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Economist: Diplomacia criou abertura, mas há risco de Ucrânia cair em armadilha 

Americanos e europeus encaram Acordo de Minsk como oportunidade, mas ele é vago e ambíguo demais em temas cruciais para governo ucraniano 

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Por The Economist

Nada chama mais a atenção do que 130 mil soldados posicionados para invadir. Por anos, as relações entre Rússia e Ocidente foram negligenciadas, mas as forças convergindo sobre a Ucrânia provocaram um espasmo de diplomacia. Nos dias 7 e 8, o presidente francês, Emmanuel Macron, foi a Moscou e Kiev com planos de evitar a guerra. Ele seria seguido pelos ministros britânicos de Exterior e Defesa. Na próxima semana, será a vez do chanceler alemão, Olaf Scholz.

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Todos encaram dois conjuntos de demandas russas. Um é a reformulação da arquitetura de segurança da Europa, ao restringir a Otan no leste. O outro é deixar a Ucrânia na órbita russa. Entre os dois fatores, a Ucrânia é o mais urgente e arriscado. O perigo é que, ao buscar evitar uma invasão, o Ocidente inclua a Ucrânia num pacto que leve o país ao caos interno ou até mesmo um conflito civil.

O cerne é a região de Donbass, onde separatistas apoiados pela Rússia travam uma guerra contra o restante da Ucrânia desde 2014. O Acordo de Minsk, assinado em 2015, também pelo governo ucraniano, deveria ter posto fim aos combates, mas grande parte do pacto jamais foi implementada. O presidente russo, Vladimir Putin, quer que o Ocidente force o governo ucraniano a cooperar. Macron e Scholz, com o apoio do governo de Joe Biden, veem Minsk como uma oportunidade.

Comboio de veículos armados russos se desloca pela Crimeia, em 18 de janeiro Foto: AP

Os ucranianos farejam uma armadilha – e estão certos em se preocupar. Enquanto tratado, Minsk não passa de um rascunho rabiscado em um pedaço de papel qualquer. Em menos de 900 palavras, em sua versão em inglês, seu texto aborda principalmente o cessar-fogo, evitando questões difíceis a respeito do que virá depois. Declara que as regiões rebeldes possuem um status “especial”, sem definir o que isso significa. Afirma que haverá eleições, mas não quem poderá concorrer ou votar. “Representantes” não especificados ajudarão a escrever uma nova Constituição. Qual lado pode fazer o quê? E quando?

A ambiguidade serve a Putin, que desde o início viu o Acordo de Minsk como uma oportunidade para manipular a Ucrânia. O status especial às vezes é usado para justificar que a região do Donbass deveria ter veto sobre decisões de política externa, incluindo a adesão à Otan. 

Putin apoiou eleições na região que excluíram a maioria das pessoas simpáticas ao governo em Kiev. Ele emitiu centenas de milhares de passaportes russos e controla talvez 40 mil milicianos locais, cujos líderes ele quer ajudar a redigir a nova Constituição. Sua versão de Minsk é um cavalo de Troia capaz de colocar a Ucrânia sob controle russo ou fomentar o caos.

Por todas essas razões, muitos ucranianos veem Minsk como absolutamente inaceitável. Ainda assim, é justamente sua ambiguidade que cria uma abertura à diplomacia, o que Volodymyr Zelenski, o sitiado presidente ucraniano, poderia explorar para retomar a iniciativa. A interpretação de Putin é apenas uma entre as muitas possíveis para Minsk. Negociações envolvendo França, Alemanha, Ucrânia e Rússia poderiam dar substância ao acordo no sentido de limitar o status especial do Donbass, eleições mais justas e de garantir que os delegados da convenção constitucional da região sejam eleitos propriamente – e não simplesmente apontados pelo Kremlin. Depois do acordo, potências ocidentais poderiam dar apoio político, econômico e diplomático à Ucrânia.

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Putin concordaria com isso? Talvez não. De qualquer modo, o Ocidente não deveria forçar um acordo sobre a Ucrânia. Isso suprimiria a soberania da Ucrânia e desestabilizaria todo o país, com consequências imprevisíveis que poderiam reverberar na União Europeia.

Estadista

Putin deve pesar as consequências também. Negociações a respeito da Ucrânia, seguidas por mais negociações com a Otan sobre, digamos, controles de armas, poderiam aliviar as tensões e lhe dar algo que ele quer. Putin poderia dizer aos russos que é um estadista que evitou ser instigado à guerra pelo Ocidente. 

Em contraste, recusar a negociação o deixaria sem ferramentas além de uma imprevisível, longa e (para a Rússia) possivelmente catastrófica guerra. Putin mantém todos tentando adivinhar o que ele realmente quer. Negociações sobre Minsk são a melhor e mais segura maneira de descobrir. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

© 2022 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM