É uma noite de frio cortante em Bautzen, uma bela cidade incrustada nas montanhas de Oberlausitz, no interior do Estado da Saxônia, no leste alemão. Mas os ânimos estão exaltados no palanque do partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD). “Nossa terra em primeiro lugar, porque nós amamos a Alemanha!”, proclamam faixas em azul claro, a marca registrada da legenda. “O clima dentro do partido é muito bom”, afirma sorrindo o membro do Parlamento da Saxônia Frank Peschel. O AfD obteve 39% dos votos por aqui na eleição europeia do ano passado, e é difícil aqui encontrar algum cidadão local que não planejasse votar no partido na próxima eleição nacional, em 23 de fevereiro. “A esquerda nos chama de nazistas, mas nós só queremos uma vida normal”, diz Simon, de 20 anos. Ele dará ao AfD seu primeiro voto no mês que vem.
Há uma certa presunção no AfD hoje em dia. Após recuar, no início de 2024, o partido operou uma recuperação oportuna. Seu registro atual nas pesquisas eleitorais, em torno de 20% e em ascensão, poderá dobrar sua representação no Bundestag. Seus correligionários se animaram com eventos na Áustria, onde um partido semelhante ao AfD está prestes a assumir poder depois que uma tentativa centrista de bloqueá-lo fracassou. Elon Musk, um plutocrata próximo a Donald Trump, realizou recentemente uma entrevista desconexa com Alice Weidel, a copresidente do AfD. Os membros do partido se constrangeram, mas têm afirmado que o apoio de Musk despertará o interesse de eleitores mais jovens e empresas alemãs, apesar de muitos permanecerem profundamente céticos em relação ao AfD. Divisões anteriormente amargas dentro do partido foram silenciadas a serviço da disciplina eleitoral — em grande parte em favor de sua ala mais radical.
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Isso aponta para um enigma. Grupos de extrema direita comparáveis na Europa, como o Reagrupamento Nacional, na França, ou os Irmãos da Itália, de Giorgia Meloni, moderaram seus discursos para amplificar sua popularidade. Mas o AfD tem crescido mesmo à medida que se radicaliza. Em sua convenção pré-eleitoral na Saxônia, no último fim de semana, Weidel, uma ex-banqueira antes vista como comparativamente moderada, emocionou os delegados com um discurso inflamado que culminou num apelo pela “remigração” de imigrantes ilegais, um termo controvertido que ela enfatizou com vigor. O partido a ungiu como sua primeira candidata de sua história à chancelaria: um sinal de confiança; ou mesmo de uma ambição a se cumprir em breve. “Alice für Deutschland!”, berrava a multidão, num trocadilho com “Alles für Deutschland”, um slogan da era nazista proibido após a 2.ª Guerra. “Não resta realmente nenhum moderado no partido”, afirma a cientista política Anna-Sophie Heinze, da Universidade de Trier.

A recuperação do AfD foi impulsionada pelos fracassos do governo em relação à imigração, aos preços da energia e à economia, segundo Tino Chrupalla, que compartilha a liderança do partido com Weidel. Apenas 22% dos alemães acham que seu país está preparado para os desafios do futuro. O AfD está afinando suas mensagens para atrair eleitores irritados, abafa questões que despertem paixões dentro do partido mas tenham pouco apelo mais amplo, como deixar a UE, ao mesmo tempo que enfatiza preocupações sobre imigração e energia. No entanto, mensagens contraditórias são fundamentais para seu sucesso. Escândalos ajudam: no mais recente, um diretório do AfD distribuiu panfletos eleitorais na forma de passagens aéreas falsas, prometendo deportar imigrantes ilegais, uma artimanha com raízes na era nazista. O partido diz que simplesmente quer ver a lei sendo cumprida. Mas a mensagem subliminar é evidente. “Sim, nossa retórica se afinou”, afirma Chrupalla. “Mas estamos apenas refletindo a realidade política. As pessoas estão fartas.”
O eleitorado do AfD tem se tornado mais heterogêneo à medida que seu apoio aumenta. Em partes do leste, a legenda domina bem mais de um terço dos votos, mas tem muito mais eleitores no oeste (que é maior). O eleitor arquetípico do AfD é um trabalhador da classe operária, de meia-idade, que vive numa cidade pequena, mas o partido está abrindo caminhos entre os jovens. Seus eleitores não são os “abandonados”, notavelmente mais pobres. Mas tendem a se perceber como pessoas mal-sucedidas. A grande fraqueza do AfD é em relação às mulheres, tanto eleitoras quanto candidatas: apenas um em cada nove postulantes do partido na eleição do mês que vem é mulher.
Os eleitores do AfD tendem a ser leais. A maioria não se considera radical. Mas muitos acham que outros partidos, incluindo os conservadores democrata-cristãos (CDU), abrandaram suas posições. E estão desproporcionalmente propensos a defender posições extremistas, incluindo tolerância à violência política (veja o gráfico). O AfD está sob vigilância de agentes de inteligência doméstica por “suspeita de extremismo de direita”. Mais de 100 parlamentares apoiaram uma proposta para banir o partido.
Certamente é tarde demais para isso. Mas o AfD continua bloqueado do poder. Em outros lugares da Europa, muros erguidos por partidos de centro-direita contra a extrema direita ruíram. Mas Friedrich Merz, líder do CDU e provavelmente o próximo chanceler da Alemanha, diz que trabalhar com o AfD significaria “vender a alma o CDU”. Nos Estados do leste, o CDU formou coalizões ideologicamente bizarras para manter o AfD fora. Muitos alemães desalentados com aura fascista do partido votam taticamente em seus oponentes. O bloqueio ao AfD pode até ter fomentado a radicalização do partido ao remover um incentivo à moderação.
Poucos correligionários do AfD acham que seus números nas pesquisas subirão muito mais nesta campanha. No entanto, nenhum acha que o partido poderá ser bloqueado do poder para sempre. “Quem ergue firewalls se queima”, afirma Chrupalla sobre o CDU. E embora tenha pendido para a direita, Merz provavelmente terá que governar em coalizão com um partido de esquerda. E isso, segundo Krzysztof Walczak, do diretório de Hamburgo do AfD, significa que ele não será capaz de cumprir as políticas que prometeu (e mais próximas ao AfD), como rejeitar a entrada de solicitantes de asilo através das fronteiras da Alemanha. O AfD está fazendo uma campanha dura com essa mensagem.
O bloqueio corre mais risco no leste. Chrupalla espera que um novo governo minoritário liderado pelo CDU na Saxônia desmorone, apresentando uma abertura. Uma eleição no ano que vem no Estado Saxônia-Anhalt, outro reduto do AfD, parece apetitosa. Nacionalmente, a tarefa é mais difícil. Merz conhece os riscos de até mesmo insinuar alguma abertura para o AfD. Mas seus conselheiros temem que, se não conseguirem lidar com os problemas da Alemanha, notavelmente a imigração ilegal e a estagnação econômica, o AfD poderá vencer a próxima eleição, em 2029. O que não lhe abriria necessariamente a porta para o poder. Mas seria um marco sombrio./TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO