Na data em que os manifestantes egípcios haviam definido como "dia da partida" do presidente Hosni Mubarak, um grupo de diplomatas dos EUA e da União Europeia tentava convencer o regime a iniciar uma transição rumo à democracia. O dia também marcou a virada do discurso da comunidade internacional, que há um mês ainda defendia os ditadores da África e do Oriente Médio contra os protestos de rua.A retirada do apoio aos autocratas, que perdurou por décadas, ocorreu em menos de duas semanas e desnorteou a diplomacia. O exemplo mais claro da virada foi na França. Há 21 dias, granadas de gás lacrimogêneo foram encontradas prontas para serem enviadas à Tunísia - uma nítida manifestação de apoio do presidente Nicolas Sarkozy a Zine El Abidine Ben Ali. A chanceler Michèle Alliot-Marie chegou a oferecer a Túnis a experiência da polícia francesa para restabelecer a ordem. A posição rendeu críticas a Sarkozy, que teria sido conivente com a ditadura. Só após a queda do governo, o presidente francês veio a público fazer um mea culpa. "Talvez tenhamos subestimado as aspirações de liberdade do povo tunisiano."Não só a diplomacia francesa foi criticada por apoiar ditaduras. Na UE, os primeiros pronunciamentos contra a repressão na Tunísia e no Egito só vieram quando já estava clara a insatisfação popular. Mesmo o presidente americano, Barack Obama só reagiu após o início da violência no Cairo. Na sexta-feira, Catherine Ashton, chanceler da UE, reconheceu o momento delicado das relações internacionais. "As revoltas em países do Mediterrâneo e do Oriente Médio constituem desafios para a Europa e o resto do Ocidente, em particular no que tange nossa política de democratização", afirmou. Como prova da mudança, a chanceler europeia recebeu Ahmed Ounaies, ministro das Relações Exteriores do governo interino da Tunísia, e prometeu apoio na transição. Além disso, a Europa anunciou o aumento das transferências de ajuda à Tunísia. Iniciativa semelhante será adotada no Egito, se houver por lá uma transição à democracia. "A crise na África e no Oriente Médio é um tsunami na diplomacia internacional. Só era difícil perceber as crises políticas porque a Europa e os EUA não queriam ver a insatisfação popular", avaliou o cientista político argelino Hasni Abidi, diretor do Centro de Estudos sobre o Mundo Árabe e Mediterrâneo (Cermam), de Genebra.