conquista do Mundial passado. Ontem, coube ao jogador o papel do vilão. "Queria ser campeão mundial de novo, colocar a terceira estrela na camisa da Espanha", afirmou, com os olhos cheios de lágrimas. O pivô foi muito vaiado durante o jogo, principalmente na hora do fatídico chute. "Continuo me sentindo brasileiro. Tenho família aqui e apesar de defender a seleção espanhola, meu sangue é brasileiro." No futsal, o confronto com a Espanha atingiu um nível de rivalidade semelhante ao clássico sul-americano com a Argentina no futebol de campo. A diferença é que, em quadra, brasileiros e espanhóis são as duas maiores potências e decidem Mundiais. Ontem, disputaram pela terceira vez uma final (o Brasil venceu em 1996, e os rivais em 2000). "São duas seleções excepcionais", analisou Schumacher. E que final elas fizeram. "Foi a melhor de todos os tempos", definiu o técnico Paulo César de Oliveira, o PC. O Brasil buscou o ataque durante todo o primeiro tempo, enquanto o adversário buscava o gol em perigosos contragolpes. Mas a etapa inicial acabou 0 a 0. A segunda começou dramática: Falcão contundiu o joelho esquerdo e foi para o banco. Quando tudo parecia contra o Brasil, Marquinho cobrou escanteio, acertou o rosto de Borja e o canto do goleiro Luis Amado: 1 a 0. A alegria, porém, durou pouco: Torras acertou um chute forte e surpreendeu Tiago: 1 a 1. Faltando três minutos para o fim do jogo, Vinicius marcou o segundo do Brasil. Para a torcida, a festa parecia próxima. Porém, faltando um minuto, Álvaro empatou e provocou Falcão. "Nunca falei com o Alvaro e ele veio dizer que eu não estava jogando porque estava com medo", contou o brasileiro. "Os meus companheiros me abraçaram, disseram que iam vencer por mim e eu tive confiança nesse grupo", contou o ala, eleito o melhor jogador do campeonato. Enfim, o Brasil venceu. "Tirei um peso de 10 toneladas das minhas costas", disse o jogador, que deixou suas pegadas eternizadas na calçada da fama do Maracanãzinho. Toda a sua geração se sentiu aliviada também. "Agora eles (os espanhóis) vão ter que pegar o vôo pensando muito em mim. Vou ficar muito feliz de fazer parte do pensamento deles." Um filme inesquecível para ambos os lados.