PARIS - No dia 6 de junho de 1944 numa base aérea do sul da Inglaterra, Rémi Dreyfus, um oficial francês incorporado ao Special Air Service (SAS) britânico perguntou: onde está meu paraquedas? Resposta: não há, você vai num planador.
Essa história aconteceu com os 177 fuzileiros navais franceses do comando Kieffer, que desembarcaram no Dia D na praia de Sword Beach, na Normandia, mas não foram os únicos. Dreyfus, de 100 anos, relembra em seu apartamento em Paris com brilho nos olhos suas missões de exploração no bosque normando, entre Caen (oeste) e a boca do rio Orne.
"Um planador... Nunca havia pisado num planador", disse. "Mas bem, lá fomos. Éramos uns 15 a bordo. Decolamos às 18 horas, nunca soube de qual base aérea, não nos contaram", contou. "Havia planadores por todas as partes (...) Logo depois sobrevoamos milhares de barcos, protegidos por centenas de aviões de caça que ocupavam todo o espaço aéreo. Nenhum avião alemão podia se aproximar. Tive a impressão que éramos invencíveis... Ou seja: eu estava do lado dos invencíveis."
O planador de Rémi Dreyfus e de seus companheiros aterrissou sem problemas perto do povoado de Ranville, a nordeste de Caen. Como ponto de referência os pilotos usavam o campanário (torre onde fica o sino da igreja) atípico desta localidade.
"Tudo estava tranquilo, sem combates ou disparos. Minha missão oficial era ser intérprete para o general (Richard) Gale, mas logo percebi que ele não precisava", comenta com um sorriso. "Então fiquei passeando, por alguns dias, nesta pequena localidade da França livre".
Blindados num bosque
Então chegou Paul Jarrige, outro francês incorporado aos famosos comandos aéreos britânicos. "Foi quando inventamos o papel útil que podíamos desempenhar: fixamos como nossa missão explorar uma terra de ninguém, cerca de 10 km entre as linhas inglesas e alemãs. Nós saíamos pela noite, por volta das 22h, e retornávamos às 4h".
Eles iam em direção às florestas. "É preciso ter cuidado, não se aproximar muito das linhas alemãs, para não ser pego. Também não pode ficar muito longe. É muito sutil".
"Fizemos quatro ou cinco missões de exploração deste tipo. Numa delas localizei duas dezenas de blindados alemães escondidos num pequeno bosque, facilmente reconhecível no mapa. Voltei, informei sobre a existência deste pequeno bosque e do que havia ali; os bombardeiros destruíram tudo por volta das 10 da manhã", acrescenta, enquanto arruma sobre uma mesa da sala de casa as quatro condecorações recebidas. A mais valiosa para ele é a Cruz de Lorena da França Livre.
Durante as patrulhas clandestinas, Dreyfus conheceu muitos franceses. A maioria estava encantada por ver a insígnia azul, branca e vermelha no ombro deste soldado com uniforme britânico. "Outros menos, por exemplo os que perderam cabeças de gado nos bombardeios", recorda.
Após a conquista de Caen e o início da derrota alemã, pediu para voltar à Inglaterra. Se uniu ao SAS. A missão seguinte foi em agosto: impedir que as tropas alemães se deslocassem do sul para o norte da França.
"Trinta equipes de dez paraquedistas, para bloquear 20 a 25 estradas", afirma. "Devíamos atacar os alemães o quanto antes... Não era sempre fácil". Contavam com a ajuda de membros da Resistência Francesa que haviam bloqueado as estradas.
Em setembro chegou ao fim a participação na campanha da França de Rémi Dreyfus, filho de banqueiro. Ele se formou na Escola de Estudos Superiores do Comércio, em 1939. Retornou "com alegria" para a vida civil e começou a trabalhar numa rede de supermercados, onde ocupou um cargo executivo durante toda a vida profissional. / AFP