Europa não vê Bolsonaro como ator em guerra da Ucrânia e valoriza mais votos de diplomatas do que palavras do presidente

Representantes diplomáticos de países europeus entendem que, até agora, o discurso dúbio de Bolsonaro não impediu o Brasil de votar contra a Rússia na ONU

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Por Felipe Frazão

BRASÍLIA - As declarações do presidente Jair Bolsonaro sobre a guerra da Ucrânia têm menor relevância diplomática no exterior do que se acredita no Brasil. Representantes diplomáticos de países europeus entendem que, até agora, o discurso dúbio de Jair Bolsonaro não impediu o Brasil de votar contra a Rússia nas Nações Unidas. Embora notem modulações na posição brasileira, que a distanciam do tom usado por potências ocidentais, afirmam que o resultado final é o que mais importa.

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Os relatos de chancelarias e embaixadores estrangeiros notam que o Brasil votou contra a Rússia e dentro de suas posições tradicionais de política externa, até agora, em Nova York. Não deixam de observar, porém, que o País fez concessões para não desagradar aos russos. O próprio presidente declarou que a delegação do Brasil trabalhou para abrandar os termos contra Vladimir Putin, substituindo expressões como “condenar” por “lamentar”, o que vem sendo justificado como uma forma de manter a capacidade de diálogo.

As diferenças de discurso da equipe do Itamaraty no exterior, de atores do governo em Brasília e do presidente são assuntos relatados e explicados em telegramas enviados à Europa. Mas menor peso é dado ao que o presidente fala, em comparação com decisões do Ministério das Relações Exteriores.

Eles interpretaram que o presidente exagerou na carga em suas declarações por questões ligadas à política doméstica do Brasil, mas não fez o País tomar lado pró-Rússia nas votações. Notam, também, que posicionamentos contraditórios entre o presidente e sua equipe diplomática podem ser uma boa estratégia, para que o País possa mudar de posição em algum momento.

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No entendimento de embaixadores brasileiros e estrangeiros há pouco que o Brasil possa fazer além de dar seus votos alinhado ao Ocidente, no Conselho de Segurança, e demais instâncias das Nações Unidas, como a Assembleia Geral e o Conselho de Direitos Humanos. Essa interpretação é reforçada pelo fato de o País não fazer parte de organizações multilaterais diretamente impactadas pelo conflito e estar geograficamente distante da guerra. Nas palavras de um embaixador da Secretaria de Estado, nesta guerra “o Brasil não tem tanta importância assim”.

Também não estão no radar, por enquanto, telefonemas de Bolsonaro com o presidente francês, Emmanuel Macron, ou com o chanceler alemão, Olaf Scholz, dois mediadores que tentaram evitar que a escalada de tensões evoluísse para o conflito.

Prédio residencial atingido por bombardeio russo em Kiev em 15 de março de 2022 Foto: ARIS MESSINIS

O último diálogo com um chefe de governo, com o premiê britânico Boris Johnson, ocorreu na semana passada. O telefonema, porém, estava previsto dias antes, no esforço para conquistar o voto do Brasil no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Virou uma forma de os britânicos pressionarem por uma declaração a favor do cessar fogo, com o qual ambos líderes teriam concordado. Johnson ressaltou o papel histórico do Brasil, inclusive com menções à 2ª Guerra Mundial, e disse que a incursão militar russa era “repugnante”.

O governo brasileiro não queria que a chamada se tornasse pública, nem se pronunciou sobre o teor da conversa. Mais do que isso, ficou incomodado com a divulgação do contato.

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Bolsonaro afastou-se das condenações internacionais à Rússia de Vladimir Putin, de quem se diz amigo e busca ressaltar semelhanças de pensamento e comportamento. Não quer se envolver pessoalmente na questão, segundo assessores diretos, nem deixar o Brasil tomar posição sozinho. Em seguidos pronunciamentos, destacou que buscaria neutralidade e isenção. Na semana passada, voltou a enaltecer o poder de Putin - por outro lado, só fez comentários em tom depreciativo sobre o presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski.

Um embaixador de uma potência nuclear da Europa disse, reservadamente, interpretar que Bolsonaro estava mal orientado e não sabia a dimensão do que estava dizendo quando manifestou “solidariedade” à Rússia, ao visitar Putin em Moscou. Um sinal disso é que foi logo orientado a esclarecer a declaração.

Ao mesmo tempo, diplomatas citam que a guerra pode aumentar a demanda por líderes que tenham autoridade, demonstrem capacidade de conduzir os países e recebam respaldo internacional. Um nome, entre os potenciais concorrentes ao Palácio do Planalto, não sai da cabeça de diplomatas: Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente e pré-candidato do PT.

Esses embaixadores lembram que, no governo de Lula, principalmente, o País buscou uma projeção diplomática internacional, colocou-se como mediador de conflitos, e tinha posições claras. Mais do que isso, a voz do Brasil era esperada e ouvida, afirma uma diplomata europeia.

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No fim do ano passado, Lula fez um tour pela Europa e foi recebido com o protocolo de um ex-chefe de Estado. Reuniu-se com políticos amigos. No entanto, a diplomacia profissional também tem claro que Lula dificilmente seria mais duro do que Bolsonaro com Putin. Como não o fez.

Ao seu estilo, Lula defendeu a paz mundial, cobrou o fim do conflito, lamentou a guerra e disse que, se tivesse sido consultado por Putin, recomendaria que ele não invadisse a Ucrânia. Não usou, porém, os termos duros de “condenação” usuais na diplomacia e sempre teve a Rússia como aliada durante os governos do PT.

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