WASHINGTON - O governo Donald Trump chamou de “erro administrativo” a deportação de um imigrante salvadorenho para prisão de segurança máxima em seu país, mesmo com a proteção da Justiça, que proibia autoridades americanas de mandá-lo para El Salvador. Mesmo depois de admitir o engano, a administração republicana afirma que não pode pressionar San Salvador a enviá-lo de volta aos Estados Unidos, onde tem mulher e filho.
Kilmar Abrego Garcia foi deportado em 15 de março, quando o governo deportou mais de 200 venezuelanos acusados de integrar organizações criminosas. O salvadorenho, contudo, estava protegido por decisão do juiz de imigração, que proibiu a deportação para El Salvador por entender que lá ele corria o risco de ser ferido ou morto pelas gangues que tentavam extorquir sua família.
Os agentes do Serviço de Imigração e Controle de Alfândegas (ICE na sigla em inglês) reconheceram que estavam cientes de documentos proibindo a deportação de Abrego para El Salvador e classificaram sua remoção como um “erro administrativo”.

Os advogados de Kilmar Abrego entraram com uma ação emergencial, alegando que a deportação acelerada violou leis nacionais e internacionais. No processo, a defesa afirma ainda que ele está sendo submetido à tortura e corre risco de morte ao pedir que o juiz obrigue o governo dos Estados Unidos a negociar sua liberação com El Salvador.
Mesmo reconhecendo o erro, o Departamento de Justiça afirmou que não pode usar a diplomacia ou pressionar pela liberação de Kilmar Abrego porque isso colocaria em risco a política externa americana e as relações com um aliado na luta contra as gangues. O presidente de El Salvador, Nayib Bukele, aceitou receber imigrantes deportados dos Estados Unidos, que foram detidos na sua mega prisão de segurança máxima, acusados de envolvimento com organizações criminosas.
O governo Donald Trump argumentou ainda que o processo é irrelevante, pois Kilmar Abrego não está mais sob custódia dos EUA, e minimizaram os riscos que ele enfrenta na prisão. “Os demandantes não demonstraram claramente a probabilidade de que Abrego Garcia será torturado ou morto”, escreveram os advogados em declaração à Justiça.
A admissão do erro — e sua recusa em tentar corrigi-lo — ocorre no momento em que os agentes federais são pressionados a cumprir as promessas de deportação em massa de Donald Trump. Por ordem do republicano o governo intensificou as prisões, enviou imigrantes para Guantánamo e recorreu à Lei de Inimigos Estrangeiros para acelerar as deportações, desafiando a ordem judicial que suspendeu o uso da lei do século 18.
Kilmar Abrego, filho de um ex-policial, não tem antecedentes criminais nos Estados Unidos nem em El Salvador, de acordo com os seus advogados. Pelo contrário, a defesa alega que ele fugiu, aos 16 anos, porque uma gangue tentava recrutá-lo e extorquir a sua família.
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O salvadorenho atravessou ilegalmente a fronteira sul e chegou a ser detido com outros imigrantes em 2019 enquanto procurada trabalho em Maryland. Uma denúncia anônima alegou que ele seria membro da gangue MS-13, mas o juiz de imigração determinou que, na verdade, Kilmar Abrego era vítima dos criminosos. Embora tenha concluído que o salvadorenho não era elegível para asilo porque entrou com o pedido fora do prazo, o juiz concedeu uma proteção similar que impedia a sua deportação para El Salvador.
Kilmar Abrego é casado com uma cidadã americana, trabalha como aprendiz de metalurgia e estuda na Universidade de Maryland. Ele tem dois enteados e um filho de cinco anos diagnosticado com autismo que estava no banco de traz do carro no momento em que o salvadorenho foi detido. Os agentes do ICE disseram que a Albrego que o status de imigração havia mudado, o algemaram e ligaram para que a mulher fosse buscar a criança.

A esposa de Kilmar Abrego, Jennifer, relatou que ele “parecia confuso, angustiado e chorava”. Ela disse que foi assustador ter que defender o marido, apesar da falta de provas contra ele. “Foi tão emocional e injusto”, declarou nos registros judiciais. “Era tão claro que eles não tinham absolutamente nenhuma evidência de que Kilmar era membro de uma gangue, mas mesmo assim nos fizeram provar que ele não era. Deveria ser o contrário.”
Quando El Salvador divulgou imagens de seus novos prisioneiros, ela reconheceu o marido por suas tatuagens e viu Kilmar Abrego sendo arrastado por agentes penitenciários em vídeos que o governo Donald Trump celebrou nas redes sociais. “Isso tem sido um pesadelo para minha família”, afirmou. “Meus filhos precisam do pai.”/COM W. POST