Os ribeirinhos do Jauaperi "não estão preparados como comunidade para ter uma unidade de conservação", diz o chefe do Núcleo de Recursos Pesqueiros do Ibama em Manaus, James Bessa. Segundo ele, uma reserva extrativista depende de união entre os seus membros para funcionar. O que não existe no Jauaperi.Em contraponto ao esforço de algumas lideranças, muitas das irregularidades praticadas no rio contam com a conivência - e até a participação - dos próprios ribeirinhos. Vários trabalham nos geleiros e caçam quelônios ilegalmente."O conflito é entre eles mesmos. É quase uma briga de família", afirma Bessa, aludindo ao fato de que a maioria das famílias são aparentadas. "A solução precisa vir das próprias comunidades. Enquanto eles não quiserem remar todo mundo na mesma canoa, vai ser difícil resolver alguma coisa." Bessa não concorda que o Ibama esteja ausente na região - como acusam muitos ribeirinhos -, mas não esconde as dificuldades da fiscalização.Nem o fato de que a pesca ilegal ocorre no Jauaperi - assim como em vários outros rios da Amazônia. Ou o fato de que o Ibama pouco consegue fazer a respeito. "Assim que o nosso barco sai de Novo Airão alguém avisa pelo rádio e todo mundo some do rio. Podemos ficar 30 dias navegando que não vamos pegar ninguém."Esconderijos não faltam. Em meios às centenas de igarapés, ilhas e curvas que emaranham o rio, fica fácil fugir das autoridades. Nos seis dias em que a reportagem do Estado percorreu os Rios Negro e Jauaperi, avistou só dois geleiros - um deles com o nome raspado na proa. Bastou chegar à primeira comunidade para descobrir o por quê: espalharam uma notícia no rio de que era o Ibama que estava chegando.A fiscalização poderia ser feita nos portos, no momento em que as mercadorias são descarregadas. Mas, segundo Bessa, não há como saber onde cada peixe foi pescado, se é ilegal ou não. "Para fazer uma apreensão, tem de ser flagrante. Tem de pegar o barco no rio", diz. Uma solução seria colocar uma base flutuante de vigilância na boca do rio, mas Bessa acha improvável que isso aconteça enquanto a área não for unidade de conservação. A Resex, se criada, fecharia um dos últimos pedaços de rio ainda abertos para pesca comercial na região. "Quase tudo aqui já é área protegida. Se o Jauaperi virar reserva, vamos ficar sem nada", diz o vice-presidente da colônia de pescadores de Novo Airão, Raimundo Sarmento de Almeida. Ele reconhece o impacto sobre a quantidade de peixes no rio, mas diz que os barcos continuam a pescar por falta de opção. "O caboclo vai fazer o quê? Precisa alimentar a família dele, se vestir, comprar calçado para os filhos. Poderia até sair do rio e ir para terra, mas na terra também não pode fazer roça, não pode derrubar árvore, não pode criar gado", argumenta o pescador - "criado na proa da canoa de meu pai, graças a Deus".