BEDMINSTER, EUA - Victorina Morales, uma doméstica em situação ilegal nos Estados Unidos empregada por um clube de golfe de propriedade do presidente americano, Donald Trump, afirmou que decidiu revelar sua identidade e sua situação trabalhista em razão dos maus tratos por parte de seu supervisor no campo de golfe, incluindo o que ela descreveu como "abuso físico" em três ocasiões.
Depois de o jornal New York Times revelar o caso envolvendo Victorina e uma ex-funcionária do resort em uma extensa matéria publicana na quinta-feira, a imigrante guatemalteca conversou também com o diário The Washington Post, dessa vez acompanhada por seu advogado.
Ela disse que continuava empregada no local e estava escalada para trabalhar nesta sexta-feira, mas que não planejava comparecer ao Trump National Golf Club, na cidade de Bedminster.
"Estou cansada de ser humilhada e tratada como uma pessoa idiota", afirmou em espanhol durante a breve entrevista. "Somos apenas imigrantes que não têm os documentos legais."
A Agência de Imigração e Alfândega dos EUA (ICE, em inglês), responsável por prender e deportar imigrantes ilegais, não se posicionou sobre a situação de Victorina.
"Temos dezenas de milhares de funcionários em nossas propriedades e temos práticas muito rígidas de contratação", disse a porta-voz da Organização Trump, Amanda Miller, em e-mail enviado ao Post que não trata, no entanto, do caso específico de Victorina.
"Se qualquer empregado forneceu documentos falsos em uma tentativa de burlar a lei, ele será demitido imediatamente", completou Amanda.
Anibal Romero, advogado de Victorina, disse que ajudará sua cliente a preencher o pedido de asilo em razão de ameaças recebidas por sua família na Guatemala - o sogro dela foi morto em um ataque com um facão. Ele também afirmou que ela não foi contactada por autoridades de imigração dos EUA e não foi acusada de qualquer crime no país.
Romero também disse que também está considerando o que chamou de "ação empregatícia" contra a Organização Trump por possíveis violações das leis antidiscriminação do Estado em nome de Victorina e outra cliente, Sandra Diaz, que também trabalhou ilegalmente no clube de golfe.
Trump construiu sua campanha presidencial de 2016 em torno de uma postura linha dura contra a imigração ilegal. Ele defende a construção de um muro ao longo da fronteira entre os EUA e o México, deportações em massa dos imigrantes sem documentos e uma expansão do E-Verify, a ferramenta online do governo federal para verificar se os funcionários são legalmente qualificados para trabalhar.
Durante essa campanha, Trump disse que seus próprios negócios já usavam o sistema - que, na maioria dos Estados, é voluntário para os empregadores. "Estou usando o E-Verify em praticamente todos as vagas", disse Trump ao apresentador Chris Matthews, da MSNBC, durante uma entrevista em março de 2016, acrescentando: "Estou usando o E-Verify e vou lhe dizer, funciona."
Na quinta-feira, uma busca no banco de dados do governo federal sobre empregadores mostrou que alguns negócios de Trump usam o sistema, como seus campos de golfe na Carolina do Norte e na Flórida, assim como seu resort Mar-a-Lago, também na Flórida, e seus hotéis em Washington e Chicago.
Mas uma série de outra empresas do grupo Trump - incluindo o clube de golfe de Bedminster - não aparecem no banco de dados de empregadores que usam o E-Verify. O grupo Trump não comentou o motivo para algumas de suas empresas não aparecerem no sistema.
Promessa de campanha
Oito Estados exigem que praticamente todos os empregadores usem o sistema: Alabama, Arizona, Geórgia, Mississippi, Carolina do Norte, Carolina do SUl, Tennessee e Utah.
Na disputa à presidência, Trump defendeu uma expansão da obrigatoriedade do E-Verify para todo os EUA. "Garantiremos que o E-Verify seja usado o máximo possível sob a lei existente, e trabalharemos com o Congresso para fortalecer e expandir seu uso em todo o país", declarou o então candidato em um discurso no Arizona em 2016.
Já como presidente, Trump colocou o banco de dados nacional entre suas prioridades de imigração e pediu que o Congresso aloque US$ 23 milhões no orçamento de 2019 para expandir o programa e sua obrigatoriedade de uso em todo o país.
Nos últimos meses, no entanto, ele praticamente não se pronunciou sobre o E-Verify, preferindo focar sua retórica migratória na questão da fronteira com o México e na caravana de imigrantes da América Central.
"O presidente tem cumprido apenas parte de sua promessa sobre deter a imigração ilegal ao não tirar com atração causada pela possibilidade de trabalhar ilegalmente", disse Roy Beck, presidente da NumbersUSA, um grupo que pressiona para reduzir a imigração no país.
Beck disse que Trump "decepcionou em sua promessa de ajudar os trabalhadores americanos" porque não "apoiou efetivamente uma lei obrigando o uso do E-Verify". / THE WASHINGTON POST
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.