Ataques na Síria mataram centenas de alauítas e ao menos sete cristãos; entenda o caso

Postagens afirmam que cristãos foram principais alvos de perseguição no país, mas autoridades internacionais apontam que maioria dos mortos era muçulmano alauíta

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Foto do author Giovana Frioli
Atualização:

Um confronto entre o novo do governo da Síria e as forças apoiadoras do presidente deposto Bashar Assad deixou centenas de mortos na última semana. Imagens da onda de violência passaram a ser compartilhadas nas redes sociais por usuários brasileiros afirmando que cristãos teriam sido o foco dos ataques. Porém, autoridades internacionais apontam que o alvo dos ataques e a maioria dos mortos são da comunidade religiosa alauíta, tradicionalmente apoiadora de Assad.

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A operação militar foi encerrada pelo Ministério da Defesa da Síria, na segunda-feira, 10, após denúncias de uma “limpeza étnica sistemática” contra os alauítas, que vivem sobretudo no oeste do país. A Federação Alauíta na Europa publicou, em 7 de março, uma declaração afirmando que há um “extermínio deliberado de uma minoria religiosa” enquanto a “comunidade internacional assiste em silêncio”. O comunicado pede por ações dos países europeus contra os líderes sírios.

A Organização das Nações Unidas (ONU) se pronunciou, no dia 10, sobre execuções sumárias contra civis no país e acionou o Conselho de Segurança em uma reunião de emergência. O comunicado frisou que a maior parte dos assassinatos ocorreu em bairros alauítas nas províncias costeiras de Latakia e Tartus e afirma que recebeu relatos “extremamente perturbadores” em relação a morte de famílias, mulheres, crianças e ex-combatentes.

De acordo com o Observatório Sírio para os Direitos Humanos, com base na Grã-Bretanha, cerca de 1,5 mil pessoas morreram no confronto, sendo 1.093 de civis registrados. O relatório aponta ações generalizadas de vingança contra membros alauítas, incluindo massacres em massas, incêndios de casas e deslocamento forçados.

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O que está acontecendo na Síria?

Uma onda de violência se iniciou na Síria na quinta-feira, 6, após uma emboscada dos apoiadores do ditador deposto Bashar Al-Assad contra forças de segurança do novo governo sírio, segundo denúncia da Defesa do país. O confronto entre os grupos resultou em ataques contra membros da comunidade alauítas. Assad pertence à minoria religiosa e o grupo é tradicionalmente apoiador do ex-presidente.

Em dezembro do ano passado, o grupo islâmico Hayat Tahrir al Sham (HTS, Organização para a Libertação do Levante) derrubou o regime de Assad com apoio de outras facções após treze anos de uma guerra civil no país. Após a queda, o ex-presidente precisou fugir para a Rússia com sua família. O líder do HTS, Ahmed al-Sharaa, assumiu interinamente a presidência da Síria e tranquilizou a população sobre a segurança de minorias religiosas no território.

No entanto, com o novo confronto da última semana, uma matança se espalhou nas áreas em que habitam as comunidades alauítas, na área costeira da Síria. Como noticiou o Estadão, os moradores falam sobre assassinatos de pessoas, corpos abandonados nas ruas, saques e incêndios. O terror é descrito como uma “vingança” por milícias leais ao governo sírio.

Foto mostra reforço das forças de segurança da Síria posicionadas ao arredor de Latakia, na sexta-feira, 7 de março de 2025. Foto: Omar Albam

Por que os alauítas são alvo?

A Síria é majoritariamente composta por muçulmanos sunitas, enquanto os muçulmanos alauítas são o segundo maior grupo religioso, representando cerca de 10% da população. Apesar de não ser a maioria, o país foi governado por cinco décadas pela família Assad, que segue a linha alauíta. O ex-presidente ficou por 24 anos no poder até ser deposto por integrantes do HTS.

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Segundo o novo governo sírio, os confrontos que ocorreram na última semana eram de enfrentamento a forças ligadas ao antigo regime de Assad. A Defesa disse que 200 de seus integrantes foram mortos na emboscada. Os ataques em residências e vilarejos foram atribuídos a milícias armadas indisciplinadas, que teriam ido ajudar as forças de segurança do país e culpam Assad por crimes passados.

No entanto, os alauítas negam essa versão do governo, dizendo que têm sido alvo de perseguição dos sunitas radicais que tomaram o poder em dezembro do ano passado. A comunidade afirma que eles que são vistos como “hereges”.

Os cristãos foram perseguidos?

A violência contra comunidades alauítas aumentou a tensão de minorias religiosas do país. Em notícia publicada no dia 11 de março, o jornal católico francês La Croix conversou com líderes religiosos sírios, que estimaram entre 10 a 12 de cristãos assassinados durante o conflito na última semana.

O jornal France 24 relatou que sete mortes de cristãos foram confirmadas pela AFP. Não há, no entanto, nenhum levantamento oficial com o número de vítimas ligadas a religião.

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Em nota conjunta publicada pela página Patriarca Antioquia e Todo o Oriente no Facebook, no dia 8 de março, os líderes católicos na Síria condenaram os atos de violência contra civis inocentes e pediram o fim da violência no país. Não há menção de que os cristãos tenham sido alvos principais dos ataques no comunicado.

Em entrevista ao La Croix, o arcebispo sírio Jacques Mourad de Homs disse que as ações não foram especificamente contra pessoas cristãs. O gerente de um projeto de ajuda católica na Síria Vincent Gelot também falou que “não houve massacres de cristãos, mas assassinatos em massa de alauítas”.

Ao France 24, o Patriarca Ortodoxo Grego de Antioquia, João X, que vive em Damasco, relatou mortes de cristãos junto a alauítas. O jornal The New Arab, com sede em Londres, noticiou que líderes religiosos negam que cristãos sejam alvos principais dos assassinatos.

Vídeo de protesto cristão circula fora de contexto

As publicações virais que apontam centenas de mortes e perseguição de cristãos na Síria compartilham imagens sensíveis de violências, mortes e manifestações de cristãos. Uma das gravações mostra um homem em uma multidão carregando uma cruz; porém, o conteúdo não foi gravado no contexto do conflito entre o governo sírio e apoiadores de Assad dos últimos dias.

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Em uma pesquisa com ajuda da busca reversa (saiba como fazer), foi possível identificar que o protesto aconteceu em bairros cristãos, na capital Damasco, no mês de dezembro, após uma árvore de natal ter sido incendiada por homens não identificados. À CNN, um manifestante disse que marcharam em direção às igrejas para exigir melhor proteção aos cristãos no país.

É possível ver de outros ângulos a manifestação, como em vídeo publicado pela Associated Press e Global News na véspera do natal do ano passado. Também há uma filmagem feita no meio do protesto publicado no Facebook em 24 de dezembro.

Vídeos publicados nas redes sociais na véspera do natal do ano passado mostram protesto de cristãos na Síria. Foto: Reprodução/Redes Sociais

Os vídeos exibidos nas publicações analisadas ainda mostram uma gravação de soldados sírios batendo em pessoas presas. As imagens foram repercutidas por veículos de imprensa nesta semana, como France 24 e Poder 360. O Verifica não conseguiu localizar a origem de filmagens que mostram corpos abandonados nas ruas.

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