Os distúrbios ocorridos na turbulenta Província de Xinjiang, no noroeste da China, não são novidade. Em 1990, 50 pessoas foram mortas na cidade de Baren, onde a tropa de choque esmagou uma manifestação de 3 mil muçulmanos descontentes com o governo. Em 1997, membros da etnia uigur reuniram-se na cidade de Gulja para protestar contra a execução de 30 ativistas que reivindicavam a criação de um Turcomenistão Oriental independente. Depois de dois dias de manifestações, a tropa de choque entrou em ação. Segundo o governo, 9 pessoas morreram, mas para observadores ocidentais o número de vítimas foi de 400. No domingo, a polícia e o Exército reprimiram uma manifestação pacífica dos uigures em Urumqi, capital de Xinjiang. Acredita-se que 156 pessoas tenham morrido e mais de 1.000 tenham ficado feridas. O tumulto, no qual civis da etnia han foram atacados e lojas incendiadas, foi descrito como o mais sangrento desde o massacre da Praça da Paz Celestial, em Pequim, em 1989. Xinjiang é considerada a joia da coroa da República Popular da China - mais até do que o Tibete. Ela constitui um tampão estratégico entre a China e as ex-repúblicas soviéticas, corresponde a um sexto da superfície da China e é uma região rica em gás e petróleo. O regime teme de forma paranoica que um movimento separatista coeso leve à independência de Xinjiang e a uma divisão do país. Por esse motivo, nada deterá o governo em sua tentativa de suprimir o levante uigur. Se a história serve de lição, os próximos seis meses serão um período de desespero para os uigures. PRISIONEIROS Em consequência do incidente de Baren, foram capturados todos os homens da região com idade entre 13 e 60 anos. A quantidade de presos foi tão grande que obrigou as autoridades a transferi-los para um estádio nos arredores da cidade. Segundo a Anistia Internacional, foram disparados jatos com canhões de água nos prisioneiros, que ainda tiveram de permanecer ao relento por vários dias. Como ainda era inverno, muitos perderam mãos e dedos congelados. Os supostos líderes do levante de Gulja foram conduzidos pelas ruas da cidade em caminhões abertos até um tribunal, onde foram condenados em massa. Segundo testemunhas, pareciam drogados e foram espancados pelos seus captores diante da multidão. Nesse período, as buscas de casa em casa tornaram-se corriqueiras em toda a província. Foi imposto o toque de recolher e os jornalistas estrangeiros foram proibidos de entrar na região. Situação semelhante foi registrada no Tibete depois dos tumultos do ano passado. Cidades-mosteiros foram fechadas e houve prisões em massa. Cerca de 1.200 tibetanos presos na ocasião ainda estão desaparecidos. Pequim culpou o dalai-lama por instigar os tumultos. Portanto, não foi nenhuma surpresa quando os acontecimentos de domingo em Urumqi foram atribuídos a Rebiya Kadeer, a empresária que mora nos EUA e é considerada pela comunidade uigur uma governante no exílio. Os uigures e os seus governantes hans vivem um ciclo de violência e desespero que está longe do fim. Nas últimas semanas, as tensões entre eles cresceram em razão da destruição aparentemente negligente da antiga cidade de Kashgar. Edifícios de enorme importância histórica e cultural estão sendo demolidos para dar lugar a rodovias e blocos de apartamentos que simbolizam o milagre chinês. Famílias uigures que moram em Kashgar há décadas são levadas à força para novas habitações fora da cidade. A frustração e a revolta de muitos uigures pela grosseira insensibilidade da China transbordaram no domingo. Só resta esperar que a contínua eliminação de uigures não faça com que seus representantes mais radicais caiam nas mãos de ideólogos fanáticos. *Charles Cumming é autor de diversos romances de espionagem. Seu quarto livro, ?Typhoon? (Tufão), aborda o sofrimento dos uigures em Xinjiang