LONDRES - O ex-secretário britânico para o Brexit, Boris Johnson, enfrentará uma investigação interna sobre alegações de que teria violado o código de conduta do Partido Conservador ao escrever um artigo de opinião para o jornal Daily Telegraph, publicado na semana passada, dizendo que mulheres de burca se parecem com "ladrões de banco" e "caixas de correio".
Johnson renunciou ao cargo de principal diplomata da Grã-Bretanha há um mês, depois de afirmar que as propostas de Theresa May para a saída do país da União Europeia (UE) estavam matando o sonho de uma saída clara e decisiva do bloco. Johnson continua integrando a bancada do Parlamento e é candidato para substituir May em uma futura disputa pelo poder.
Depois de deixar seu gabinete, o ex-prefeito de Londres usou a caneta novamente como escritor para a sessão opinativa do Telegraph.
Em sua coluna mais recente, o ex-secretário expressou sua oposição à proibição do uso do véu na Dinamarca, mas não deixou de criticar o traje islâmico tradicional, chamando niqabs e burcas de "opressivos e ridículos". Ele disse que as escolas deveriam ter o direito de dizer a seus alunos para remover o véu caso algum deles aparecesse "parecendo um ladrão de banco". "É absolutamente ridículo que as pessoas optem por ficar parecendo caixas de correio", disse Johnson.
Nas redes sociais, rapidamente o "Boris Burqa Brawl" (Briga de Boris com a Burca) se espalhou.
Johnson foi chamado para pedir desculpas, mas recusou. Acredita-se que ele esteja de férias e não tenha sido contatado. Enquanto ele e seus colegas conservadores enfrentam acusações de islamofobia, o Partido Trabalhista e seu líder, Jeremy Corbyn, também são acusados de tolerar o anti-semitismo entre seus membros.
Críticos dizem ser escandaloso que um aspirante conservador ao maior cargo do país e o ex-responsável pelas relações do Reino Unido com o mundo lance um ataque tão amplo contra o tradicional traje islâmico. As ruas de Londres estão cheias de mulheres com véus em seus rostos, algumas cidadãs britânicas. Cerca de 5% da população do país é muçulmana, vinda principalmente do Paquistão e de Bangladesh.
Críticas.
David Lammy, membro do Partido Trabalhista, de oposição, chamou Johnson de uma versão do presidente americano, Donald Trump, e disse que ele estava "atiçando as chamas da islamofobia" para obter ganhos políticos. Johnson é conhecido por suas declarações bombásticas, gafes e provocações, mas mesmo alguns de seus colegas de partido disseram que ele foi longe demais desta vez.
A primeira-ministra May disse que as palavras de Johnson "claramente causaram ofensas". "Acho que todos nós temos que ser muito cuidadosos com a linguagem e os termos que usamos", disse.
O secretário de Cultura, Jeremy Wright, disse que é razoável ter uma "conversa robusta" sobre o uso do véu, mas não gostou do tom de Johnson. "Não estamos falando com nossos amigos no pub, somos figuras públicas e temos a obrigação adicional de ter cuidado", disse Wright à BBC.
A líder dos conservadores escoceses, Ruth Davidson, chamou as observações de Johnson de "gratuitamente ofensivas" e disse que ele deveria se desculpar.
No entanto, Jacob Rees-Mogg, membro conservador do Parlamento, disse que a primeira-ministra May está errada. A declaração foi feita no programa da rádio de Nigel Farage. "Ele tem todo o direito de dizê-lo e não há nada para se desculpar." Como Johnson e Farage, Rees-Mogg é defensor do Brexit decisivo e rápido.
A comissária da polícia metropolitana, Cressida Dick, que havia encarregado seus agentes de investigar o caso, disse ao jornal Telegraph que as palavras de Johnson não atingiram o limite para serem consideradas uma ofensa criminal.
O legislador conservador Conor Burns criticou o escrutínio da polícia, dizendo que "com tudo o mais acontecendo em Londres, desviar recursos para uma investigação superficial sobre um artigo (de opinião) é bizarro".
Observadores de longa data da carreira de Johnson sugerem que o político está modelando sua retórica sobre Trump e busca reforçar o apoio entre conservadores da ala direita.
A baronesa Sayeeda Warsi, membro da Câmara dos Lordes e conservadora, tuitou que "Boris é apenas um sintoma, a doença da islamofobia é muito mais profunda". Ela disse que recebeu bem a investigação interna, mas que não se deve "fingir que este é um incidente isolado". / W. POST
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